A Rede Orçamento Mulher lançou nesta quarta-feira (11) uma carta-compromisso em defesa de orçamentos municipais que olhem para gênero e raça. O grupo quer sensibilizar as candidaturas a prefeito e vereador nestas eleições municipais para a importância de destinar recursos às ações de superação das desigualdades. Fundada por iniciativa de deputadas federais, a rede reúne figuras da política, organizações sociais e pesquisadoras acadêmicas, incluindo professoras da USP e de outras universidades.
O documento defende o compromisso do poder público municipal com a elaboração de orçamentos públicos voltados à superação das desigualdades de gênero e raça. Para isso, traz propostas como a participação de mulheres e pessoas negras nos secretários ou mandatos, bem como a destinação de recursos adequados para políticas de promoção à igualdade de oportunidades. Outro ponto importante é a transparência nas informações sobre a execução do orçamento municipal, que devem ser acessíveis e compreensíveis para toda a população.
“Estamos trabalhando nessa incidência para que os candidatos se comprometam nos seus municípios a pensar nos orçamentos por gênero e raça”, afirma Ursula Dias Peres, professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP e integrante da Rede Orçamento Mulher. Até o fechamento desta reportagem, a rede já tinha confirmado a adesão à carta-compromisso por políticos de diferentes campos do espectro político, incluindo candidatas e candidatos filiados ao PT, PSOL, PSB e PL.
Ursula conta que a preocupação com a destinação de recursos para políticas públicas que beneficiam especificamente mulheres e pessoas negras é algo recente. Começou junto com as cotas no funcionalismo público e a chegada dessas pessoas aos cargos de planejamento governamental. “O orçamento sempre foi um espaço de uma estrutura normativa considerada muito técnica e feita majoritariamente por homens, brancos. Quando você não tem diversidade, essas questões não chegam”, diz a docente.
Analisar estruturas
Para mudar o cenário, a metodologia proposta pela rede envolve, em uma primeira etapa, um esforço para encontrar na estrutura do governo onde estão as políticas para mulheres e para pessoas negras. “Isso significa um esforço do governo de cada ente em analisar a sua estrutura organizacional, funcional e programática para analisar em cada programa aquilo que atende diretamente e exclusivamente mulheres e aquilo que atende indiretamente mulheres, e o mesmo para pessoas negras”, diz Ursula.
Nos municípios, um exemplo nesse sentido seria identificar a dotação no orçamento para uma casa de acolhida de mulheres vítimas de violência doméstica como uma despesa que beneficia exclusivamente mulheres. Já uma dotação orçamentária para a construção de creches seria um gasto que beneficia as mulheres indiretamente, já que não dá para dizer que homens não se beneficiam com a abertura de vagas para seus filhos em creches públicas. Com esses dados em mãos, é possível calcular indicadores dos gastos públicos com políticas de gênero, mesmo que o município não tenha uma secretaria da mulher ou um plano temático para questões de gênero.
Um passo mais ambicioso no compromisso com a equidade de gênero e raça consistiria em repensar a forma como o orçamento descreve as ações do poder público, de forma a identificar as pessoas e territórios beneficiados por cada programa. Atualmente, só o governo federal e a cidade de São Paulo fazem um detalhamento semelhante em seus instrumentos de planejamento. Como resultado do trabalho da rede, no ano passado, o governo federal incluiu gênero e raça como agendas transversais no Plano Plurianual. O Plano Plurianual é o documento que define as prioridades do poder público nos próximos quatro anos. Já a prefeitura de São Paulo identifica os gastos públicos por subprefeitura.