A moeda social é utilizada por comunidades para estimular o desenvolvimento econômico e social. Trata-se de uma moeda alternativa, geralmente aceita por estabelecimentos locais que participam do sistema e que circula dentro de um local específico. A moeda social promove também a inclusão financeira ao permitir que pessoas sem acesso a serviços bancários participem da economia. Essa prática também fomenta a solidariedade e a cooperação, reforçando as redes sociais e comunitárias. No Brasil, a iniciativa começou a ganhar relevância na década de 1990, período marcado por crises econômicas e alta inflação.
O professor do Departamento de Economia da Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, Fernando Antônio de Barros Junior, diz que a moeda social é focalizada, ou seja, ela vai circular apenas numa certa comunidade, com isso, o órgão responsável por controlar a moeda pode fazer alguns ajustes, como oferecer descontos em produtos nos estabelecimentos que fazem uso da moeda local.
A primeira moeda social reconhecida no País foi do Banco Palmas, fundado em 1998 na periferia de Fortaleza, Ceará. Criado pela Associação de Moradores do Conjunto Palmeira, o Banco Palmas lançou a moeda social Palmas. Fundador do Banco Palmas e da Moeda Social Palmas, Joaquim Melo explica que toda a arrecadação a partir de um banco comunitário, como juros, rendimentos e taxas oriundas da circulação da moeda, obrigatoriamente será reinvestida na própria comunidade. Além disso, ele diz que a implementação dos bancos comunitários pelo Brasil ocorre de forma espontânea. “É necessário que uma comunidade ou uma prefeitura tome a iniciativa. Não tem uma regra para criar um banco, basta a comunidade se manifestar e solicitar a criação”, pontua.
Atualmente, o Brasil tem cerca de 150 moedas sociais, sendo a moeda Mumbuca, de Maricá, no Rio de Janeiro, responsável por um dos maiores bancos comunitários da América Latina. Dados da prefeitura da cidade mostram que o Banco Comunitário Popular de Maricá possui mais de 130 mil correntistas e 20 mil transações por minuto. Entre 2018 e 2024, cerca de R$3 bilhões foram movimentados, número correspondente a 20% da economia local.
O subsecretário da economia de Maricá, Adalton da Motta Mendonça, detalha que o Banco Comunitário de Maricá conta com programas de auxílio-benefício pagos com a Mumbuca. “O principal programa é o RBC (Renda Básica e Cidadania); também temos programas de auxílio direcionados para proteção ao trabalhador, mulheres vítimas de tentativa de feminicídio, pessoas com necessidades especiais, além do benefício para cuidadores solidários de animais”, conclui.
Relação com a moeda nacional
A criação de programas de auxílio é uma estratégia para incentivar a circulação de moedas sociais, que têm o mesmo valor do Real, sendo assim lastreadas. Joaquim Melo, fundador da moeda Palmas, explica que os comerciantes pagam uma taxa de 2%, que é destinada ao fundo do banco comunitário, o qual reinveste esse valor na comunidade, principalmente por meio de crédito a juro zero, mantendo a moeda social em circulação.
Essas operações também permitem que bancos comunitários ou municipais concedam crédito em moedas locais, com juros mensais variando de 0,25% a 1%, dependendo do valor do crédito. Caso os usuários precisem converter a moeda social para a moeda nacional, a taxa de câmbio, fixada ou variável, é determinada pelas autoridades da moeda social e a conversão ocorre em pontos autorizados ou plataformas específicas, tanto em dinheiro quanto digitalmente.
Além de fornecer apoio financeiro aos moradores, o uso da moeda social em programas como o Mumbuca, em Maricá, impulsiona o comércio local. Segundo o subsecretário da cidade, a circulação restrita da moeda dentro do território gera empregos e promove o surgimento de novos negócios. Maricá já possui mais de 13 mil empreendimentos cadastrados para receber a moeda social. “O crédito a juro zero em moeda social oferecido pelos bancos comunitários facilita o acesso rápido a recursos para atender necessidades imediatas, como a compra de medicamentos, por exemplo.”
Desafios das moedas sociais
Apesar dos benefícios, as moedas sociais enfrentam desafios semelhantes aos das moedas físicas, como o risco de falsificação. No caso das moedas sociais digitais, há ainda questões de gestão, armazenamento e circulação de dados. Joaquim Melo relembra que, durante a criação do Banco Palma em 1998 e da moeda Palma em 2001, a principal dificuldade foi a aceitação pela comunidade, que questionava a validade da moeda e seu lastro em reais.
História da moeda social
Criada em 1930 durante a Grande Depressão, quando comunidades em todo o mundo procuravam soluções para a falta de dinheiro convencional, o conceito de moeda comunitária, ou moeda social, teve, na década de 1980 no Canadá, o primeiro grande exemplo de consolidação. Na época, a iniciativa surgiu como resposta a uma crise econômica associada à produção de madeiras. Seu funcionamento foi baseado na associação de moradores que utilizam sua própria moeda a partir de registros contábeis para organizarem uma rede de trocas.
*Estagiário sob supervisão de Ferraz Junior e Rose Talamone
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