Alimentos ultraprocessados são pobres nutricionalmente, ricos em açúcares e gorduras e têm sabor realçado por meio de aditivos químicos. O Ministério da Saúde aconselha evitar esse tipo de comida, e pesquisas divulgadas recentemente corroboram com essa ideia. Teses indicam a relação entre consumo de ultraprocessados e o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e crônicas. Para saber mais sobre esse assunto, o Jornal da USP no Ar conversou com a pesquisadora Eurídice Martínez Steele, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.
Eurídice conta que a Universidade de Paris foi a primeira a fazer uma pesquisa relacionando ultraprocessados e risco para doenças cardiovasculares. O estudo francês foi baseado em aproximadamente 105 mil adultos, com média de idade de 43 anos, que responderam questionários dietéticos de 24h, a cada seis meses, durante dois anos. Os participantes foram acompanhados por cinco anos. Os resultados foram interessantes: “A pesquisa mostrou que aqueles que consumiram mais alimentos ultraprocessados tiveram mais problemas cardíacos. Isso é, o acréscimo de 10% de alimentos ultraprocessados na dieta aumentava em 12% o risco relativo de doenças cardiovasculares, coronárias e cerebrovasculares”, conta.
A Universidade de Navarra, na Espanha, complementou essa descoberta. Foram avaliadas as possíveis associações entre a ingestão de alimentos ultraprocessados e o risco de morte, por qualquer causa. Nesse estudo, cerca de 20 mil pessoas, com média de 38 anos, foram acompanhadas durante uma década. Os participantes nesse caso responderam a questionários, assim como na metodologia francesa, e os resultados mostraram que o consumo de alimentos ultraprocessados estava associado ao aumento de 62% no risco de mortalidade. “Para se ter uma ideia, consumir mais de quatro porções de ultraprocessados ao dia aumentou em 62% o risco de morrer por qualquer motivo em comparação à ingestão de duas porções diárias. Para cada porção extra, o risco de morte sobe em 18%”, revela a especialista.
O Nupens, inspirado no estudo francês, está desenvolvendo o seu próprio estudo. Serão acompanhados mais de 200 mil brasileiros voluntários, com mais de 18 anos, por aplicativos instalados em celulares. O objetivo é avaliar a associação entre qualidade da dieta e desenvolvimento de doenças crônicas como obesidade, diabetes, hipertensão e até mesmo o câncer. O período de acompanhamento será de dez anos. Para saber mais sobre como se voluntariar e acompanhar as etapas da pesquisa, basta entrar no site do núcleo, que divulgará o estudo quando estiver pronto.
Eurídice ressalta que os estudos francês e espanhol não conseguem comprovar com 100% de certeza que o consumo de alimentos ultraprocessados é causa de doença cardiovascular e morte. Sempre existe a possibilidade de que alguns dos riscos observados sejam oriundos de variáveis não consideradas.
Medidas de conscientização são essenciais para que a população seja alertada e busque revisar seus hábitos alimentares. De acordo com a pesquisadora, a diminuição do consumo de ultraprocessados é um desafio, pois “precisamos pensar em macro, ou seja, pensar em toda a sociedade em vez de somente pensar no indivíduo, já que a responsabilidade por nossa alimentação é compartilhada com o Estado, que tem seu papel na promoção de uma alimentação saudável”.