Para marcar os 70 anos de sua fundação, a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP deu início na segunda-feira, 26 de setembro, ao ciclo de conferências Repensar o Brasil. A série de eventos trará oito discussões sobre temas atuais que impactam o futuro do Brasil, como a Previdência Social, o ajuste fiscal, a desigualdade e as condições de trabalho no País, e ocorre entre os meses de setembro e novembro. A conferência inaugural, realizada nesta manhã na sala de conferências da FEA, teve como tema Governança pública e governança empresarial e foi ministrada pelo atual presidente da Petrobras, Pedro Parente.
Parente fez questão de ressaltar, no início de sua apresentação, que suas palavras naquele momento não representariam necessariamente a posição oficial da Petrobras sobre os assuntos tratados. “Hoje tento me despir da função que exerço para falar sobre minhas preocupações como um observador e um profissional ligado há 45 anos aos setores público e privado. Pretendo fazer, aqui, uma avaliação mais livre, não institucional”, esclareceu.
Citando o livro Around the Cregged Hill: A Personal and Political Philosophy, de George F. Kennan, cientista político e diplomata dos Estados Unidos durante a Guerra Fria, o presidente da Petrobras afirmou que governos não devem ser idealizados. Segundo o autor estadunidense, os governos são necessários para suprir a incapacidade do homem de comandar a si próprio, e o fazem através da imposição de restrições. Porém, por envolverem grandiosas relações de poder, os governos também precisam de controle. “Hoje, o que vemos no Brasil é uma falência no sistema de governança e controles públicos”, diz Parente.
O presidente da estatal critica a gestão empresarial do setor público brasileiro, que, segundo ele, trabalha com um sistema de regras e processos em que a observância dessas regras e o decorrer do processo (leia-se burocracia) são mais importantes do que atingir resultados. Parente acredita que é necessária uma mudança nesse sistema e aponta dois conceitos a serem aplicados: “É preciso um espírito de dono, isto é, enquanto eu estou no comando da empresa, mesmo ela sendo pública, qualquer problema que ela tenha é meu, sou eu que devo resolver e devo trabalhar até resolvê-lo. Além disso, é preciso autonomia de decisão em relação aos governos”.
O dirigente vê como fundamental também que se adote uma postura mais próxima à do setor privado nas empresas públicas. “No setor público, os processos de gestão são um fim em si mesmos; no privado, são um meio para se chegar aos resultados. Precisamos disso, uma gestão baseada em resultados, que tem um custo-benefício muito melhor. O controle das atividades da empresa não pode se dar pelos processos”, afirma. Contudo, Parente teme que a atual situação do País e a insatisfação com a corrupção tragam a sensação de que são necessários mais controles formais na gestão pública.
Outro fator que Parente destaca é a descentralização da gestão. “É preciso que os gestores tenham autonomia de decisão e que sejam responsabilizados pelos resultados obtidos a partir dela. Isso possibilita um sistema meritocrático na empresa, que é um dos pilares da nova gestão”, defende. Segundo ele, os eventos recentes com relação à Petrobras abriram espaço para uma situação única entre as estatais brasileiras: para recuperar a empresa, financeiramente e também em termos de credibilidade, Parente diz que o atual quadro de gestores não tem influência político-partidária, trabalha com racionalidade e responsabilidade financeira, autonomia para definir preços e medidas para evitar ou impossibilitar a corrupção. “Num momento de instabilidade, todos os estímulos são no sentido de não se expor, de não tomar decisões, por isso a autonomia é imprescindível”, afirma.
Dentre as medidas para inviabilizar a corrupção, Parente explica que decisões isoladas deixaram de existir na Petrobras, sendo todas feitas em sistema de colegiados. Além disso, as funções são segregadas para evitar fraudes e acordos escusos, os executivos têm sua vida pregressa avaliada e há um canal de denúncias fora da empresa que garante o anonimato do denunciante. “Não é apenas a recuperação da Petrobras que está em jogo. É mostrar que um novo modelo de gestão não só é possível como pode ser melhor que o anterior”, conclui.
Ouça abaixo a entrevista com o presidente da Petrobras, Pedro Parente, feita pelo repórter Diego Smirne para a Rádio USP: