O protagonista da oceanografia brasileira

Por Tássia Biazon, especial para o Jornal da USP

Navio Prof. W. Besnard, nomeado em homenagem ao fundador do instituto – Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto

O protagonista da oceanografia brasileira

Por Tássia Biazon, especial para o Jornal da USP

Navio Prof. W. Besnard, nomeado em homenagem ao fundador do instituto – Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto

 02/12/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 13/07/2022 às 15:04

Arte: Moisés Dorado e Guilherme Castro

Arte: Moisés Dorado e Guilherme Castro

Biologia, química, física e geologia são ciências amplas e complexas. Imagine a interação entre todas elas? A oceanografia faz essa proeza, oferecendo importantes estudos que afetam todos os países – mesmo que não sejam banhados pelas águas do mar. Relativamente recente no mundo, a área possui muitas limitações de conhecimento. No Brasil, um local onde cientistas exploram o território menos conhecido do planeta é o Instituto Oceanográfico (IO) da USP.

A primeira instituição brasileira dedicada à pesquisa oceanográfica nasceu em São Paulo, fundada pelo pesquisador russo Wladimir Besnard, em 31 de dezembro de 1946 – completando este mês 70 anos. No início, denominado Instituto Paulista de Oceanografia (IPO), desenvolvia pesquisas científicas ao longo do litoral do Estado. “A oceanografia brasileira nasceu no IO”, afirma Michel Michaelovitch de Mahiques, professor do instituto e, desde dezembro de 2013, vice-diretor.

LOGO 70 ANOS
Prof. Wladimir Besnard, o pai da oceanografia no Brasil - Foto: Acervo/IOUSP

Os trabalhos foram iniciados em 1948, no litoral sul, com caracterização da região lagunar de Cananéia-Iguape. No ano seguinte, as atividades se expandiram para o litoral norte, no canal de São Sebastião, estudando, por exemplo, crustáceos do local, como os copépodes. Nesse mesmo ano, o instituto construiu um laboratório flutuante (seu primeiro espaço físico) em Iguape, e adquiriu o primeiro terreno na região de Cananéia.

Em junho de 1950, saiu a primeira edição do Boletim do IPO, contendo informações sobre as pesquisas do instituto. Totalizando 64 volumes, atualmente, o boletim é representado pelo Brazilian Journal of Oceanography, periódico brasileiro trimestral, em língua inglesa, de acesso aberto, que divulga artigos científicos brasileiros e internacionais relacionados à área das ciências do mar.

Em dezembro de 1951, o IPO foi incorporado como unidade de pesquisa à USP, passando a ser denominado Instituto Oceanográfico (IO). Em 1954, obteve um terreno em Ubatuba – que se transformaria em sua segunda base de pesquisas – e também a primeira embarcação, denominada Juva-Camburiú. No ano seguinte, adquiriu o primeiro navio nacional de pesquisas, o Ungava.

A primeira embarcação, o Juva-Camburiú, realizava pesquisas em Cananéia – Iguape – Foto: Acervo IO

O ensino

Ao longo dos anos, além de pesquisa, a instituição passou a oferecer ensino em pós-graduação, oficialmente iniciado em 1972. Até 2016, o IO totaliza 566 dissertações de mestrado e 297 teses de doutorado. Apenas em 2002 inaugurou o curso de bacharelado em Oceanografia, formando 254 oceanógrafos até o final de 2015.

“O ensino da oceanografia no instituto foi iniciado graças aos auxílios de organismos internacionais (Unesco, Ford Foundation), e nacionais (Fapesp, CNPq, Secirm), permitindo a divulgação das ciências do mar por meio de palestras e cursos informais e de extensão universitária ministrados por professores estrangeiros”, relata o professor do IO Luiz Bruner de Miranda.

Há 14 anos, a aluna Luciana Yokoyama Xavier ingressava no primeiro ano do curso de Oceanografia da USP. “O curso me chamou a atenção para duas coisas: primeiro, a atração em trabalhar com o ambiente marinho; segundo, a possibilidade de ingressar numa carreira multidisciplinar.”

Embora mencione como aspecto negativo a localização ser distante do mar, a estudante avalia a instituição com excelente infraestrutura e corpo docente. Atualmente, Luciana desenvolve doutorado no IO na área de gestão costeira. Ela cita que a visão da importância do ambiente marinho mudou, e continua alterando ao longo dos anos. No entanto, relata que o mar ainda é um espaço distante para a maior parte da população.

