Ministro entendeu que bomba no Riocentro era atentado à população

Processo busca afirmação política, para não deixar impunes crimes relevantes da história, segundo Gustavo Badaró

 11/09/2019 - Publicado há 5 anos
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O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Rogério Schietti, votou pela retomada do processo que trata do caso Riocentro, atentado à bomba frustrado, ocorrido em maio de 1981. A ação é resultado de um recurso do Ministério Público Federal (MPF). Em acordo com a tese do MPF, o relator votou pela reabertura da ação por entender que os ex-militares supostamente envolvidos no atentado devem ser processados, já que crimes contra a humanidade são imprescritíveis, isto é, não têm prazo para serem julgados.

O professor Gustavo Badaró, do Departamento de Direito Processual da Faculdade de Direito (FD), explicou que no fundamento jurídico brasileiro não existe o crime contra a humanidade especificamente. “São considerados crimes normais, praticados neste contexto. É uma maneira de atrair a imprescritibilidade”, alega ao Jornal da USP no Ar. 

O Brasil, em setembro de 1992, tornou-se signatário da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). O tratado internacional prevê a imprescritibilidade de crimes que lesam a humanidade. O conceito surgiu após a Segunda Guerra Mundial, para impedir que a perseguição de cidadãos ficasse impune. Seria um entendimento de que “a bomba no Riocentro era um ataque generalizado aos presentes no show e à população”, de acordo com Badaró.

Guilherme Pereira do Rosário e Wilson Dias Machado, dois agentes do DOI-Codi do 1º Exército, planejaram explodir uma bomba em um show comemorativo do Dia do Trabalho. Cerca de 20 mil pessoas estavam presentes. O explosivo detonou precipitadamente nas mãos de Rosário, que faleceu. Machado ficou gravemente ferido. No caminho ao local do crime, placas foram pichadas com a sigla VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), um grupo de esquerda. Todas as evidências apontavam para um “acidente de trabalho” em meio a um crime premeditado. Essa é a versão da Comissão Nacional da Verdade, próxima à linha do MPF.

Atentado à bomba no Riocentro, em 1981 – Foto: Agência Brasil/EBC

“A noção de crimes contra a humanidade depende de um aspecto fático, mas também intencional. São considerados aqueles praticados no contexto de um ataque generalizado, sistemático, contra uma determinada população”, define o jurista. Sendo assim, trata-se da busca de uma afirmação política, no sentido de não deixar impunes certos fatos, que são considerados relevantes na história do País, ainda que várias décadas depois, de acordo com ele.

Badaró argumenta que a decisão da turma do STJ dependerá se eles entenderão, ou não, essa intenção de perseguição generalizada. Isso dependerá sob qual perspectiva os magistrados considerarão os acontecimentos. Schietti entendeu dessa maneira, mas o julgamento passará pela mão de outros quatro ministros, acarretando debate.

Após o voto do relator, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Reinaldo Soares da Fonseca. Não há data para a retomada do julgamento. O professor explica que os pedidos de vistas são feitos quando os magistrados sentem a necessidade de entender melhor algum ponto do relatório, ou algum dos argumentos de seus pares. “Essas discussões e análises fazem parte da boa prática jurídica”, diz.

Em julho de 2014 a Justiça Federal do Rio, em primeira instância, entendeu que os acusados não podem ser mais punidos, porque a pretensão punitiva prescreveu e trancou o caso. Se os ministros discordarem, as penas podem ser longas. “Só em relação ao homicídio que está registrado a pena máxima é de 30 anos”, afirma Badaró. Há denúncias também de formação de quadrilha e de uso ilegal de explosivos.

Recentemente, o debate sobre direitos humanos foi acirrado pelas denúncias de tortura envolvendo o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra e as condenações do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos.


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