Foto: Agência Brasil - Fotomontagem Jornal da USP

Elogios e críticas à proposta do novo “arcabouço fiscal”

Agora, em abril, o texto legal será submetido ao crivo do Congresso Nacional

 31/03/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 01/11/2023 as 10:20

Texto: Cinderela Caldeira

Arte: Simone Gomes

A suspensão da visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e comitiva à China, em função da inesperada pneumonia do inquilino do Palácio do Planalto, acelerou, como esperado, a divulgação da proposta do novo “arcabouço fiscal” para a economia do País.

Deixando de viajar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acertou em definitivo o teor da proposta com o presidente Lula e acelerou seu programa de visita aos chefes dos poderes legislativos e demais autoridades, que deveriam ter acesso ao seu conteúdo antes que a sociedade viesse a tomar conhecimento do seu teor – o que ocorreu , em entrevista coletiva, na última quinta-feira pela manhã.

Na verdade, foram divulgadas as linhas gerais e intenções da proposta, pois o conjunto ainda precisará ser detalhado, transcrito no linguajar legal para ser enviado ao Congresso neste mês de abril, onde será debatido, analisado e aprovado em partes ou não.

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Novo arcabouço fiscal coloca despesas em função da arrecadação

Em linhas gerais, a proposta aponta para:

Meta geral

Zerar o déficit público da União no próximo ano;
superávit de 0,5% do PIB em 2025;
superávit de 1% do PIB em 2026.

Objetivos importantes

Preservar gastos considerados prioritários em saúde, educação e segurança;

  • Aumentar investimentos públicos e impulsionar o crescimento econômico;
  • Controle da dívida pública e da inflação.

Pontos diversos

1. Investimentos: Haverá um piso para os aportes em investimentos. Será de R$ 75 bilhões mais a inflação do ano.

2. Trava para gastos: As despesas do governo deverão crescer abaixo da expansão das receitas. Os gastos só poderão subir o equivalente a até 70% da variação da receita. A receita será apurada entre junho e primeiro de julho, já que o Orçamento é enviado em agosto. Em 2024, por exemplo, a receita considerada será entre julho de 2022 e junho de 2023.

3. Gastos: Haverá uma banda para o crescimento real das despesas, independente do comportamento da arrecadação. As despesas sempre crescerão entre 0,6% a 2,5% ao ano acima da inflação. O objetivo é criar um mecanismo anticíclico. Ou seja, em momentos de economia mais fraca, o gasto seria maior. E em momentos de alta, isso não vira gasto.

4. Educação e saúde: Investimentos em educação, especificamente no Fundeb, ficarão de fora do limite para gastos, porque já preveem vinculação constitucional. Os gastos com o novo piso de enfermagem também serão excluídos da trava nos gastos.

5. Resultado primário: As contas públicas terão a meta de voltarem ao azul em 2025. A previsão, para este ano, 2023, é de um déficit primário (receitas menos despesas, descontando o pagamento de juros da dívida púbica) de 0,5% do PIB. Em 2024, este déficit ficaria zerado. E, em 2025, haveria um superávit de 0,5% do PIB.

6. Bandas: Essas metas de resultado primário seriam cumpridas dentro de bandas, com um intervalo de 0,25% para mais e para menos. Para este ano, a margem é de um déficit entre 0,25% do PIB e 0,75% do PIB.

7. Margem para investir: Se as contas públicas tiverem um resultado superior ao previsto na meta, este excedente será direcionado a investimentos.

8. Trava: Se, por outro lado, o resultado primário das contas públicas ficar abaixo da meta, o governo é obrigado a reduzir as despesas para no máximo 50% da expansão da receita no ano seguinte.

As reações à proposta do arcabouço, exibidas pela imprensa, foram variadas, desde as que a consideram válida e factível até as que a rotulam como não crível. Ao fim e ao cabo, a simpatia pela proposta foi maior do que a crítica. Até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que insiste em manter a atual taxa de juros nos elevados 13,75%, que são um entrave ao projeto econômico de crescimento atual do governo, destacou, diplomaticamente, o que chamou de “esforços do ministro Fernando Haddad”.

Dúvidas, críticas e elogios

Hélio Zylberstajn - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Hélio Zylberstajn - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

“A proposta é bastante complicada, vai provocar muitos questionamentos, muita dúvida”, ponderou o professor Hélio Zylberstajn, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária – FEA da USP. “Em resumo, o que ela faz é preservar o crescimento do gasto público, o que não é surpresa porque estamos sob um governo do PT. Para esse governo, gasto é vida. Uma proposta de nova estrutura fiscal não poderia deixar de lado esse postulado. O gasto púbico vai crescer.” (Ouça aqui a íntegra de sua análise)

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“A proposta é muito pouco realista, para ser bastante condescendente. Ela conta com a possibilidade de um aumento muito grande de receita que dependeria de um desempenho muito vigoroso da economia. Isso não vai ocorrer, nem neste ano nem no próximo”, critica, por sua vez, o professor Simão Silber, também da FEA-USP. “Tem premissas falsas, de que vai haver aumento importante de receitas, muito maior do que o de despesas, que seria tão grande que ainda sobraria dinheiro para controlar a trajetória da dívida. (Ouça aqui a íntegra de sua análise)

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Paulo Feldmann - Foto: FEA-USP
Paulo Feldmann - Foto: FEA-USP

“É uma ótima proposta, tanto que as reações foram muito positivas: a do mercado, a bolsa subiu, o dólar caiu. Sem dúvida, é uma boa proposta e muito melhor do que se esperava”, disse o professor Paulo Feldmann, também da FEA-USP, em entrevista à Rádio USP no Ar.

“Com a taxa de juros alta, como está atualmente, não podemos ter um crescimento necessário, fundamental, para que haja o aumento das receitas. Esse pacote pressupõe fortemente um aumento das receitas para acontecer um aumento da atividade econômica. Esperamos que, agora, o Banco Central abaixe a taxa de juros. É uma expectativa muito importante”, pontua o especialista. (Ouça aqui a íntegra da entrevista)

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