O novo pacote de corte de gastos teve uma repercussão negativa no mercado brasileiro, que avalia que as medidas são insuficientes para atingir o equilíbrio das contas públicas. José Luiz Portella, pós-doutor em História Econômica pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados (IEA), avalia o impacto do pacote nas políticas públicas.
A demanda pelo conjunto de ações anunciadas pelo governo federal nasceu com a preocupação em relação ao tamanho da dívida pública e sua trajetória de crescimento. O último relatório, Estatísticas Fiscais, divulgado pelo Banco Central, aponta que a dívida ultrapassou o valor bruto de R$ 9 trilhões pela primeira vez na história este ano, alcançando a marca de 78% do valor do PIB.
Essa tendência de crescimento pode acarretar uma perda de credibilidade do País e da moeda nacional frente ao mercado interno e externo. “O que significa isso? Que os investimentos estrangeiros iam diminuir cada vez mais. Os próprios investimentos internos seguem essa lógica, à medida que as pessoas começam a não confiar que lá na frente as operações vão dar certo e começam a avaliar que os juros vão aumentar muito. Nesse cenário, o rentismo se sobrepõe ao investimento “, explica Portella.
O pacote anunciado, no entanto, não convenceu os investidores e teve sua efetividade contestada. “Ele foi considerado insuficiente principalmente por não ter mudanças estruturais nos gastos e na qualidade de vida. Ou seja, mudanças que garantissem um país em que as despesas não aumentem mais do que as receitas. Porque é isso que vai fazer aumentar a dívida, e isso que leva a uma trajetória em que você fica com descrença no País”, afirma.
Para as políticas públicas, o impacto dessa repercussão é negativo. “Grande parte das políticas públicas, elas se fundam na crença que a sociedade tem de que o País vai dar certo. Então, à medida que houve uma perda de credibilidade se tem também uma perda nas políticas públicas. Isso porque elas não são feitas só pelo Estado. Vários tipos de políticas que atingem a sociedade vêm de setores privados. Quando uma entidade privada, na verdade, investe numa determinada região, como acontece no Jardim Lapena de São Paulo, aquilo é um conjunto de políticas públicas com a participação de ONGs, todo mundo que participa do processo, sempre é uma articulação entre Estado e mercado. E existe sempre uma participação da sociedade”, elucida.
O professor também aponta que o governo errou ao fazer o anúncio do pacote junto com o da isenção do imposto de renda até R$ 5 mil. Segundo Portella, a mistura dos assuntos gerou uma impressão de que está se assumindo mais compromisso com os gastos do que com as poupanças. “Ficou a impressão de que, exatamente no lançamento de políticas que eram para conter o déficit, virou um aumento de gasto. Embora o governo vá compensar a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, essa compensação acaba ficando sempre em dúvida. Mesmo que ela aconteça, nós estamos com uma injustiça, porque quem ganha R$ 5 mil, R$ 4 mil, R$ 4.500, R$ 3 mil no Brasil não é uma pessoa que está na pobreza. Vamos renunciar à receita para pessoas que estão em uma situação melhor do que os 16 milhões que estão na extrema pobreza e os 40 milhões que estão numa pobreza bastante aguda. Então, é uma política que, na verdade, estimula mais desigualdade”, finaliza.
Momento Sociedade
O Momento Sociedade vai ao ar na Rádio USP todas as segundas-feiras, às 8h30 – São Paulo 93,7 MHz e Ribeirão Preto 107,9 MHz e também nos principais agregadores de podcast
.