Como integrar pessoas com transtorno do espectro autista no mercado de trabalho

As pessoas com TEA não devem encarar a disputa por vagas só com pessimismo e dificuldade, podendo enxergar até uma enorme oportunidade no meio

 Publicado: 22/10/2024 às 11:13
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A condição do autismo vem ganhando atenção e mais conscientização nos últimos tempos, mas não é isento de estigmas e preconceitos – Foto: Freepik

 

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Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) representam cerca de 2% da população brasileira – possivelmente até mais, dada a dificuldade de diagnóstico. Como descreve o psiquiatra Fábio Sato, especialista em autismo no Hospital das Clínicas, “o fio condutor de todos os pacientes com TEA é a dificuldade qualitativa na interação social, nas sutilezas da vida social”. Pode ser sensibilidade a barulho, pouca compreensão de ironia ou mesmo vontade de evitar muito contato. Quando essas pessoas entram no mercado de trabalho, elas enfrentam grandes desafios, em especial no que se refere às relações humanas e de comportamento. Como, então, lidar com essas dificuldades?

Como abordar isso na entrevista?

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A condição da pessoa com transtorno do espectro autista vem ganhando atenção e mais conscientização nos últimos tempos, mas tampouco é isento de estigmas e preconceitos. A professora Luciana Morilas, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, que estuda o assunto, diz que “é importante que a pessoa TEA mencione sua condição na entrevista”. Segundo ela, a clareza e transparência na comunicação é essencial – até porque, afinal, “essa condição vai aparecer em algum momento e a relação com a empresa pode ficar prejudicada”.

As pessoas com TEA não devem encarar a disputa por vagas só com pessimismo e dificuldade, podendo enxergar até uma enorme oportunidade no meio. Isso porque, desde 2012, o espectro autista se encaixa em vagas para deficientes e os portadores de autismo podem usar isso como uma vantagem. Inclusive, segundo a professor comenta, “as empresas precisam cumprir e frequentemente reclamam de não conseguirem encontrar profissionais qualificados”.

Se a vaga for de ampla concorrência, Luciana Morilas ressalta que a comunicação franca é a melhor forma de abordar, mas talvez haja uma forma mais apropriada para tanto. “Como existe muito preconceito, talvez seja o caso de a pessoa contar mais ao final da entrevista, num momento em que ela já demonstrou suas potencialidades e já convenceu que ela é o melhor perfil para a vaga. Mas a transparência é sempre a melhor opção.”

Como a empresa deve encarar a situação?

Luciana Romano Morilas – Foto: Linkedin

Já por parte da gestão, também há recomendações sobre como abordar a questão. “A primeira orientação é sempre perguntar à pessoa tanto suas dificuldades quanto suas habilidades. Há pessoas TEA que são extremamente concentradas e isso pode ser um diferencial muito positivo para uma empresa, desde que sejam respeitadas outras necessidades dessa pessoa, como uma forma de redução de barulho, por exemplo”, explica Luciana.

A segunda orientação é adaptar o trabalho, mas “sempre de acordo com o formato como a pessoa demanda, não na forma como nós achamos que seria importante”. Ela comenta que, por vezes, as empresas, no intuito de ajudarem, acabam criando “empecilhos e necessidades mirabolantes e caras que não melhoram a situação da pessoa com deficiência e geram custos altos e desnecessários”. Portanto, há situações em que menos é mais e a chave é a mesma que ela mencionou para o TEA: comunicação e transparência é tudo.

Nenhum bicho de sete cabeças

A conclusão é que a relação não deve ser enxergada como um grande empecilho, mas sim como uma relação empregador-empregado que, por vezes, exige algumas particularidades. No fim, “a comunicação é sempre o melhor caminho. A pessoa TEA precisa comunicar ao empregador suas necessidades de forma transparente e direta. Quais os principais problemas que ela tem? Sensibilidade a barulhos, por exemplo? Comunicar que ela precisa de um ambiente tranquilo é a primeira providência”, exemplifica a especialista.

“Para as empresas é a mesma coisa: comunicar com o trabalhador todas as tarefas que precisam ser realizadas e como. É comum que pessoas com transtorno do espectro autista sejam literais. Então, esperar que elas interpolem as necessidades do seu trabalho não vai funcionar. Raramente elas entendem ironia, um jeito de falar muito comum ao brasileiro. A ideia é ser muito direto, objetivo e transparente na comunicação. O custo é zero e melhora muito as relações”, complementa ela.

Outras dicas

Fábio Sato – Foto: EJUD2/Youtube

Se ficaram receios ou dúvidas, Fábio Sato, psiquiatra especializado em transtorno do espectro autista, reforça que as pessoas TEA devem seguir com seus objetivos normalmente. Caso haja dificuldades, menciona um site americano chamado Autism Speaks, que dá algumas dicas de como elaborar o currículo, de como se comportar na entrevista, como procurar emprego e afins.

No Brasil existe uma empresa chamada Specialisterne, que faz essa mediação entre a empresa empregadora e a pessoa TEA que quer trabalhar. Há também faculdades inclusivas que são mais bem adaptadas para receber essas pessoas, como os cursos do Senac. “Acho que tudo isso são ferramentas que ajudam e que a busca é contínua”, finaliza ele.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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