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Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: Freepik
Mulheres são maioria na pós-graduação, mas ficam atrás em cargos de liderança e nas exatas
Mulheres registram maioria dentre pesquisadores da USP, mas ainda encontram dificuldades no crescimento da carreira; Ciência e Tecnologia, Engenharia e Matemática continuam majoritariamente masculinas, assim como cargos de liderança, revela relatório divulgado pela USP
A Pró-Reitoria de Pós-Graduação (PRPG) publicou o relatório As Mulheres na Pós-Graduação, com dados que demonstram a evolução da participação das mulheres nos programas de pós-graduação da USP desde 2001. O documento compila relatos de professoras e pesquisadoras, além de números que revelam a desigualdade de gênero persistente em alguns dos ambientes acadêmicos. O relatório foi divulgado no fim do mês de março, em comemoração ao Mês da Mulher, e pode ser acessado neste link.
Segundo o levantamento, as mulheres compõem, atualmente, 55% dos discentes totais nos programas de pós-graduação da USP. No entanto, mesmo sendo maioria no número total de estudantes, a disparidade fica evidente quando as áreas chamadas de STEM (sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) são analisadas: enquanto os homens constituem 59% dos estudantes, as mulheres representam 40,7% das estudantes de pós na área.
Outra dificuldade enfrentada pelas pesquisadoras é a progressão da carreira, levando a cargos de liderança e a espaços de tomada de decisão. Apenas 30,6% das mulheres docentes progrediram para a posição de professoras titulares, enquanto os homens concentram 69,4% das promoções ao topo da carreira universitária. É o chamado “efeito Matilda”, quando a contribuição feminina é ocultada na história e nas instituições.
Para o professor Niels Olsen Saraiva Câmara, pró-reitor adjunto de Pós-Graduação, a Universidade pode contribuir para ampliar a inclusão. “Iniciativas de apoio com aporte de recursos que promovam a inclusão, a equidade de gênero e a diversidade são fundamentais para avançarmos em busca de uma excelência na formação discente e nas pesquisas”, afirma.
De outro lado, Ana Carolina Takakura Moreira, professora associada do Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, lembra que apenas em torno de 35% das mulheres são bolsistas de produtividade do CNPq. “E quando se olha para a categoria e níveis mais elevados da bolsa, essa porcentagem ainda diminui mais. Além disso, existe um menor número de mulheres que são ou foram presidentes de sociedades científicas, diretoras de institutos e faculdades, reitoras, pró-reitoras”, afirma em depoimento para o relatório da PRPG. Ela destaca que, até hoje, nunca tivemos uma mulher presidente do CNPq e que somente agora temos, “pela primeira vez, uma mulher presidente da Academia Brasileira de Ciências e ministra da Ciência e Tecnologia”.
Evolução
O relatório apresenta análises de dados entre os anos de 1973 a 2022. Ao longo das décadas, o número de mulheres tituladas na pós-graduação da USP cresceu regularmente. Em 1973, apenas 30% dos títulos de pós-graduação foram dados a mulheres. Com crescimento constante, o número passou de 50% nos anos 2000 e se manteve estável até 2022, consolidando as mulheres como maioria entre as discentes na pós-graduação.
A porcentagem de mulheres que orientaram projetos de pesquisa na pós-graduação foi outro dado analisado. Entre 1973 e 1986, o número de projetos orientados por professoras mulheres nunca ultrapassou a casa dos 20%. A partir de 1986, a porcentagem apresentou ligeiro crescimento, ultrapassando os 30% em 1999 e se estabilizando entre 39% e 41,1% nos últimos 12 anos.
Apesar do número de mulheres orientadoras estar na casa dos 40% de maneira geral, algumas unidades analisadas individualmente concentram mais orientadoras que outras. De 51 unidades analisadas, 13 possuem mais orientadoras do que orientadores, ficando nesse quesito em primeiro lugar a Escola de Enfermagem (87,5%).
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Em contrapartida, há unidades majoritariamente masculinas, com menor porcentagem de orientadoras, como o Instituto de Física de São Carlos (12,3%).
