




O Sargassum é um gênero de macroalga que ocorre naturalmente no Mar dos Sargaços, região de grande importância ecossistêmica e oficialmente reportado pela primeira vez por Colombo em seu caminho para as Américas. Ao menos até os anos 1980, este mar sem praias praticamente não apresentava mudanças significativas, mas em 2011 algo aconteceu e as algas começaram a ser registradas distantes de seu território original. A partir deste ano passaram a ser vistas no Brasil e na África e grandes montantes de algas começaram a arribar (encalhar) em praias caribenhas. Contrariando teorias de que essas balsas de algas haviam apenas se soltado do Mar dos Sargaços, estas se originavam de um “novo mar” — ou “Grande Cinturão de Sargaços do Atlântico”.
Agora essas algas estão arribando anualmente nas praias do Caribe, sendo considerado um “novo normal” e gerando prejuízos bilionários para o turismo da região. No Brasil, no entanto, as arribadas de Sargassum foram reportadas apenas em 2014, 2015 e 2021 no litoral de estados do Norte e Nordeste. Ao contrário do Caribe, essas arribadas ocorrem de forma quase aleatória no País: como uma tempestade imprevisível que pode aportar a qualquer momento em nossas praias.
A proliferação destes sargaços pelágicos (S. natans e fluitans) parece ser motivada pelo aumento de nutrientes e temperatura no oceano — parâmetros difíceis de se controlar. Quando as arribadas atingem as praias, além de “sujar” a areia e atrapalhar o turismo, podem liberar gases tóxicos e mal-cheirosos (H2S) em sua degradação, além de potencialmente causar danos às águas (oxidação, acidificação, turbidez, anoxia) através dos lixiviados — podendo afetar peixes, corais e algas nativas.
Mas, enquanto o Caribe detalha seus impactos, no Brasil ainda sofremos com uma falta de dados: não sabemos quantas arribadas ocorreram, que locais foram atingidos ou qual o impacto em nossa economia. Em nosso país, a mídia e as redes sociais mal versam sobre o assunto, confundindo muitas vezes com outras algas nativas e comuns. E o impacto sobre a pesca e comunidades tradicionais mal foi estudado, mesmo em outros locais do mundo.
O estudo do Sargassum no Brasil é crucial diante das mudanças climáticas globais e do impacto significativo que essas algas vêm causando no Caribe há mais de uma década. E embora as arribações sejam menos frequentes e mais imprevisíveis, elas representam um alerta sobre como o país pode ser afetado por esses eventos em um futuro próximo — especialmente nas regiões do litoral Norte e Nordeste, onde comunidades costeiras dependem fortemente da pesca e do turismo. Estudar e monitorar o Sargassum no Brasil é, portanto, uma oportunidade de se antecipar aos impactos negativos, criar soluções adaptativas e contribuir para a construção de estratégias regionais que mitiguem os efeitos do fenômeno em escala global.
Nesse sentido, o Projeto Fapesp-NFRF Aumento da preparação local para as marés de Sargassum na Amazônia e no Caribe Mexicano por meio de monitoramento aprimorado e economias azuis é uma iniciativa de colaboração internacional para pesquisa em adaptação e mitigação das mudanças climáticas (IIRCC) que estudará os aspectos limitantes e viabilizadores da prevenção de eventos com o Sargassum em comunidades locais, incluindo as regiões previamente atingidas pelas algas.
Por meio de uma abordagem interdisciplinar e colaborativa, esse projeto busca transformar o desafio das marés de Sargassum em oportunidades sustentáveis. A iniciativa busca fortalecer a resiliência de comunidades vulneráveis no Brasil e no México por meio do desenvolvimento de ferramentas de monitoramento inovadoras, como sensores remotos e inteligência artificial, além de sistemas de alerta que visam proteger a saúde pública e melhorar o planejamento local.
Paralelamente, o projeto promove a valorização do Sargassum como recurso para a economia circular, testando aplicações como materiais de construção com potencial econômico. Os resultados esperados incluem maior preparo das comunidades para lidar com eventos de arribadas, redução dos impactos ambientais e sociais associados à decomposição das algas, e criação de novas oportunidades econômicas lideradas localmente, especialmente por mulheres. Além disso, o projeto busca engajar e educar diferentes públicos por meio de ferramentas digitais, como um aplicativo interativo, garantindo que os benefícios e conhecimentos gerados se expandam para outras regiões afetadas pelo fenômeno.
Apesar de poucos dados ainda disponíveis, é possível antever que os impactos de uma arribada massiva de Sargassum afetaria a economia e os modos de vida das populações locais. Ao aliar os conhecimentos acadêmicos aos problemas locais, é possível preparar e buscar soluções de forma antecipada.
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