Luiz Bruner de Miranda durante a Vikindio I, em 1967, no navio Prof. W. Besnard – Foto: Acervo Digital da USP
Besnard, um ícone na história da oceanografia brasileira. Com quase 50 metros, transportava 22 tripulantes e 15 pesquisadores, e tinha autonomia de 15 dias – Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto

Mar à vista

Uma das ferramentas essenciais do oceanógrafo é o navio. Dentre as embarcações que passaram pelo Instituto Oceanográfico, destaca-se o protagonismo do navio Prof. W. Besnard, nomeado em homenagem ao professor Wladimir Besnard, fundador do instituto, que morreu sete anos antes da chegada do navio ao Brasil. “Besnard foi o primeiro navio oceanográfico civil brasileiro”, relata o vice-diretor Mahiques.

Construído na Noruega, o navio começou a operar em 1967, ao realizar sua primeira expedição científica, que durou 60 dias, partindo da Noruega (Bergen) com destino ao Brasil (Santos). A expedição foi denominada Vikindio, palavra originada da junção de viking (guerreiros marinheiros da Noruega) e índio (povos nativos do Brasil).

Michel Mahiques - Foto: Arquivo pessoal
Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto / Acervo IOUSP

Besnard foi o primeiro navio oceanográfico civil brasileiro

Construído na Noruega, o navio começou a operar em 1967, ao realizar sua primeira expedição científica, que durou 60 dias, partindo da Noruega (Bergen) com destino ao Brasil (Santos). A expedição foi denominada Vikindio, palavra originada da junção de viking (guerreiros marinheiros da Noruega) e índio (povos nativos do Brasil).

Construção do navio Prof. W. Besnard, em Bergen, na Noruega – Foto: Acervo IO

O professor Luiz Bruner de Miranda, formado em Física pela antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP – atual FFLCH -, em 1964, acompanhou a construção do navio no estaleiro de Bergen, integrando a equipe Vikindio. “Foi um aprendizado e uma experiência muito importante para todas as etapas da minha carreira no IO”, recorda.

Em aproximadamente 40 anos de operação, Besnard realizou mais de 260 cruzeiros oceanográficos, cerca de 8.200 estações oceanográficas, expedições de âmbito brasileiro e internacional financiadas por diversos órgãos, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Entre seus trabalhos, destacam-se as idas para a Antártida, de 1982 até 1988, ao lado de navios da Marinha do Brasil como o Barão de Teffé. Atuou até 2008, quando foi desativado em consequência de um incêndio.

A cerimônia de batismo do Besnard, em Bergen – Foto: Acervo IO

O instituto possui um local de ancoragem das principais embarcações no Porto de Santos – Armazém 8, onde o Besnard está atracado. Em 2016, a administração do porto pediu a retirada do navio. Sem interessados em sua compra ou recursos para sua transformação em museu, ele está prestes a ser afundado para se tornar recife de corais, em Ilhabela, litoral norte do Estado de São Paulo.

Hoje, a USP possui a principal embarcação civil de pesquisa oceanográfica do País, o navio Alpha Crucis. Antiga propriedade da Universidade do Havaí, construído em 1973, o navio foi adquirido com recursos da Fapesp, além de modernizações custeadas pela fundação e a USP. Em março de 2012, partiu do Porto de Seattle para o de Santos, sendo inaugurado no dia 30 de maio de 2012.

O navio de pesquisa Alpha Crucis foi trazido ao País, pelo Instituto Oceanográfico, em 2012 – Foto: Divulgação/Fapesp

O Alpha Crucis tem capacidade para desenvolver grandes trabalhos, como o projeto Biodiversidade e Conectividade de Comunidades Bênticas em Substratos Orgânicos no Atlântico Sudeste Profundo (BioSuOr), iniciado em 2011, composto de pesquisadores do Instituto Oceanográfico e Instituto de Biociências (IB) da USP, da Universidade Federal do Espírito Santo, Universidade do Havaí e Universidade Auburn, ambas dos Estados Unidos.

“Os resultados sugerem que substratos orgânicos que chegam ao mar profundo em grandes parcelas (carcaças e madeira) são palco de espécies especializadas e que vêm evoluindo nestes ambientes há milhares de anos”, relata o pesquisador do estudo e professor do IO, Paulo Yukio Gomes Sumida. Ele cita também que tais substratos são mais comuns no assoalho oceânico do que se imagina.

