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Contato com áreas verdes tem efeitos da saúde cardiovascular à mental
Artigos científicos relatam efeitos psicológicos e fisiológicos positivos gerados pelo contato com a natureza; pesquisa destaca potencial do ecoturismo para conservação ambiental e promoção da saúde
De acordo com o MapBiomas, apenas 6,9% das áreas urbanas de cidades brasileiras são cobertas por vegetação – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
“Já há um tempo, estamos olhando bastante para como as áreas verdes podem ter cada vez mais um valor explícito para a sociedade. Querendo ou não, isso impacta muito na forma que direcionamos recursos para essas áreas’’, diz Gabrielle Nunes, doutoranda em Ecologia Aplicada no Departamento de Ciências Florestais da Esalq. Apesar da grande biodiversidade de fauna e flora, ela ressalta o pouco número de estudos relacionados ao tema no Brasil como uma das motivações da investigação.
A pesquisa também se associa aos aumentos significativos de problemas de saúde mental e física,“especialmente entre pessoas que vivem em grandes centros urbanos”, afirma Teresa Magro, professora do curso de Engenharia Florestal da Esalq.

Atuante com manejo de áreas protegidas e benefícios da natureza para as pessoas, Teresa afirma que outras pesquisas já indicam que a falta de contato com a natureza é um dos fatores que contribui para esse cenário de deterioração da saúde pública.
A seleção dos artigos foi feita utilizando um banco de dados com 211 estudos sobre áreas verdes e bem-estar humano. Porém, segundo Gabrielle, foram separados apenas aqueles que envolviam interações entre pessoas e meio-ambiente por meio da observação ou de atividades relacionadas, como caminhadas. A restrição também se aplicou a artigos que necessariamente abordam ambientes de parques, florestas, espaços verdes urbanos e de grande biodiversidade. “Isso é muito feito na pesquisa científica, para não tentar inventar a roda. Já temos um banco robusto de dados, não precisamos buscar refazê-lo do zero”.
A análise revelou que 94% dos estudos reportaram efeitos positivos do contato com a natureza, abrangendo 12 efeitos psicológicos positivos e 5 efeitos fisiológicos. Apenas 8,95% dos estudos relataram efeitos neutros, e nenhum efeito negativo foi observado. As evidências sugerem que o desenvolvimento de experiências turísticas baseadas nesses benefícios poderia aumentar a atratividade dos destinos.

Para entender os reais benefícios para a saúde das interações com a natureza, a principal classificação utilizada foi a divisão das atividades entre observações passivas e ativas. Gabrielle explica que a observação passiva consiste na noção de presença de uma área verde, mas ela não ser o foco de atenção. “Se estou caminhando em uma área verde, ouvindo música, obviamente que o ambiente externo tem um efeito sobre mim. Porém, mesmo eu visualizando isso, não estou prestando atenção em características ou aspectos específicos daquele ambiente”.

Pela análise dos artigos, foi verificado que a grande maioria deles (94,03%) relata resultados positivos do contato com a natureza. Dentre os efeitos psicológicos encontrados estão a redução de ansiedade, do estresse e da irritação, enquanto melhorias na saúde cardiovascular foram destaque nos efeitos fisiológicos. Outro aspecto mencionado com frequência nos estudos foram os efeitos restauradores que as áreas verdes podem proporcionar, como a influência na recuperação do estado de fadiga mental e a melhora no estado de humor.
Os aspectos físicos e psicológicos são separados, mas, muitas vezes, eles estão bem relacionados. Se eu estou menos estressada, obviamente que isso se expressará fisicamente no meu corpo” – Gabrielle Nunes
Para além dessas conclusões, alguns poucos estudos sugerem que a conexão com o meio ambiente pode afetar outras condições ainda não tão investigadas. Entre elas está o aumento da empatia e da espiritualidade por meio de interações sociais dentro desses ambientes, assim como as melhorias na cognição e na concentração após o encontro com a natureza.
Potencialidades para o ecoturismo
Dados divulgados ano passado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) com apoio do Ministério do Turismo indicaram que o ecoturismo já representa 60% do faturamento do setor no País. Diante da grande porcentagem, é de se esperar um investimento na área. Porém, Gabrielle relata a falta de estrutura e a necessidade de ressignificar a forma como as pessoas interagem com o ambiente. Certos comportamentos ao visitar uma área verde, como não respeitar as regras e não “entender a importância daquele espaço e da biodiversidade que está ali”, podem ser danosos para essas localidades no Brasil.
Ao explicar como um estudo que destaca os benefícios da natureza ao bem-estar humano pode trazer novas oportunidades no ecoturismo, a pesquisadora ressalta que uma consciência coletiva é capaz de pressões maiores nas tomadas de decisões sobre conservação ambiental. “O que não é visto, não é lembrado nem direcionado recursos”.
Nessa lógica, Gabrielle desenvolve sua pesquisa de doutorado, relacionando projetos de observação da natureza com iniciativas de ciência cidadã. Segundo ela, estes projetos têm tido impacto direto nos ciclos de políticas públicas destinadas à proteção de áreas verdes. Teresa complementa ao dizer que efeitos importantes como esse podem contribuir para a criação de mais espaços verdes e públicos dentro das cidades. “Se áreas públicas, sejam as cidades ou as unidades de conservação, forem bem planejadas, todos se beneficiam, incluindo o setor do turismo”.
O artigo Observar a natureza pode melhorar o bem-estar humano? Oportunidades para o Ecoturismo pode ser lido aqui.
Mais informações: gabinunes.bio@usp.br, com Gabrielle Nunes, e teresa.magro@usp.br, com Teresa Magro.
*Estagiária sob orientação de Fabiana Mariz

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