Potencial vacina brasileira contra covid-19 começa a ser testada em animais

Objetivo é identificar formulação e concentração capazes de induzir uma resposta rápida e duradoura do sistema imunológico

 09/06/2020 - Publicado há 4 anos     Atualizado: 16/07/2024 às 15:36

Por Elton Alisson/Agência Fapesp

Pesquisadores também pretendem elaborar outras formulações com proteínas inteiras semelhantes à spike do novo coronavírus que estimulam vários tipos de células de defesa – Foto: Pixabay

 

Pesquisadores do Instituto do Coração (InCor) da Faculdade de Medicina (FM) da USP começaram a testar em camundongos formulações de uma potencial vacina contra a covid-19.

O objetivo dos ensaios pré-clínicos é identificar um imunizante, em uma determinada formulação e concentração, capaz de induzir a uma resposta rápida e duradoura do sistema imunológico dos animais. Tal feito possibilitará avançar para as próximas etapas da pesquisa, que é apoiada pela Fapesp.

“Já conseguimos desenvolver três formulações de vacinas que estão sendo testadas em animais. Em paralelo, estamos formulando diversas outras para identificar a melhor candidata”, diz à

+ Mais

Cientistas brasileiros já trabalham numa candidata à vacina contra novo coronavírus

Agência Fapesp Gustavo Cabral, pesquisador responsável pelo projeto.

A estratégia utilizada para desenvolver a vacina é baseada no uso de partículas semelhantes a vírus (VLPs, na sigla em inglês de virus like particles).

Essas partículas possuem características semelhantes às de peptídeos e proteínas de vírus, como a de superfície do SARS-CoV-2 – chamada spike –, usada pelo novo coronavírus para se conectar a um receptor nas células humanas – a proteína ACE2 – e infectá-las. Por isso, são facilmente reconhecidas pelas células do sistema imune. Porém, não têm material genético do patógeno, o que as torna seguras para o desenvolvimento de vacinas.

A fim de permitir que sejam reconhecidas pelo sistema imunológico e gerem uma resposta contra o coronavírus, as VLPs são inoculadas juntamente com antígenos – substâncias que estimulam o sistema imune a produzir anticorpos. Dessa forma, é possível unir as características de adjuvante das VLPs com a especificidade do antígeno. Além disso, as VLPs, por serem componentes biológicos naturais e seguros, são facilmente degradadas, explica Cabral.

“Com essa estratégia é possível direcionar o sistema imunológico para reconhecer as VLPs conjugadas a antígenos como uma ameaça e desencadear a resposta imune de forma eficaz e segura”, afirma o pesquisador (leia mais em: agencia.fapesp.br/32743/).

 

Acompanhamento de longo prazo

As três primeiras formulações de vacinas testadas em camundongos são compostas de peptídeos semelhantes aos que compõem a proteína spike do SARS-CoV-2 e que induzem especificamente células B – linfócitos que estimulam a produção de anticorpos capazes de neutralizar a entrada do vírus nas células.

Além desses peptídeos, também estão sendo formuladas vacinas com peptídeos que induzem especificamente células de defesa do tipo T – linfócitos que induzem a autodestruição (apoptose) de células invadidas pelo vírus, com o objetivo de interromper a replicação do microrganismo.

Os pesquisadores também pretendem elaborar outras formulações com proteínas inteiras semelhantes à spike do novo coronavírus que, ao contrário dos peptídeos, induzem especificamente células B ou T, estimulam vários tipos de células de defesa.

“Tivemos de importar essas proteínas e nossa expectativa é que cheguem esta semana. Mas a ideia é sintetizá-las e produzi-las no nosso laboratório, assim como já fazemos com os peptídeos”, conta Cabral.

Gustavo Cabral Miranda – Foto: Arquivo pessoal

Nos ensaios iniciais, as vacinas são injetadas nos camundongos em diferentes concentrações. A cada semana serão colhidas amostras do plasma sanguíneo dos animais para avaliar a produção de anticorpos induzidos pela vacina.

Ao acompanhar a evolução da resposta imunológica ao longo de meses, será possível identificar qual formulação de vacina, e em que concentração, é capaz de induzir a imunidade do animal ao longo do tempo e neutralizar o vírus.

“Esse acompanhamento contínuo também permitirá sabermos quantas doses da vacina serão necessárias para conferir imunidade”, explica Cabral.

A formulação de vacina que apresentar o melhor desempenho em termos de indução de resposta imunológica será injetada em camundongos transgênicos, que carregam o receptor ACE2 das células humanas, com o qual a proteína spike do SARS-CoV-2 se liga. O objetivo é avaliar por quanto tempo a vacina confere imunidade e se é segura para a realização de testes em humanos.

A expectativa dos pesquisadores é que os testes pré-clínicos sejam concluídos no final deste ano.

“Estamos sendo muito cuidadosos com a realização dos testes e tentando responder ao máximo de questões possíveis para conseguirmos avançar com o rigor necessário no desenvolvimento de uma vacina realmente eficaz contra a covid-19”, afirma Cabral.

“Além da vacina, também estamos produzindo conhecimento e uma plataforma tecnológica que poderá ser útil para o desenvolvimento de vacinas para outras doenças, como a causada pelos vírus zika e chikungunya”, ressalta o pesquisador.

Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.