Paulo Yukio Gomes Sumida, professor do Instituto Oceanográfico

O primeiro barco de pesquisa totalmente construído no Brasil, o Alpha Delphini, foi edificado em Fortaleza (Ceará), no valor de R$ 6 milhões – R$ 4,4 milhões da Fapesp e o restante do IO. Em julho de 2013, Delphini iniciou seu primeiro cruzeiro, partindo do porto de Recife, com destino à Ilha de Itamaracá e ao arquipélago de Fernando de Noronha. Depois, foi para o porto de Santos, sendo inaugurado em 12 de agosto de 2013.

Alpha Delphini, capaz de operar até 200 milhas marítimas da fronteira litorânea – Foto: Elisabete Braga

O instituto também possui dois barcos de pesquisa de pequeno porte, o Albacora e o Veliger II, navegando principalmente em áreas costeiras e de plataforma interna, atingindo até 200 milhas. Eles possuem 14 metros de comprimento, tripulação de três pessoas, comportando até 12 pesquisadores e com autonomia de seis dias. O Albacora está ancorado na Base de Pesquisa Dr. João de Paiva Carvalho, em Cananeia, e o Veliger II na Base de Pesquisa Clarimundo de Jesus, em Ubatuba.

“Hoje, com as condições de infraestrutura que nós temos, conseguimos ir mais longe e mais fundo”, afirma o vice-diretor do IO Michel Michaelovitch de Mahiques, que completa:

“A pesquisa oceanográfica brasileira se compara com a internacional. Mas com 8.500 km de costa e apenas dois navios oceanográficos – o Alpha Crucis e o Atlântico Sul da Furg – o Brasil deveria ter pelo menos 15 Alpha Crucis. Porque quem faz pesquisa no Oceano Atlântico são os estrangeiros”.

Navio Prof. W. Besnard navegando – Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto

Navegando para o horizonte

O Alpha Crucis tem capacidade para desenvolver grandes trabalhos, como o projeto Biodiversidade e Conectividade de Comunidades Bênticas em Substratos Orgânicos no Atlântico Sudeste Profundo (BioSuOr), iniciado em 2011, composto de pesquisadores do Instituto Oceanográfico e Instituto de Biociências (IB) da USP, da

Ao longo dos anos, o IO vem participando de diversos programas interinstitucionais, como o Programa Antártico Brasileiro (Proantar) e o Programa Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva (Revizee). A instituição entrou em 1982 no Proantar, que colocou o Brasil no Tratado Antártico, possibilitando o desenvolvimento de diversas pesquisas na Antártida.

O professor Phan Van Ngan, doutor em Engenharia de Pesca pela Universidade de Tóquio, que atua no instituto desde a década de 1970, fez parte da primeira expedição brasileira à Antártida, composta de dois navios, o Besnard e o Barão de Teffé.

O professor Phan Van Ngan, doutor em Engenharia de Pesca pela Universidade de Tóquio, fez parte da primeira expedição brasileira à Antártida – Foto: Tássia Biazon

Praticamente nenhum de nós tínhamos experiência lá. Foi uma viagem bastante aventureira.

“Eu fiz parte desde o início do projeto, ainda na etapa de planejamento, com a Marinha, o governo, os pesquisadores estrangeiros, entre outros”, relata. O professor, aos 80 anos de idade, enfatiza que o Besnard, além de permitir que o Brasil entrasse no Tratado Antártico, gerou boa parte dos dados do instituto no continente gelado, assim como boa parte da ciência produzida na unidade.

Ngan, de origem vietnamita, ainda ressalta que alguns brasileiros já haviam chegado à Antártida, mas por meio dos programas de outros países. Em 1982, ocorreria a primeira expedição brasileira ao continente.

“Praticamente nenhum de nós tínhamos experiência lá. Foi uma viagem bastante aventureira”, conta. A expedição objetivava estudar onde seria instalada a base brasileira, a Estação Antártica Comandante Ferraz, que começou a operar em 1984, mas foi desativada em fevereiro de 2012, em consequência de um incêndio. Uma nova estação deverá ficar pronta em 2018.

