O avanço das pesquisas matemáticas com foco no espectro autista

Apoiados pelo Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI) da USP, cientistas estudam estruturas cerebrais visando ao diagnóstico

 14/09/2023 - Publicado há 10 meses

Da Redação*
Arte: Carolina Borin**

Autismo - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: Marcos Santos/USP Imagens e Reprodução/Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT)

Esquizofrenia, Alzheimer, Parkinson, Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). O que há em comum entre essas doenças e transtornos? As conexões cerebrais. Os estudos utilizando técnicas de redes complexas e aprendizado de máquina avançam cada vez mais na direção de diagnósticos mais precisos e tratamentos.

No Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI), os trabalhos nessa área são coordenados pelo pesquisador principal Francisco Rodrigues, professor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP em São Carlos. Rodrigues participou de um artigo recentemente publicado na revista Scientific Reports. O trabalho, que propõe uma metodologia quantitativa para diagnóstico do TEA, se baseou em dados de imagens cerebrais de 500 pessoas, sendo 242 pertencentes ao espectro.

No vídeo a seguir, o professor fala sobre o trabalho em andamento e como ele analisa os avanços da matemática para auxiliar no entendimento, detecção e soluções para tratamento do TEA e outras doenças que afetam a atividade cerebral.

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Os pesquisadores abasteceram um algoritmo com os “mapas” obtidos de dados coletados por imagens de exames de ressonância magnética ou eletroencefalograma. “A partir dos exemplos aprendidos, o sistema pôde determinar quais alterações cerebrais estavam associadas com o espectro. A acurácia dos testes foi superior a 95%”, informa o professor. O estudo se destaca pela interdisciplinaridade. O grupo é composto por físicos, estatísticos, médicos e neurocientistas de diferentes centros no Brasil e Alemanha.

“Muitos trabalhos propõem métodos para o diagnóstico de TEA com base em aprendizado de máquina. No entanto, não levam em consideração a organização da rede cerebral, que é o diferencial deste estudo. O mapa do cérebro, também chamado de rede cortical, mostra como as regiões do órgão estão conectadas. Assim como uma rodovia com interrupções altera o tráfego em uma região, o cérebro com alterações leva a mudanças no comportamento”.

Desde 2011, um grupo se dedica ao tema, tendo iniciado as pesquisas com análise de pacientes com esquizofrenia, como mostra essa reportagem. “ Por volta de 2011, um dos meus alunos de mestrado, que trabalhava com ciência de dados, começou a analisar dados de pacientes que tinham esquizofrenia. Nós analisamos um caso particular de esquizofrenia que ocorria em crianças e jovens, principalmente, e então, descobrimos que era possível fazer a classificação dos pacientes usando redes complexas e aprendizado de máquina. Coletamos dados do cérebro, de ressonância magnética, e modelamos as conexões como uma rede. Nós notamos que havia uma diferença entre pessoas que tinham esquizofrenia e pessoas que não tinham, de modo que conseguimos identificar essas diferenças na estrutura do cérebro dos pacientes”, explica Francisco.

Números e desafios do diagnóstico

O TEA é uma condição do neurodesenvolvimento cujos sintomas associados variam consideravelmente. A incidência, segundo o último relatório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, é de um caso a cada 36 pessoas. “Na Coreia e na Inglaterra, já se investigou que este índice de incidência pode chegar a 10%, um a cada dez, e talvez aumente cada vez mais”, observa Francisco. “O que acontece é que a gente percebe que não aumentaram tanto os casos; o aumento é, principalmente, devido a uma melhora no diagnóstico”.

Ainda assim, detectar o TEA é um grande desafio pelo alto grau de complexidade. “Hoje em dia, se você quiser saber se você tem diabetes, basta ir a um médico e fazer um exame de sangue. No entanto, na maioria dos transtornos mentais, nós não temos uma maneira de fazer isso. E aí que entram as nossas pesquisas sobre o diagnóstico de autismo e do déficit de atenção.  No caso do autismo, temos três níveis de suporte, denominados níveis 1, 2 e 3, sendo que o nível 3 é o que precisa de muito suporte. Nesse nível, as crianças geralmente não se comunicam; no nível 2, se comunicam, mas um pouco menos do que uma pessoa que seja nível 1. E o nível 1 seria o caso leve. O caso leve é o mais difícil de diagnosticar, porque pode-se confundir o TEA com outros tipos de transtornos, como TDAH ou TOC”.

 

*Texto adaptado de Raquel Vieira – Comunicação CeMEAI

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado


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