Outro número analisado foi o de mulheres responsáveis por lecionarem disciplinas de pós-graduação na USP. Até 1987, menos de 15% dos responsáveis por disciplinas eram mulheres. A porcentagem permaneceu abaixo dos 20% até 1994 e com ligeiro crescimento ultrapassou os 30% em 2005. Em 2018, essa porcentagem chegou a 35%. Em relação à participação feminina no Conselho de Pós-Graduação (CPG), como presidentes de CPG, apenas 33% são mulheres.
Políticas de incentivo
O pró-reitor adjunto de Pós-Graduação cita ações diretas da PRPG que visam a apoiar as mulheres pesquisadoras. “A PRPG vem mantendo apoio a pesquisadoras mães e dando suporte financeiro às(aos) bolsistas em licença-maternidade e paternidade como forma de promover uma maior inclusão na pós-graduação”, ressalta. As ações também estão listadas no relatório:
- Edital PAE – Mães Pesquisadoras. Tem como objetivo aperfeiçoar a formação de alunas/mães de pós-graduação para que permaneçam desenvolvendo com qualidade suas atividades de pesquisa. Desde sua primeira edição, em 2021, foram destinadas mais de 500 bolsas PAE para mulheres regularmente matriculadas, em condição monoparental ou responsáveis pelos cuidados com familiares dependentes. Em todos os editais, foram priorizadas as mulheres pertencentes às minorias (pretas, pardas, indígenas, portadoras de deficiências, imigrantes ou da comunidade LGBTQIA+) e bolsistas com menor renda mensal per capita. Em 2023, a PRPG lançou o quinto edital.
- Ações Afirmativas e Inclusão na Pós-Graduação, cujo objetivo foi criar proposições de um conjunto de políticas públicas que criam procedimentos e alocam recursos com a finalidade de aumentar a participação dos segmentos da população, incluindo as mulheres, no acesso, inclusão e permanência na pós-graduação da USP.
- Resolução 8028, de 7 de outubro de 2020, que estabelece critérios específicos para credenciamento e recredenciamento de docentes nos programas de pós-graduação da USP, em razão de licença-maternidade e adoção.
Vivências femininas
O documento conta com relatos de mulheres da comunidade USP que compartilham experiências de suas diferentes trajetórias, além de seus desejos a respeito da inclusão de mulheres na academia.
“É importante ter exemplos de caráter, competência e reconhecimento. Ver mulheres competentes sendo reconhecidas contribui para que jovens tenham vontade de também se desenvolver e galgar posições mais importantes”, afirma Renata Alves, técnica administrativa da PRPG. “Gostaria de ver a USP valorizando seus servidores, não só as mulheres, proporcionando maior capacitação e possibilidade de ascensão de carreira. Acredito que um olhar mais cuidadoso da universidade para servidores empenhados em desenvolver um bom trabalho é essencial e contribuirá para a consequente ampliação de lideranças cada vez mais preparadas”, acrescenta.
“Em minha opinião, na USP não existem obstáculos institucionais para que as mulheres alcancem qualquer posição de destaque. O que existe é que as mulheres precisam harmonizar sua vida profissional com a vida pessoal, principalmente a maternidade, o que pode ser um desafio enorme. Vivi isso na própria pele, pois tive minhas duas filhas durante meu doutorado, e eu já era docente da USP e era responsável única por uma disciplina de graduação que tinha uma carga didática bem grande”, conta Bernadette Dora Gombossy de Melo Franco, professora titular do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. “Quanto aos desafios que as mulheres enfrentam ao assumir posições de liderança, o principal é ter que provar a todo instante que não há diferença de competência pelo simples fato de ser mulher”, completa.
“Gostaria de ver mais diretoras de unidades, pró-reitoras, chefes de departamentos, mulheres titulares, mulheres diversas e plurais, na docência, como servidoras e discentes. A USP é referência em vários contextos e sabemos disso, e sempre retomo o debate em minhas falas que: sejamos vanguarda em todas as transformações estruturais que gostaríamos que existissem dentro dos nossos espaços” afirma Merllin de Souza, doutoranda em Ciências da Reabilitação pela Faculdade de Medicina da USP. Merllin faz parte da Gestão da Associação de Pós-Graduandos da USP Capital, além de ser cofundadora do Coletivo Negro Núcleo Ayé da Faculdade de Medicina da USP.
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