O DeepsSeek, modelo de inteligência artificial chinês, é agora a bola da vez quando o assunto é IA e muito por contrariar a ideia de que apenas com megagigantescos investimentos é possível participar da revolução dessa área da tecnologia. Conforme diz Giselle Beiguelman, o modelo foi desenvolvido com praticamente 3% do custo que a OpenAi investiu nos seus modelos. O grande diferencial é no quesito da acessibilidade, permitindo que se baixe e execute o seu modelo, evitando os altos custos computacionais de treinamento. Além disso, permite rodar o seu modelo localmente, ou seja off-line. Tudo isso, para países como o Brasil, são questões importantes, na visão da colunista. Ela observa, contudo, que aspectos fundamentais do desenvolvimento do DeepSeek, como os dados de treinamento e scripts de processamento, permanecem fechados, assim como são fechados em todas as outras grandes plataformas e seus produtos.
“E isso quer dizer que seguimos operando num mundo bastante opaco da inteligência artificial, porque não sabemos de onde vem o seu substrato – ou seja, os dados com que esses modelos foram treinados inicialmente e de onde parâmetros de grande impacto social emergem e aprofundam problemas e questões como o racismo, por exemplo, e isso fica patente no uso de tecnologias de reconhecimento facial, em processos de recrutamento profissional baseados em IA, na segurança pública, em sistemas de triagem de saúde e também na arte, impactando a diversidade de representações e linguagens.” Para a colunista, isso nos coloca diante de uma das principais ambivalências atuais sobre para onde a inteligência artificial pode nos levar do ponto de vista do imaginário coletivo. “Por um lado, estamos diante da potência de uma tecnologia que opera na relação entre inteligências humanas e não humanas, abalando pilares antropocêntricos que fundamentam uma série de hierarquias, altamente comprometidas com o colonialismo. Por outro lado, estamos vivendo uma era de padronização, fundamentada nos modelos das IAs, numa escala de concentração de poder em grandes empresas, sejam elas estadunidenses ou chinesas, como nunca vimos. A pergunta que não quer calar é: Que tipo de abertura teremos para pensar e imaginar o que fica fora do padrão, aquilo que é contra-hegemônico? É ainda possível, no âmbito da inteligência artificial, pensar em tecnologias desobedientes?”
Ouvir Imagens
A coluna Ouvir Imagens, com a professora Gisele Beiguelman, vai ao ar quinzenalmente, segunda-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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