Em recente debate no Senado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a abertura da caixa-preta das renúncias fiscais. O ministro afirmou a necessidade de deixar transparente para a sociedade brasileira o que está sendo feito com os recursos públicos. São quase R$ 500 bilhões explícitos na peça orçamentária de renúncia fiscal e outros R$ 100 bilhões que não estão na lei orçamentária.
Para o professor Paulo Ayres do Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP, “é difícil dizer o que ele [Haddad] entende por caixa-preta, na medida em que a expressão é usada metaforicamente, sem o maior detalhamento”. Além disso, o professor faz um panorama histórico sobre as renúncias fiscais ao longo de diferentes mandatos presidenciais: ”Eu queria registrar que o sistema tributário atual, com os seus defeitos, que são muitos, e as suas eventuais virtudes, existe mais ou menos uniformemente desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, ou seja, nós passamos por oito anos de Fernando Henrique, oito de Lula, seis de Dilma, dois de Temer e quatro de Bolsonaro basicamente com esse sistema que aí está posto, portanto, se há uma caixa-preta ou se há uma série de renúncias, isso vem já há muito tempo”.
Ayres exemplifica o tema com a questão da diminuição de tributação de dividendos e aumento da tributação da pessoa jurídica, uma medida do governo FHC. A discussão voltou à tona no Congresso no ano passado: “Prova disso é que, no projeto aprovado ano passado na Câmara e que ficou engavetado no Senado do antigo governo, se tributava os dividendos, se pretendia tributar os dividendos, mas, em contrapartida, se reduzia alíquota da tributação da pessoa jurídica, ou seja, isso é renúncia fiscal? Isso é caixa-preta? Isso é um problema verdadeiramente ou é uma mera forma de alocação da tributação mais carregada na pessoa jurídica ou mais carregada na pessoa física?”, questiona.
Reforma tributária
O professor comenta que a reforma tributária é um grande desafio. Os temas que entram em discussão nesse debate são delicados, mas é fundamental falar sobre a possibilidade de reforma: “O ato de reformar o sistema é um ato que realmente tem que ser feito. Seria muito importante que o governo sinalizasse quais são suas reais pretensões em relação à tributação no Brasil. Por exemplo, a todo instante se diz que vamos discutir tributação do consumo no primeiro semestre e vamos discutir a tributação sobre a renda a partir de outubro. Ora, que discussão é essa que começa em outubro e em dezembro a legislação tem que ser aprovada para vigorar em 1º de janeiro? Isso para mim é surpresa, não é discussão, não é debate, é imposição, então era fundamental que nós tivéssemos uma noção de quais são as ideias do governo quando se fala de caixa-preta, no que se vai mexer, o que está errado e o que está certo”, conclui.
Na visão dele, algumas medidas foram acertadas: “Por exemplo, acabaram de mexer nessa questão das pessoas físicas que tinham off-shores no exterior e parece uma medida pontual e acertada. Estão pretendendo tributar os chamados fundos exclusivos de pessoas físicas que têm rendimentos pessoais num único veículo jurídico, uma outra decisão que me parece acertada”. No entanto, querer mexer em tudo representa “um desconhecimento dos reais problemas do nosso sistema tributário”.
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