Exposição no Paço das Artes resiste às pressões das redes sociais

Em “Táticas de Desaparecimento”, seis artistas reagem contra os mecanismos de controle das novas tecnologias
 

 19/02/2021 - Publicado há 4 anos
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Obras da mostra Táticas de Desaparecimento, no Paço da Artes – Arte sobre fotos da exposição

 

Ficar invisível, desaparecer seria uma estratégia para fugir das pressões das redes? Como resistir às formas de controle do próprio corpo e identidade diante dos mecanismos de vigilância de tecnologias imperceptíveis? São essas questões que a mostra Táticas de Desaparecimento compartilha com o público no Paço das Artes, em São Paulo, a partir desta sexta-feira, dia 19. A instituição apresenta a nova edição da Temporada de Projetos, um dos mais importantes editais do País, que está completando 25 anos de incentivo e divulgação da arte contemporânea.

A curadoria da mostra é de Nathalia Lavigne, pesquisadora e doutoranda da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, sob orientação de Giselle Beiguelman, colunista da Rádio USP. Táticas de Desaparecimento apresenta um tema que começou a ser trabalhado em 2019, mas mudou de rumo com a nova rotina imposta pela pandemia. “Uma outra ideia de presença parece ter sido reinventada ao longo do último ano”, explica Lavigne. “Fomos ainda mais absorvidos pela dinâmica controversa das redes sociais, com overdoses diárias de lives e uma produção excessiva de outras formas de presença. Deepfaces e deepfakes, tecnologias de reconhecimento facial e imagens criadas por Inteligência Artificial, que reproduzem rostos e vozes com um efeito absurdamente real, ganharam um terreno ainda maior.”

Tal pressão diante de um cenário mundial com proporções dramáticas parecia reforçar, segundo a curadora, um desejo de se ausentar de tudo. “Por outro lado, a noção de desaparecimento ganhou um sentido quase literal em meio a uma pandemia de proporções tão graves.” 

“Os seis artistas reunidos na mostra partem da ideia de desaparecimento sob aspectos bem variados, incluindo as contradições que ela evoca.”

 

 A ideia do desaparecimento como um movimento contrário à visibilidade excessiva está nas obras da carioca Aleta Valente, da iraniana radicada nos Estados Unidos Maryam Monalisa Gharavi, dos paulistanos Nino Cais e Regina Parra, da goiana Sallisa Rosa e do mineiro Thiago Honório. “Os seis artistas reunidos nessa mostra apresentam aspectos bem variados, incluindo as contradições que ela evoca”, analisa Nathalia Lavigne. “Muitas das obras têm origem no ambiente das redes sociais ou das imagens técnicas, em que a noção de desaparecimento é tratada de forma ampla. Há desde uma discussão no campo da tecnologia sobre o desaparecimento dos arquivos, considerando  a impermanência dos dispositivos, exemplos de censura em redes sociais e uma invisibilidade estratégica adotada contra práticas de vigilância, até processos de autorrepresentação como performance, pensando de que forma uma visibilidade constante pode gerar um processo contrário de negatividade e apagamento.”

A curadora comenta que “os artistas utilizam estratégias de infiltração ao reproduzir como paródia uma linguagem ali disseminada à exaustão, como fazem Aleta Valente e Sallisa Rosa. Ou ao ocupar esses espaços de forma transitória, como Thiago Honório”. Destaca também a invisibilidade como resposta à superexposição e vigilância nos trabalhos de Nino Cais e Regina Parra. “Ou apagamento de arquivos e identidades criadas e desfeitas do dia para a noite, como Maryam Monalisa Gharavi.”

As luvas suspensas da obra Present, de Thiago Honório, doutor em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, revelam as impressões de uma trajetória. “O artista parece anunciar que ainda pairamos sob uma ideia incerta do que é estar presente neste momento”, afirma a curadora. “Ao mesmo tempo, indica uma mensagem otimista de que não desaparecemos completamente. Talvez apenas por um tempo.”

Terra de Ninguém, de Aleta Valente – Foto: Divulgação
Bio, de Maryam Monalisa Gharavi – Foto: Divulgação
Sem título, Nino Cais – Foto: Divulgação
Eldorado Acre, Regina Parra – Foto: Divulgação
Série Autorretrato, de Sallisa Rosa – Foto: Divulgação
Série Present, de Thiago Honório – Foto: Divulgação

 

A exposição Táticas de Desaparecimento, com curadoria de Nathalia Lavigne, fica em cartaz até 16 de maio, de terça-feira a domingo, das 12 às 18 horas, no Paço das Artes (Rua Albuquerque Lins, 1.331, Higienópolis, em São Paulo). Entrada grátis. Mais informações estão disponíveis no site do Paço das Artes.

 

 

 


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