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O Trem das Onze, imortal samba de Adoniran Barbosa popularizado pelo grupo Demônios da Garoa, é a fonte de inspiração de uma pesquisa feita na USP sobre ferrovias paulistas. O historiador de economia Stanley Plácido investigou o papel da linha Tramway da Cantareira, de que fala a canção, no desenvolvimento urbano da região – desde 1893, ano em que foi construída, até 1965, quando foi desativada pelo governo.
Nos versos da música, sobre o trem que saía do Jaçanã, na zona norte de São Paulo, o compositor justifica que não pode ficar mais com a amada porque, se perder esse trem, outro “só amanhã de manhã”. O samba, que foi sucesso na década de 1960, dava a entender que a única alternativa para voltar para casa de quem morava na região era pelo transporte ferroviário. De fato, segundo Plácido, o trem era o barato e o principal meio de locomoção da população, carregando também insumos agrícolas, hortifrutigranjeiros e outros gêneros alimentícios. Mais tarde, a linha foi responsável por fazer a ligação da cidade de Guarulhos à capital paulista, conta o pesquisador da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Crise hídrica
Poucas pessoas sabem, mas o que impulsionou a construção da linha ferroviária, que inicialmente saía do bairro da Luz, no centro da cidade, e chegava à Vila Galvão (mais tarde, este trecho foi sendo ampliado até chegar ao município de Guarulhos, na Grande São Paulo), foi a crise hídrica vivida no Estado de São Paulo, devido ao intenso fluxo migratório no final do século 19.
Por um bom tempo, a ferrovia de bitola estreita transportou materiais e pessoas para construção do reservatório para captação de água proveniente da Serra da Cantareira. Geralmente, os trilhos de bitola estreita (caminho de ferro por onde passa o trem) são de custos mais baixos, embora os de largura normal proporcionem mais conforto aos passageiros e permitam maiores velocidade e capacidade de carga.
Auge e declínio
Passada a fase de auxiliar nas obras de construção do Sistema Cantareira, hoje considerado o maior reservatório de água da região metropolitana, a via férrea continuou sendo fundamental para o desenvolvimento urbano da região. Devido ao crescimento populacional, ela se consolidou definitivamente na mobilidade urbana de pessoas, embora continuasse transportando cargas. Vários projetos foram apresentados ao governo para estender a ferrovia para zonas adjacentes, mas só foi em 1915 que novas estações chegaram à cidade de Guarulhos, quando a linha viveu seu auge.
Anos mais tarde, depois de cumprir o papel que dela se esperava, o declínio da ferrovia começou a acontecer até ser desativada em 1965. As razões concretas que levaram ao fechamento foram muitas: era alvo de críticas pela superlotação dos trens e pelo anacronismo do poder público em relação às melhorias necessárias para modernizar a linha. Além disso, operava em déficit orçamentário, ou seja, com saldo negativo. O transporte público, que em geral é deficitário, necessita de subsídios governamentais para funcionamento. Por essa razão, foram raros os anos em que a ferrovia foi superavitária, tendo saldo positivo, explica Plácido.
Juntando-se a tudo isso, a causa mais provável que levou à desativação da linha foi o fato de que, nas primeiras décadas do século 20, houve incremento governamental para ampliar o transporte por rodovias. Nesta época, foram implantadas novas linhas de ônibus e feita abertura de rodovias próximas às regiões contempladas pelo traçado da companhia ferroviária. Assim, aos 72 anos de vida, a linha do “Trenzinho da Cantareira” ou o “Trem das Onze” chegava ao seu fim, permanecendo até hoje no imaginário coletivo e imortalizado pela canção de Adoniran.
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Clique no player abaixo e ouça a música O Trem das Onze
Fonte: Canal oficial dos Demônios da Garoa
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A tese O tramway da Cantareira e sua relação com o desenvolvimento local: infraestrutura urbana e transporte de passageiros (1893-1965) foi defendida em 2018, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), por Stanley Plácido da Rosa Silva, sob orientação do professor José Eduardo Marques Mauro, do Departamento de História Econômica da USP.
Mais informações: stanleyplacido@hotmail.com, com Stanley Plácido.
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