Na Idade Média, os textos da liturgia da missa eram cantados pelo sacerdote e por seus auxiliares na forma de monodias (melodias desacompanhadas), conhecidas como cantos gregorianos. Havia textos que apareciam regularmente nas missas – Kyrie, Glória, Credo, Sanctus-Benedictus e Agnus Dei – denominados Ordinário da missa, e textos eventuais, usados em ocasiões específicas, denominados Próprio da missa.
A recorrência dos textos do Ordinário levou os compositores a considerá-los como seções de um todo mais abrangente, dando origem assim à missa como gênero musical. O primeiro compositor a escrever uma missa segundo esse pensamento foi o francês Guilhaume de Machaut (1300-1377), que compôs a Missa de Notre Dame.
A partir de então, muitos compositores escreveram missas nesse formato. No Renascimento, era comum também o uso de algum canto gregoriano como inspiração temática para a composição da missa.
A princípio, essas composições eram apresentadas apenas durante as cerimônias religiosas, cumprindo função exclusivamente litúrgica. Posteriormente, devido à grande beleza e à admirável habilidade na utilização dos recursos da polifonia, elas passaram a ser apreciadas pelo seu intrínseco valor estético.
Uma das missas mais expressivas, de Josquin des Prez (c.1450-1521), é a Pange Lingua. Tem esse título porque Josquin utilizou o início do hino gregoriano Pange Lingua Gloriosi como motivo unificador das diversas partes da missa.
Josquin subdivide as seções principais da missa para criar contrastes de sonoridade e de timbre. A obra está escrita para quatro vozes, mas há trechos apenas com as vozes mais agudas e outros apenas com as vozes mais graves. Vale lembrar que, na época de Josquin, as obras corais sacras eram cantadas apenas por homens, com crianças assumindo as partes de soprano e contralto.
Ouçam a primeira parte do Kyrie com o grupo Coralusp Jupará, sob minha regência.
________________
(As opiniões expressas nos artigos publicados no Jornal da USP são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem opiniões do veículo nem posições institucionais da Universidade de São Paulo. Acesse aqui nossos parâmetros editoriais para artigos de opinião.)