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Inflamação durante a gravidez pode contribuir para formar fenda labiopalatina
Pesquisa da USP mostra como a condição pode ser causada tanto por alteração genética quanto por fatores externos ao embrião
Desenho de bebê com fenda labiopalatina - Foto: Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC)
Uma nova combinação de fatores que podem levar à fenda labiopalatina foi descoberta por pesquisadores do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) da USP em colaboração com a University College London. O estudo sugere pela primeira vez que a malformação – em que há falha no fechamento de estruturas entre a boca e o nariz – é gerada por dois eventos, um genético e um relacionado ao ambiente celular durante o desenvolvimento do embrião. Antes, havia muito pouca evidência experimental para entender esta interação.
A fenda de lábio-palato é originada por um erro na migração de células de uma região chamada crista neural durante a formação do embrião, entre outras causas. As células da crista originam-se nas primeiras semanas do desenvolvimento e deslocam-se para regiões específicas do embrião para formar diversos tecidos, como cartilagem e ossos da face. A partir de testes em laboratório com células humanas e embriões de rãs e camundongos, a pesquisa indicou que a migração destas células é prejudicada tanto por uma alteração no gene CDH1 quanto por fatores relacionados à inflamação.
Segundo o estudo, o gene CDH1 controla a migração das células da crista neural e regula os níveis de E-caderina, uma das proteínas responsáveis pela adesão entre células. Alterações em uma das duas cópias do gene CDH1 podem ou não causar a fenda labiopalatina, dependendo de outras alterações, que podem ser provocadas por estímulos ambientais – um deles é a inflamação.
Ilustração do modelo pró-inflamatório afetando a migração da crista neural. A ativação pró-inflamatória durante a gravidez estimularia a produção de citocinas como a TNFa, que por sua vez promoveria a hipermetilação do promotor do gene cdh1 e prejudicaria a migração da crista neural, com impacto no desenvolvimento craniofacial - Infográfico adaptado do artigo / Nature Communications
Nem todas as pessoas que têm a variante genética no CDH1 têm fenda de lábio-palato – nesses casos, os cientistas dizem que o quadro clínico tem penetrância incompleta. Mas como a inflamação poderia ser o divisor de águas entre alguém ter ou não ter a malformação?
A inflamação é uma reação comum do corpo a diferentes situações, como infecções, lesões ou mesmo estresse e obesidade da gestante. Por meio de ensaios in vitro (cultura em laboratório) com células humanas e in vivo com embriões de rãs e camundongos, a pesquisa elucidou o mecanismo através do qual a inflamação atua: as citocinas, moléculas inflamatórias, induzem a um processo de hipermetilação do gene CDH1.
Metilação consiste em reações químicas em que grupos metil (CH₃-) são ligados ao DNA, o que influencia a possibilidade de “leitura” das suas informações. É um mecanismo epigenético – ativação e desativação de genes – em que as informações do DNA, dadas pela sequência de suas moléculas formadoras chamadas nucleotídeos, não são alteradas, mas podem ficar mais “escondidas”. No caso da hipermetilação, grupos metil demais são adicionados a um trecho do DNA, impossibilitando a leitura, neste caso, do gene CDH1. O resultado é uma redução na migração das células da crista neural do embrião, originando a fenda labiopalatina.
O trabalho foi publicado na revista científica Nature Communications, e agora os cientistas planejam estender as investigações. “Estamos dando continuidade nesta pesquisa para entender se há outros genes importantes que estão comprometidos com a inflamação”, diz Maria Rita Passos-Bueno, pesquisadora do CEGH-CEL. “Pretendemos também investigar se obesidade e diabete maternas, que são condições consideradas pró-inflamatórias, são suficientes para causar fenda labiopalatina em camundongos com deficiência de uma cópia do gene CDH1.” O estudo é mais uma peça do quebra-cabeça sobre como a condição é desencadeada, visando, no futuro, poder interferir no processo para prevenir a malformação.
Maria Rita Passos-Bueno – Foto: Arquivo pessoal
Com informações do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco da USP
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