Composto com ouro inibe sobrevivência de parasita que causa Chagas

Complexo leva quantidades mínimas do metal e apresentou bons resultados contra o “Trypanosoma cruzi”

 20/04/2017 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 02/10/2018 às 16:58

Composto enibe enzima essencial para a sobrevivência do Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas – Foto: CDC/Dr. Myron G. Schultz via Wikimedia Commons.
Pacientes que sofrem com os efeitos colaterais dos medicamentos utilizados atualmente no tratamento da doença de Chagas podem ganhar um alívio dentro de alguns anos. Pesquisadores do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (Crid) descobriram um novo complexo que apresentou bons resultados contra o
Trypanosoma cruzi, parasito causador da doença. O trabalho, que resultou em um artigo publicado recentemente no periódico Dalton Transactions, foi feito em parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), dos campi da USP em Ribeirão Preto e de São Carlos, e da Freie Universität Berlin, da Alemanha.

O complexo foi desenvolvido a partir da união de duas moléculas: a tiossemicarbazona, um composto orgânico, e o ouro. No Trypanosoma cruzi, a tiossemicarbazona atravessa a membrana da célula e atua diretamente na forma amastigota (que não possui flagelo), considerada a mais resistente.

De acordo com uma das autoras do trabalho, a pós-doutoranda do Departamento de Imunologia e Bioquímica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP Carla Duque Lopes, sabe-se que a tiossemicarbazona inibe a cruzaína, uma enzima essencial para a sobrevivência do parasito.“O ouro, como metal, pode atuar desestruturando o DNA do Trypanosoma cruzi ou em alguma via da rota metabólica. A ideia é que o complexo metálico atue em múltiplos alvos contra ele. Entretanto, seu mecanismo de ação ainda precisa ser mais bem estudado”, diz.

“Embora o ouro seja uma substância cara, o rendimento final é bom, com alto teor de pureza.

O estudo também avaliou que é preciso usar pequenas quantidades do composto para matar o parasito. “Possivelmente, para um tratamento, a quantidade de composto pode ser menor que a administrada para o benznidazol na clínica. Além disso, ele não perde suas propriedades quando em estado sólido. Isso permite transportá-lo sem a necessidade de resfriamento, o que é importante considerando que populações atingidas pela doença de Chagas nem sempre estão em locais de fácil acesso”, completa.

Próximas etapas

O benznidazol, medicamento usado atualmente para tratar pacientes com a doença, foi desenvolvido nos anos 50. Embora seja bastante eficaz na fase aguda, quando o parasito se multiplica e cai na corrente sanguínea, sua eficácia na fase crônica ainda é controversa.

O benznidazol é bastante eficaz na fase aguda da doença – Foto: CDC

“Além disso, o paciente precisa ser internado para o tratamento, que dura cerca de 60 dias. Nesse período, ele recebe a medicação e pode desenvolver uma série de efeitos colaterais, como rash cutâneo (erupções vermelhas na pele), náusea e enxaqueca, o que o deixa bastante debilitado. Por isso, muitos abandonam o tratamento”, explica Carla.


Além de ser tão efetivo em matar o parasito quanto o benznidazol, esse complexo metálico de ouro apresentou um índice de seletividade 30, o que é considerado muito bom para avançar à próxima etapa: os testes pré-clínicos, feitos em camundongos. “O índice de seletividade é a razão entre o quanto a substância consegue matar o parasito e a toxicidade para a célula. Compostos com índice acima de dez são ideais para testes pré-clínicos”, diz a pesquisadora.

De acordo com ela, os estudos seguem em torno do mecanismo exato de ação do ouro e também de como o complexo poderia ser usado em um tratamento. “Há muitas ideias a respeito. Talvez associá-lo a outras substâncias ou até mesmo a uma dosagem menor de benznidazol, o que amenizaria os efeitos colaterais do atual tratamento.”

Sobre o Crid

O Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (Crid) é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) mantidos pela Fapesp e sediado no campus da USP em Ribeirão Preto.

Thais Cardoso, de Ribeirão Preto

Mais informações: e-mail crid@fmrp.usp.br


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