O nebuloso cenário político que, no Brasil, investe contra a qualidade da democracia

José Álvaro Moisés comenta os últimos acontecimentos relativos ao indiciamento de Jair Bolsonaro e sua trupe pelo plano que previa o assassinato de Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes

 27/11/2024 - Publicado há 3 meses

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O professor José Álvaro Moisés, em sua coluna desta semana, entende que a situação política do Brasil, dados os últimos acontecimentos, se complica cada vez mais. Ele se refere ao indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outras 36 pessoas, entre as quais generais do Exército, como Braga Neto e Augusto Heleno, sob a acusação de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Foi o terceiro indiciamento do ex-presidente e, segundo especialistas jurídicos, o mais grave de todos. Os indiciamentos decorreram de investigações realizadas pela Polícia Federal a partir da delação premiada do ajudante de ordens de Bolsonaro, coronel Mauro Cid. Para Moisés, o mais surpreendente em todo esse caso foi a revelação de que, para dar o golpe agendado para 15 de dezembro de 2022, os coordenadores do grupo, segundo a Polícia Federal, decidiram assassinar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes – os primeiros seriam envenenados e o último sofreria um atentado a bombas. “Em que pesem as evidências encontradas pela Polícia Federal – conversas gravadas e evidências de reuniões de planejamento do golpe, inclusive a minuta de um decreto achado na casa do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, alterando a ordem jurídica do País -, o ex-presidente e seu grupo argumentam que é tudo falso, não havia plano de golpe algum e tudo não passa de perseguição política do Supremo Tribunal Federal, particularmente do ministro Alexandre de Moraes.”

Os resultados do inquérito da Polícia Federal, que vêm desde os acontecimentos de 8 de janeiro de 2022, foram entregues à Procuradoria Geral da República. Promotores e procuradores do Ministério Público vão examinar se existem elementos suficientes e provas efetivas que justifiquem o envio do processo para a Corte Suprema, que, aceitando, deverá julgá-lo segundo princípios da Constituição Brasileira, diz o colunista. De todo modo, segundo ele, os acontecimentos impactaram a conjuntura política do País. E aqui ele cita argumentos dos principais teóricos da democracia para reforçar sua opinião. O alemão Konrad Adenauer diz, por exemplo, que a democracia é um regime muito diferente de suas alternativas, algumas de suas características fundamentais tocam bastante o que aconteceu no caso do Brasil – a primeira delas é que a democracia é a solução pacífica dos conflitos políticos de sociedades complexas e desiguais como o Brasil, “ou seja, diante do confronto de atores diferentes que disputam o poder, ao invés da guerra de todos contra todos, a democracia prevê meios pacíficos e legais para definir quem deve ocupar o poder, e isso não é um privilégio de poderosos que decidem por conta própria, mas depende de uma consulta a toda a comunidade através de eleições limpas e significativas que respeitem a igualdade de condições entre os competidores”.

James Madison, um dos pais da democracia norte-americana, enumera como uma outra característica da democracia o que chamou de a ambição excessiva, “ou seja, o desejo de grupos ou de atores políticos que querem chegar ao poder a qualquer custo, independentemente do que pensam os demais e mesmo dos interesses de outras pessoas. Essa ambição, segundo Madison, tem de ser controlada para que a democracia floresça e sobreviva. Essas condições foram validadas pelo estabelecimento do império da lei, ou seja, de regras que valem para todos e que têm que ser obedecidas por todos para que a democracia possa funcionar – pois bem, Bolsonaro e seu grupo ignoraram tudo isso, tentaram quebrar essas regras fundamentais; sem argumentos para se explicar, apelam para a solução de perseguição política, mesmo tendo produzido todas as evidências que foram levadas em conta pela análise da Polícia Federal para propor os indiciamentos”, finaliza Moisés.


Qualidade da Democracia
A coluna A Qualidade da Democracia, com o professor José Álvaro Moisés, vai ao ar quinzenalmente,  quarta-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9 ) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.

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