A exposição de gestantes à poluição do ar durante a gravidez influencia o desenvolvimento do feto. A criança pode apresentar baixo peso ao nascer, além de ter aumentada a possibilidade de apresentar determinadas doenças na vida adulta, de acordo com estudos realizados no Brasil e no exterior. Os mecanismos moleculares por trás desses impactos da poluição na gestação, contudo, ainda não estavam completamente elucidados.
Um grupo de pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) constatou agora que a exposição a poluentes atmosféricos, antes ou durante a gravidez, altera algumas características da placenta, além de causar distúrbios em um sistema hormonal relacionado ao fluxo sanguíneo uteroplacentário e diminuir os níveis de fatores envolvidos no processo de formação placentária.
Os resultados do estudo, realizado no âmbito de um Projeto Temático e do doutorado de Sônia de Fátima Soto, feito com Bolsa da Fapesp, foram publicados na revista Plos One.
“Observamos que a exposição a poluentes antes e/ou durante a gravidez desencadeia alguns fenômenos inflamatórios ao longo do desenvolvimento da placenta que comprometem seu crescimento. Isso possivelmente interfere na transferência de nutrientes e de oxigênio da mãe para o feto”, disse Joel Claudio Heimann, professor da FMUSP e orientador de Soto, à Agência Fapesp.
Os pesquisadores realizaram um experimento em que expuseram ratas Wistar – linhagem albina da espécie Rattus norvegicus –, antes de acasalarem e ficarem prenhes, tanto ao ar filtrado quanto ao ar poluído, criado a partir de um concentrador de partículas. O tamanho da partícula de poluição foi determinado com base nas exposições ambientais reais na Região Metropolitana de São Paulo.
Os animais foram divididos em quatro grupos. O primeiro foi exposto ao ar filtrado antes e durante a gravidez; o segundo foi colocado em contato com ar filtrado antes da gravidez e com ar poluído durante a gravidez; um terceiro grupo foi submetido ao ar poluído antes da gravidez e ao ar filtrado durante a gravidez; e o quarto, ao ar poluído antes e durante a gravidez.
Para simular as condições reais de exposição de mulheres à poluição do ar antes e durante a gravidez em cidades como São Paulo, antes da gravidez os animais foram colocados em contato com ar poluído durante uma hora cinco vezes por semana por três semanas seguidas. A partir do sexto dia de prenhez, o número de exposições foi de sete vezes por semana.
As placentas dos animais foram coletadas durante a gravidez, dissecadas e pesadas de modo a avaliar os efeitos dos poluentes em sua estrutura e no sistema hormonal renina-angiotensina (RAS) uteroplacentário.
Os resultados das análises indicaram que a exposição ao ar poluído antes e/ou durante a gravidez diminuiu a massa, o tamanho e a área superficial da placenta e causou alterações no sistema hormonal.
Estudos anteriores apontaram que distúrbios nesse sistema podem levar a uma redução do fluxo sanguíneo entre útero e placenta. Além disso, uma substância que faz parte desse sistema, a angiotensina II, é um potente regulador da migração e de um processo conhecido como invasão de trofoblasto no início da gravidez.
A invasão dos vasos sanguíneos maternos pelo trofoblasto (camada de células epiteliais que forma a parede externa da blástula dos mamíferos e atua na implantação e nutrição do embrião) é um pré-requisito para o estabelecimento de uma placenta normal e a continuação da gravidez, explicaram os pesquisadores.
“Constatamos que a exposição das ratas prenhes à poluição antes e/ou durante a gravidez causou alterações no sistema renina-angiotensina dos animais. Mas são necessários novos estudos para elucidarmos mecanismos moleculares adicionais”, disse Heimann.
Interferência na formação da placenta
Os pesquisadores também avaliaram os efeitos da exposição ao ar poluído em fatores que influenciam o processo de formação da placenta, como o fator de crescimento de transformação beta 1 (TGFβ1) e o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF-A).
As alterações verificadas neste aspecto indicam um possível comprometimento na formação de novos vasos sanguíneos da placenta e no processo de invasão de trofoblasto, ambos necessários para o desenvolvimento de uma placenta normal. “Isso pode ter consequências para a interação entre mãe e feto, como também limitar a nutrição e o crescimento fetal”, afirmou.
Elton Alisson / Agência Fapesp, com edição do Jornal da USP (Leia aqui o texto na íntegra)
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