Poetas brasileiros inspiram álbum da artista Gabriela Silveira

Mário Quintana, Cecília Meireles e Manoel de Barros estão na base das canções presentes em No Grito do Temporal, segundo trabalho autoral da cantora e compositora mineira formada em Música pela USP

 Publicado: 12/07/2024     Atualizado: 15/07/2024 as 12:57

Texto: Alícia Matsuda*
Arte: Brenda Kapp**

Entre a composição, a percussão e o canto, Gabriela Silveira lança No Grito do Temporal, seu segundo álbum autoral. Com o objetivo de atingir “a mais plural estética da música brasileira”, a artista mineira reúne sua voz a um trio de percussão e um trio de flauta, piano e violino. Baseado nas obras de Mário Quintana, Cecília Meireles e Manoel de Barros, o álbum é composto de uma única faixa de 20 minutos, em que se entrelaçam as canções Mariposas Velhas, Desenhos e Estrelas em Desatino, compostas pela musicista em parceria com o letrista Paulinho Brandão. Silveira é formada em Música pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, onde atualmente faz mestrado na área de Processos de Criação Musical.

Desde Correntes, seu álbum de estreia lançado em 2018, Gabriela Silveira explora as possíveis mesclas entre os mais diferentes gêneros da música brasileira, desde a batucada popular, como congada, maracatu e ijexá, passando pelo samba, baião e xote, até bossa nova. No primeiro projeto, trechos escritos por Mário Quintana, Cecília Meireles e Manoel de Barros já faziam parte do encarte, mas é em No Grito do Temporal que esses poetas conquistam mais espaço na escrita de Silveira, que os homenageia ao longo da suíte.

Gabriela Silveira é uma artista múltipla - Foto: Arquivo pessoal/Fotomontagem feita por Brenda Kapp com foto de Gabriela Silveira

No Grito do Temporal - Arte gráfica: Tábata Araújo

Cecília Meireles - Foto: Wikipédia
Mário Quintana - Foto: Wikipédia

Inspirado no desprendimento de Manoel de Barros, o poema Mariposas Velhas foi o primeiro a ser escrito. “A ideia era fazer uma letra brincando um pouco como Manoel de Barros brinca com as palavras, transformar os subjetivos em objetivos, os verbos em substantivos”, diz a artista. Assim surgiu o desejo de dedicar letras específicas, também, aos outros poetas que a acompanhavam desde a adolescência. 

Poema "Mariposas Velhas" - Arte gráfica: Tábata Araújo
Poema "Desenho" - Arte gráfica: Tábata Araújo

Já a letra de Desenhos, que traça os recomeços marcados pela primavera, foi composta numa madrugada durante a pandemia. “Procurando um título para a canção, eu peguei o livro Mar Absoluto, da Cecília Meireles, para folhear e ver alguma coisa que nos chamasse a atenção”, relembra a artista, “Coincidentemente, abri na página de um poema que se chama Desenho, que tinha muitos dos elementos que nós usamos na letra sem saber”, conta, sobre o segundo título cantado na tríade. No poema de Meireles, lê-se: “Levai-me aonde quiserdes! – aprendi com as primaveras / a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira”, o que é revisitado na canção como “Brota na barra do tempo Cecília sussurra florescer / Sei das primaveras quando volto sempre inteira”.

A letra de Estrelas em Desatino, em que o poeta Mário Quintana aparece como referência literária, foi a mais trabalhosa para a dupla escrever, tendo passado por repetidas mudanças durante a quarentena. “Ela teve muitas formas antes de ser o que acabou sendo – Estrelas em Desatino já foi muitas músicas”, diz Silveira. Desta vez, os letristas se dividiram pela primeira vez no projeto, com uma composição solo de Paulinho Brandão e o acompanhamento musical de Gabriela.

Poema "Estrelas em Desatino" - Arte gráfica: Tábata Araújo

Os artistas que tiraram o projeto do papel

São os desenhos deixados pela avó da artista, Hilza de Almeida, que ilustram a capa do disco No Grito do Temporal. Os insetos se fazem presentes na completude dos poemas, e Gabriela Silveira teve uma feliz surpresa em notar os motivos na obra da avó. “Foi uma coincidência ter esse material artístico em casa, que dialogava tanto com as canções e as letras”, conta Silveira, que eternizou a homenagem ao tatuar os insetos de sua avó. Além dela, a mãe de Gabriela também é uma artista visual, o que abriu os seus caminhos em direção à arte. “Essas duas mulheres anteriores a mim na minha família, com certeza, me influenciaram a ver que esse mundo existe.”

As vozes de Gabriela Silveira e Paulinho Brandão são embaladas, no título, por uma sobreposição de instrumentos tocados por companheiros de longa data. “A escolha dos meus musicistas foi pautada nas pessoas que fazem parte da minha vida há muito tempo”, explica Silveira, relembrando os dias em que trabalhou com os amigos no estúdio. Compõem o álbum: no violino, Mathilde Fillat, pesquisadora do ensino do violino; na flauta, Maiara Moraes, professora, compositora e arranjadora; no piano, Carla Pronsato, compositora e arranjadora; na percussão, o músico Túlio Bias, a educadora Fernanda Camilo e Gabriela Silveira; e no saxofone, Gaia Wilmer, produtora musical.

Assinando a arte gráfica do material, Tábata Araújo deu vida aos insetos ilustrados. “Capa pronta, lembrei-me da delícia que é presenciar um trabalho musical com tantas sonoridades e timbres, dessa gente maravilhosa que soma numa obra”, compartilhou a artista visual nas redes sociais. “Experimento esfumar as bordas para voar com as notas musicais dessa obra. Perco-me entre insetos, estrelas e primaveras. Vejo-me nos lugares de algumas lembranças e neste mesmo, onde hoje habito, que já foi outros seres.”

Gravação do álbum - Foto: Liz Avlasevicius
Capa do álbum "No Grito Do Temporal", de Gabriela Silveira - Reprodução: Gabriela Silveira

O álbum No Grito do Temporal, de Gabriela Silveira, está disponível no YouTube e nos streamings.

* Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado


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