Denúncia contra Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional pode não ser acatada

Paulo Borba Casella explica que o Tribunal Internacional pode alegar foco em crimes relacionados a conflitos armados e não prosseguir com a denúncia

 29/07/2020 - Publicado há 4 anos     Atualizado: 28/08/2020 às 12:50
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No último domingo, 26, o presidente Jair Bolsonaro foi denunciado por genocídio e crimes contra a humanidade no Tribunal Penal Internacional, em Haia. A acusação foi efetuada por uma coalizão de mais de um milhão de trabalhadores da área da saúde e coordenada pela Rede Sindical UniSaúde. Segundo especialista, apesar da expressividade, a denúncia pode não ser acatada, já que o tribunal julga, principalmente, crimes relacionados a conflitos armados.

Em entrevista ao Jornal da USP no Ar, o professor Paulo Borba Casella, do Departamento de Direito Internacional da Faculdade de Direito e do Grupo de Estudos sobre os BRICS (Gebrics) da USP, explica que o Tribunal Penal Internacional tem como propósito reprimir e punir crimes de guerra, crimes contra a humanidade, genocídio e atos de agressão estes podem ser cometidos por Estado ou pessoa física.

As denúncias levadas ao TPI não vão imediatamente para julgamento, primeiro passam por análise e, se cabíveis, são encaminhadas ao colegiado para o pedido de instauração de procedimento. O princípio da subsidiariedade que rege o Tribunal Internacional afirma que nenhum Estado é obrigado a levar o caso para tal instância, desde que alegue ter condições de julgar em seus tribunais internos. “Uma das coisas que tem de lembrar é que, provavelmente, o governo brasileiro, quando tiver que se manifestar em caráter preliminar, pode afirmar que não precisará levar ao Tribunal, porque nós podemos julgar isso no Supremo Tribunal Federal e os tribunais brasileiros têm perfeita condição de decidir sobre uma questão como essa. Isso poderia ser um expediente processual para esvaziar o caso”, afirma.

Para o especialista em direito internacional, as denúncias contra Bolsonaro são viáveis na Corte Interamericana de Direitos Humanos, na qual o Brasil já  foi condenado por crimes cometidos na ditadura militar, casos de trabalho análogo à escravidão e violação de direitos indígenas. A Corte Interamericana, com base na Convenção Americana de Direitos Humanos, tem clara interpretação e jurisprudência consolidada sobre direito à vida, à saúde, à integridade física e questões de proteção de povos autóctones.”

Casella acredita que a gestão política no Brasil tem sido desastrosa e até criminosa, porque em relação ao meio ambiente, por exemplo, observa-se o intuito deliberado de desmanchar os mecanismos de controle. “Em relação a saúde, a pandemia e aos riscos contra povos indígenas não é só uma questão de omissão ou incapacidade. Podemos dizer que tem intuito de cometer crime quando exclui, por veto presidencial, requisitos específicos de proteção e de providências com relação a proteção dos povos indígenas”, e complementa: “Mais do que a simples negligência e capacidade, isso vem se somar a uma política desastrosa em vários campos, inclusive de direitos humanos, com uma ministra cheia de preconceitos e que não gosta de minorias e que parece não enxergar esses grupos vulneráveis, que pela sua própria condição de minoria precisam de proteção.”

O professor diz que o tema  de crimes contra a humanidade é de extrema relevância neste momento e que a discussão tem espaço dentro da Academia. Ele lembra que durante o segundo semestre da USP, através de uma parceria entre três unidades da USP, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Faculdade de Direito e Instituto de Relações Internacionais, ocorrerá o Fórum Permanente Sobre Genocídios e Crimes Contra a Humanidade ocorridos no século XX.

Ouça entrevista na íntegra pelo player acima.


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