Foto da equipe Proantar I, publicada em Diário de Bordo, nº esp., ago/06, p. 31. – Foto: Acervo IO

Dentre as aventuras, Ngan cita que estava a bordo do Besnard no ano de 1988, quando o navio sofreu a ruptura no eixo da hélice na passagem de Drake, ficando horas à deriva do mar, sendo rebocado pelo Barão de Teffé até o Chile. A partir daí, o navio não viajou mais ao continente gelado.

Ex-orientando de Ngan e também professor do IO, Vicente Gomes diz que, hoje, a pesquisa na Antártida, embora seja muito desafiante é bem diferente de antigamente. “Agora, funciona televisão, internet e até celular”, conta sorrindo. “No começo, a comunicação era só via rádio, e ficávamos sem saber sobre nossos familiares por tempos”, lembra.

Explorando as ciências do mar

O instituto é formado por dois departamentos: Oceanografia Biológica (DOB) e Oceanografia Física, Química e Geológica (DOF). Ambos possuem vários laboratórios, totalizando cerca de 40 professores e 150 servidores. Atualmente, são mais de 200 alunos na graduação, cerca de 70 no mestrado, 50 no doutorado e 25 no pós-doutorado. Além de brasileiros, há estudantes estrangeiros, como alemães, espanhóis e italianos.

As linhas de pesquisa são dez, contemplando estudos desde a estrutura e funcionamento de ecossistemas, impactos ambientais e gerenciamento costeiro, sedimentação marinha, evolução dos fundos oceânicos até paleoceanografia.

ColBIO: valor inestimável à pesquisa oceanográfica do País – Foto: Tássia Biazon

O DOB possui o que é considerada uma das maiores coleções brasileiras de organismos marinhos, a Coleção Biológica Prof. Dr. Edmundo F. Nonato (ColBIO), inaugurada em 17 de agosto de 2012. Os dados de amostras biológicas resultam de décadas de estudos desenvolvidos desde áreas costeiras até águas profundas, coletados a partir da década de 1950.

Quase 60 mil amostras já foram catalogadas. “Estima-se que ainda tenhamos mais 50 mil amostras para inventariarmos. E a expectativa é que sempre haja novas, conforme ocorrerem novas expedições”, afirma Mônica Petti, bióloga e curadora da coleção. A coleção vem realizando um trabalho de disponibilização dos dados em formato eletrônico.

Ciência na Esfera: a sensação de ver os planetas a partir do espaço – Foto: Tássia Biazon

Oceanografia para todos

“O Instituto Oceanográfico detém o maior acervo bibliotecário sobre oceanografia no Brasil e também o maior na América Latina”, relata Maria de Jesus Pureza, chefe da biblioteca Prof. Dr. Gelso Vazzoler. O acervo surgiu em 1947, quando o instituto adquiriu a coleção bibliográfica pertencente ao naturalista Rodolpho Theodor Wilhelm Gaspar von Inhering.

“São quase 16 mil livros, cerca de 2 mil teses, 262 trabalhos de conclusão de curso e mais de 3 mil títulos de periódicos e revistas, disponíveis para consulta ao público em geral”, informa o bibliotecário Wagner Pinheiro.

Graças ao acervo, desde 2001, a biblioteca faz parte de um serviço de base de dados coordenado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), denominado Asfa Partners. Esse programa permite a indexação da literatura nacional relacionada às ciências do mar. A biblioteca também está associada a outras redes, como a The International Association of Aquatic and Marine Science Libraries and Information Centers (IAMSLIC), “o que permite ao acervo possuir algo que ainda não tem”, diz Pinheiro.

Criado em 1988, o Museu Oceanográfico, que recebe cerca de 20 mil pessoas anualmente, possui material didático sobre as quatro grandes áreas da oceanografia. Em maio de 2012, o espaço recebeu a Ciência na Esfera (Science on a Sphere, em inglês), com recursos do IO.

A mais completa biblioteca brasileira em oceanografia - Foto: Tássia Biazon

Desenvolvida pela Agência Americana de Oceanos e Clima (National Oceanic and Atmospheric Administration – NOAA, em inglês) e a Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (The National Aeronautics and Space Administration – Nasa, em inglês), a ferramenta tem a função de ilustrar os planetas e seus diferentes fenômenos.

Com aplicabilidade no ensino, pesquisa e extensão, a esfera tem grande potencial para utilização em cursos de oceanografia e afins, como biologia e geologia. Está instalada em uma das salas do museu, com capacidade para até 50 visitantes. “Tem dias que atendemos de cinco a seis escolas”, diz o biólogo e chefe do museu, Sérgio Teixeira de Castro.

