Sobre rankings, internacionalização e o posicionamento estratégico da USP

Por André Frazão Helene e Federico David Brown Almeida, professores do Instituto de Biociências da USP

 Publicado: 16/07/2024
André Frazão Helene – Foto: Arquivo pessoal
Federico David Brown Almeida – Foto: Arquivo pessoal

 

 

 

Após o orgulho pelo avanço das universidades brasileiras nos rankings, podemos discutir alguns de seus significados, expectativas futuras e ações presentes.

Antes de começarmos, é importante destacar que esses rankings são controversos devido à metodologia adotada, que pode favorecer certas instituições ou regiões. Rankings que valorizam produção científica e citações acadêmicas acabam por beneficiar universidades focadas em pesquisa, subestimando aquelas com ênfase no ensino ou na integração comunitária. Além disso, pesquisas de interesse local em países do Sul Global tendem a ser desfavorecidas.

Dito isso, podemos tratar do significado da melhoria no índice, especialmente na USP. A USP alcançou a 85ª posição no QS World University Rankings em 2024 e a 92ª em 2025, próxima à Universidad Nacional Autónoma de México (93ª em 2024 e 94ª em 2025) e à Universidad de Buenos Aires (95ª em 2024 e 71ª em 2025). Entre 2016 e 2025 a USP mostra uma crescente, passando da 143ª posição para 92ª. No QS, seus pontos fortes incluem empregabilidade dos egressos (27ª mais bem posicionada), reputação acadêmica (40ª), rede internacional de pesquisa (60ª) e sustentabilidade (67ª). Já seus pontos fracos residem na internacionalização, com índices de docentes e especialmente de alunos internacionais abaixo da posição 700.

Esses dados mostram um evidente desequilíbrio, pois apesar de ter uma forte reputação acadêmica internacional e uma rede internacional de pesquisa robusta, tem baixa participação de professores e alunos internacionais. Para entender este aspecto é crucial entender a composição da população internacional da USP, o que poderia auxiliar em futuras estratégias.

A escassez de alunos de graduação internacionais pode ser explicada pelos exames de admissão, que exigem vasto conhecimento da literatura e cultura brasileiras. Para atrair mais estudantes internacionais, poder-se-ia pensar em revisar esses exames para torná-los mais inclusivos, aplicando ações afirmativas na admissão. No entanto, ambas exigiriam mudanças legais e um profundo debate político sobre a adequação de tal intento.

No entanto, uma solução mais adequada seria facilitar o intercâmbio de estudantes já ingressos na Universidade, oferecendo uma vivência internacional aos nossos alunos e, em contrapartida, recebendo alunos na USP. Para isso, seria necessário fortalecer estratégias já existentes e aumentar a oferta de cursos de línguas e, para o momento, uma abordagem com resultado imediato seria focar em intercâmbios com países de língua portuguesa e espanhola. Estudantes hispano falantes poderiam superar barreiras linguísticas com cursos direcionados e curtos de português, assim como o oposto também. Vale lembrar que essas duas línguas são faladas por cerca de 900 milhões de pessoas.

Mas aqui vale a pena pensar a abrangência dessa discussão. De alguma forma, parece que há um esforço de pesquisa inserida internacionalmente que é robusta e bem avaliada. Exatamente por isso chama atenção a capacidade de atração de pessoal estrangeiro ser muito baixa. Esse aparente anacronismo poderia ser tratado de maneira mais cuidadosa como parte de uma profunda assimetria da internacionalização na Universidade, que podemos avaliar observando os dados internos, especialmente para aquele que é o ponto de contato mais evidente entre ensino e pesquisa: a pós-graduação.

De fato, a maioria dos estudantes internacionais na USP está em programas de pós-graduação, mas mesmo aí os números ainda são pequenos, apesar de a USP incentivar cursos oferecidos em inglês e processos seletivos em português, espanhol ou inglês. Atualmente, há 37.238 alunos na pós-graduação, dos quais 1.187 (3,2%) são internacionais.

Olhar para a origem destes alunos talvez ajude a entender melhor a questão. Os alunos de pós-graduação são oriundos principalmente da América Latina (67,9%), África (9,5%) e Ásia (9,2%), enquanto apenas 13,3% são de regiões onde há os “centros universitários de ponta”. Novamente aqui a língua aparece como fator central: 67,6% dos alunos estrangeiros da USP falam espanhol, principalmente oriundos da América Latina e, em especial, do Peru (19,9%) e Colômbia (19,3%), e 6,4% falam português. Vale ressaltar a baixa presença de alunos mexicanos (1,9%) e argentinos (1,3%), oriundos de países latinos que possuem estruturas universitárias públicas ao mesmo tempo robustas e com similaridades à brasileira.

Nesse sentido, para fortalecer tais vínculos, deveríamos tratá-los como estratégicos e desenvolver parcerias com governos, setores educacionais e instituições de pesquisa. Além disso, a USP deve mapear o destino de seus ex-alunos internacionais para fortalecer as redes globais e expandir os programas de cooperação, assim como para avaliar sua atuação regional.

A Universidade poderia também definir claramente iniciativas para atrair estudantes internacionais de outras regiões do mundo (não falantes de português ou espanhol). Nesse caso, a prioridade seria expandir a oferta de cursos de pós-graduação em inglês e promover programas que possam ser ministrados integralmente em inglês em áreas ou tópicos estratégicos. Além disso, é prioridade revisar a comunicação institucional, frequentemente com informações desatualizadas e sites apenas em português. Para isso a USP precisa implementar esforço centralizado para ter páginas web e comunicações em português, inglês, espanhol e outras línguas estratégicas.

Tomando os aspectos evidenciados aqui, fica claro que, especialmente em relação à internacionalização, é necessário reavaliar o sistema atual, que parece favorecer o envio de alunos e docentes para a Europa e EUA (o que reflete nas colaborações, publicações e reconhecimento em rankings com viés específico) e o recebimento de alunos da América do Sul e África. Também é importante mapear o destino dos ex-alunos internacionais da USP em suas atividades profissionais, o que permitiria planejar parcerias e promover o envolvimento desses em atividades acadêmicas que beneficiem a comunidade da USP.

Por fim, fica claro que um planejamento menos assimétrico, que contemple a vocação da USP como polo atrator de alunos e profissionais, é essencial. Devemos buscar formas de aumentar a atratividade para estudantes internacionais, melhorar a comunicação institucional e fortalecer as parcerias globais. A capacidade de uma instituição em atrair estudantes e professores internacionais é importante não só para trazer diversidade e uma perspectiva global às atividades acadêmicas nos campi, mas também para avaliar o impacto global de seus acadêmicos e permitir uma vivência rica aos seus alunos.

Então, o que pode ser feito para atrair estudantes e professores internacionais?
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