Excesso de burocracia ainda é um dos empecilhos para empreender no Brasil

Segundo especialistas, além da burocracia, a alta taxa de juros, acesso escasso ao crédito e falta de uma educação sobre empreendedorismo são fatores que entravam o ato de empreender no Brasil

 04/04/2023 - Publicado há 2 anos
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As principais dificuldades que o empreendedor encontra no Brasil para abrir o seu próprio negócio estão relacionadas à falta de crédito – Foto: Pexels
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O sonho de ter o próprio empreendimento é muito comum no Brasil, mas não é um processo fácil. Segundo dados do Sebrae, 46% dos brasileiros têm interesse em abrir seu próprio negócio e, em 2021, existiam 43 milhões de brasileiros liderando um empreendimento ou envolvidos na criação de um, revela a pesquisa do Global Entrepreneurship Monitor

Mesmo assim, as dificuldades impostas àqueles dispostos a se aventurarem e começarem um empreendimento são muitas. As principais são a burocracia, o sistema tributário, a pouca ou nenhuma educação empreendedora nas escolas e o acesso escasso ao crédito. 

Dificuldades 

Segundo o índice de Burocracia da América Latina de 2022, as micros e pequenas empresas gastam, em média, 180 horas com burocracia por ano no Brasil, o que equivale a 22,5 dias úteis. O gerenciamento de operações é a parte mais burocrática, responsável por  57,7% desse tempo. E a burocracia não afeta apenas os empreendimentos, como pode ser um estímulo à corrupção, além de ser um dos motivos pelo baixo crescimento econômico do País.

Desde 2019, o processo de abertura de empresas tem sido simplificado. Se antes a média era de quatro dias, em 2022 passou para um. Porém, esse tempo ainda é muito desigual entre locais do País. Em Aracaju, Sergipe, o tempo médio de abertura de uma empresa no 3º trimestre de 2022 foi de uma hora, enquanto o município de Tijucas, em Santa Catarina, teve um tempo de 33 dias e 13 horas.

Outro entrave são os baixos investimentos e o escasso acesso ao crédito. Investidores estrangeiros querem encontrar empresas com fundamentos claros e estruturados, que não apresentem risco elevado, caso das startups da área da tecnologia e informação. Por outro lado, empresas com uso de tecnologias mais avançadas têm mais dificuldade em encontrar investidores.

Geciane Porto – Foto: Arquivo Pessoal

“As principais dificuldades que o empreendedor encontra no Brasil para abrir o seu próprio negócio estão relacionadas à falta de crédito”, diz Geciane Silveira Porto, professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP. “As taxas de juros no Brasil são muito elevadas e nós temos poucas linhas de financiamento especiais para abertura de novos negócios, então o empreendedor tem uma dificuldade de alavancar o seu negócio por falta de investimentos.” 

A alta taxa de juros e o sistema tributário brasileiro, considerado por muitos como um manicômio tributário, também são entraves na hora de começar um empreendimento. São 1.502 horas por ano apenas gastas com o pagamento de impostos e contas tributárias. Segundo o ranking Doing Business, o Brasil ocupa a posição 184 no quesito pagamento de impostos, quase o último colocado entre os países da lista. Isso impacta diretamente no acesso ao crédito. 

“Nos empreendimentos que demandam tecnologia mais elevada, nós temos uma maior dificuldade de encontrar investidores, porque eles não querem correr o risco. Em geral, são empreendimentos cuja maturidade vai ser atingida de médio a longo prazo. Por exemplo, uma empresa de biotecnologia vai precisar de pelo menos de seis a oito anos para conseguir colocar um produto registrado no mercado, passar por toda a parte regulatória, e os investidores não estão dispostos a esperar todo esse período”, explica Geciane.

Necessidade de empreender

“Às vezes, as pessoas se lançam em um projeto de empreendedorismo por necessidade e não o fazem de uma forma adequada. Não se preparam para isso, não pensam nas questões financeiras, nas questões de negócio. Às vezes, ela está sendo empurrada para isso por uma circunstância econômica”, diz Edson Crescitelli, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da USP.

Edson Crescitelli – Foto: Reprodução/IEA-USP

Em 2020, no auge da pandemia de covid-19, o Brasil teve o melhor desempenho da década na abertura de empresas, com 3.359.750 empresas abertas, um aumento de 6% em relação ao ano anterior. Em 2022, esse número cresceu e o País alcançou o número de 3.838.063 empresas abertas. 

O importante, nesses casos, é estar atento às tendências de mercado a todo o momento. Isso gera novas oportunidades de negócios e de enriquecimento. A maior aposta atual é no empreendedorismo digital, que cresce mais a cada dia. “A sugestão para quem quiser empreender é se preparar bem para isso, entender as várias críticas e não sair fazendo qualquer coisa, porque aí a chance de não dar certo fica bem maior”, alerta Crescitelli.

Educação 

Um dos maiores entraves é a falta de educação empreendedora no País. “O brasileiro, embora seja um povo extremamente criativo, nós ainda temos uma discussão muito pequena sobre a formação do empreendedor dentro das escolas e nas universidades. Quais são os procedimentos? Quais são as qualificações e as capacitações necessárias para se empreender? Então, nós temos criatividade, mas falta ainda uma formação, uma qualificação técnica para que o brasileiro possa empreender de maneira mais estruturada e, dessa forma, ter melhores chances de sucesso”, diz Geciane.

Menos de 50% das pessoas acham que é fácil empreender no Brasil e quase metade dos adultos diz que não começa um empreendimento por medo que ele fracasse, segundo levantamento do Global Entrepreneurship Monitor. Essa percepção é totalmente influenciada pelas dificuldades encontradas pelo empreendedor no meio do caminho. 

Atualmente, o Brasil está, entre as 190 posições, na 124ª em facilidade em empreender e na 138ª em começar um empreendimento, segundo dados do ranking Doing Business Archive. Mesmo assim, a pesquisa mostra que mais da metade dos brasileiros tem intenção de começar um empreendimento nos próximos três anos. “O brasileiro tem essa capacidade [criativa]. É claro que, muitas vezes, é a necessidade que empurra a pessoa para o empreendedorismo. Às vezes, não é uma  vocação da pessoa ou um projeto, é dificuldade. Mas, tanto vindo por um caminho ou pelo outro, o brasileiro tem muita capacidade de adaptação, ele é muito resiliente”, diz Crescitelli.


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