O sistema é uma tela de projeção em formato de um globo de policarbonato que recebe imagens de quatro projetores multimídia, sincronizados digitalmente, recebendo atualizações contínuas dos satélites. São mais de 800 arquivos disponíveis para visualização no site Science On a Sphere. “Há vídeos que mostram a formação da pangeia, os tsunamis de 2004 e 2011, o tráfego aéreo, entre outros”, conta o biólogo.

“Em 2012 a USP instalou o primeiro equipamento no Hemisfério Sul – já havia cem no Hemisfério Norte. Hoje, além do Brasil, há na Samoa Americana e Colômbia”, informa Sérgio. Ele cita um desafio: os vídeos são em língua inglesa. “Há dois anos estamos trabalhando em um projeto inovador, visando a aumentar a acessibilidade da esfera, buscando a tradução simultânea com legenda e intérprete de libras.” A primeira etapa já foi concluída, com a tradução dos primeiros dez vídeos, mas o processo é complexo, pois há a necessidade de adequação das falas para os deficientes auditivos.

Besnard refletindo entre os golfinhos - Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto

O legado do IO

O papel do Instituto Oceanográfico na construção das ciências do mar brasileira é indiscutivelmente relevante. “Embora os estudos oceanográficos no Brasil tenham sido iniciados com quase um século de atraso, em relação aos países do Hemisfério Norte, a criação do IPO, atualmente IO, como uma unidade de ensino e pesquisa, sem dúvida, é um dos autores da construção das ciências do mar com ensino de qualidade (graduação e pós-graduação) e pesquisa, reconhecido pela Capes e pelos trabalhos científicos de qualidade reconhecidos internacionalmente”, relata o professor Luiz Bruner de Miranda, do IO.

O atual diretor do instituto, Frederico Pereira Brandini, destaca os dois pontos principais da unidade: a capacitação humana, a fim de entender os processos oceanográficos e como manejar os recursos do mar, e a geração de dados que, de uma maneira ou de outra, interfiram na sociedade, como o petróleo e a maricultura.

“Depois da ciência astronômica, a oceanográfica é a mais cara, e nem todos os países têm condições em fazê-la. O Brasil tem, mas conhece só o seu território. Outros países, como Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha, conhecem o mundo inteiro”, informa Brandini.

“A Fapesp tem um papel gigantesco no IO. Como a pesquisa oceanográfica é cara, há equipamentos de mais de US$ 500 mil, por exemplo. A maior parte disso é adquirida com recursos Fapesp e mantida com projetos da própria entidade”, enfatiza Mahiques, vice-diretor do IO.

Além da Fapesp, Brandini destaca outros principais órgãos que financiam a instituição, como o CNPq, Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTI). Além de empresas como Fundação Boticário, Vale e Petrobras. Projetos maiores e internacionais também possuem outros financiamentos.

Visto que o mundo conhece apenas 2% dos oceanos, há muito que se estudar. “Frequentemente, identificamos novos fenômenos. Por exemplo, os recifes na foz do rio Amazonas. Trabalho que colaborei e foi publicado no início deste ano, indicando que é possível descobrir algo novo em lugares ‘conhecidos’. Ou seja, conhecemos os oceanos em linhas gerais, mas, no detalhe, não conhecemos”, relata Mahiques.

A importância de conhecer os oceanos vai muito além de estar próximo ao mar ou não. “Todos nós estamos influenciando e sendo influenciados pelos oceanos de alguma maneira. Não existe um ser humano que não sofra alguma influência do ambiente marinho”, categoriza o vice-diretor do IO.

“Os oceanos são responsáveis por metade do oxigênio que respiramos. O que deságua na foz do rio Amazonas pode interferir até no Caribe. Quase 10% do PIB do nosso país provavelmente tem a ver com o turismo costeiro. Mais de 1 milhão de pescadores dependem dos recursos marinhos. E como estão esses recursos? Quais suas capacidades de suporte? Quem vai avaliar isso?”, questiona Brandini. “São os cientistas. Eles coletam dados, entendem os fenômenos e oferecem respostas para tantos questionamentos.” É o que busca há 70 anos o Instituto Oceanográfico da USP, vislumbrar as ciências do mar e suas potencialidades.


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