Imortais

Por Daniel Afonso da Silva, pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais (Nupri) da USP

 10/01/2024 - Publicado há 7 meses
Daniel Afonso da Silva – Foto: Arquivo pessoal

 

Viragens entre anos evocam meditações. A calmaria dos dias acaba forjando recordações. Lembranças inesperadas ressurgem quase secas às retinas. Temas diversos do ano que falece voltam fortes à memória como obsessão. Não raramente, como versões melhores do fato ocorrido. Ou – caetanamente – não. Mas em versões que calam fundo na imaginação.

O mestre Ivan Izquierdo de saudosa memória nos ensinou que lembramos fortemente justamente daquilo que queríamos esquecer e, do contrário, olvidamos perpetuamente tudo aquilo que gostaríamos de sempre lembrar. Por ser assim, janeiros ficam melancólicos. Os acontecimentos dos meses anteriores que mereceriam o esquecimento imediato e absoluto continuam insistentes aporrinhando impertinentemente a nossa palpitação ao passo que eventos bonitos e estampáveis em sorrisos, muita vez, por desleixo, ficam esmaecidos no turbilhão de faits divers, geralmente, miseravelmente, desprezíveis e sem vida após seu fim.

É, sim, subjetivo. Feito um estado de espírito. Quase místico. Um mistério. Como a aferição do belo. Copo parte cheio, parte vazio. Depende do momento; da afeição. Tem, sim, alguma ciência. Existe, sim, na seleção da memória de dias ruins e bons alguma razão. Mas nada muito preciso, tampouco absolutamente seguro ou verdadeiro. Rápido e devagar ensina. Quem leu, lembrará. Mas, sim: existe alguma métrica nas escolhas neurais e algum critério nas rememorações sentimentais. Mesmo que não se saiba. Emoções fortes – positivas ou negativas – viram músculos que fazem esquecer ou lembrar.

Após a agonia das noites de junho de 2013 que duraram dez anos, o reflexo natural seria cravar – para lembrar – o 2023 brasileiro como o ano Lula da Silva. Lulistas e petistas deram isso de barato já em outubro de 2022. Talvez antes. Adversários históricos do eternamente pernambucano asilado permanentemente no ABCD paulista começaram a reconhecer essa possibilidade um pouco depois. Mesmo com o país integralmente dividido 12 meses depois de a cadelinha Resistência ter subido a rampa do Planalto – sim, um ano depois de deixar a presidência da República e com toda a operação de desbolsonarização do país, Jair Messias Bolsonaro possui mais de 40% de aprovação entre os eleitores e se as eleições fossem hoje ou amanhã ele seguramente venceria o atual presidente na função com margens confortáveis – existe um consenso sobre um novo normal promovido pelo retorno do presidente Lula da Silva ao poder.

Emoção forte faz esquecer ou lembrar. Das noites de junho de 2013 ninguém se esqueceu. O impeachment de 2016, a prisão do presidente em 2018, a presidência brasileira de 2019 a 2022 também não. 2023 foi diferente.

Nesses termos, perguntar-se-ia, mesmo que Pangloss: depois do dilúvio, dias bons? A resposta evidente sempre será: “Parece que não”. E por razão simples: vê-se poucas gaivotas a voar.

Então, não: nada de falar ou rememorar o retorno do presidente Lula da Silva ao poder como o momentum definidor do ano que passou.

Aliás, sobre esse retorno, o embaixador Rubens Ricupero cometeu o escrito mais bonito e mais completo sobre o tema. “Mudaria o Natal ou mudei eu?”, eis o título. Como esse nobre embaixador, le meilleur parmi nous, sabe das coisas, ele nos lembrou que somente Getúlio Dornelles Vargas retornou à presidência do Brasil após um hiato na planície. Lira Neto, que também sabe muito, não ficou muito atrás e complementou a intuição do nosso George Kennan de mistura com Tayllerand-Périgord num artigo formidável saído no primeiro número da Piauí de 12 meses atrás sob o título de “Renascidos das cinzas”.

Comparação nunca fez razão. Mas o dileto jornalista cearense transmigrado para São Paulo e, agora, em pontes aéreas lusitanas, lembrou-nos que, feito Lula da Silva, Getúlio Dornelles Vargas, Charles de Gaulle, Winston Churchill e Juan Domingo Perón regressaram da casa dos mortos. Renasceram, recobraram corpo e rejuvenesceram o desejo de muito viver. Tipo tipos de Dostoiévski: sempre com muitas recordações para contar. Tipo personas de Jorge Luis Borges, depois de F. Pessoa, único e verdadeiro El inmortal. Com ou sem Beatriz Viterbo. Mesmo que circulares sejam as ruínas.

Lira Neto – como Ricupero – admira o trágico mais que o drama. É um exímio jornalista, extraordinário escritor e ainda melhor reconstrutor de trajetórias. Vide Castello, Maísa, Getúlio. Por ser assim, sem surpresas, no seu artigo do ano passado ele deixou a sua marca ao recompor o destino dos retornados.

Quer-se que não seja premonição. Deseja-se que não. Comparação nunca fez razão. Mas, retornados e em plenas funções, o coração de Perón parou na Casa Rosada em Buenos Aires e o cérebro de Churchill sofreu um acidente vascular grave na 10 Downing Street em Londres. O general De Gaulle, herói das guerras totais e maior legenda viva desde a morte de Napoleão em 1821 e de Clemenceau em 1929, foi escorraçado do poder pelas agitações do gracioso Dany, le Rouge e morreu de desgosto ano e pouco depois, no dia 9 de novembro de 1970, em sua boiserie em Colombey-les-Deux-Églises. Getúlio Dornelles Vargas, o bom velhinho, fez o que fez, todos se lembram e não precisa muito mais se falar.

Que Lula da Silva não siga essa gente. Ao menos isso.

De toda sorte, não. Definitivamente, não. Não é o caso – repita-se – de falar nem de marcar para se lembrar o de 2023 como o ano Lula da Silva.

Aliás, os economistas anotaram 2023 como o ano da presidente Dilma Rousseff. Coisa de economistas. Esqueceram-se da “Nova Matrix Econômica”. Eles que se entendam. Ou melhor, nem precisam. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades – viva Camões. O tempo, diz o adágio e diz Shakespeare, apaga tudo.

Se nem Lula da Silva nem Dilma Rousseff, quem?

Como se disse, é, sim, subjetivo, mas tem critério. E sob qualquer critério 2023 teve por marca a cultura e quem melhor a encarnou o essencial e o necessário de nossa cultura no ano que passou tem por nome Ruy Castro, agora, imortal porta-voz de imortais.

É curioso. Tudo passa. Mas o que ele, Ruy Castro, tem feito – impedir que passe em branco ou em brancas nuvens a memória de gente que nunca deveria desta vida a outras passar; imortais, portanto – nunca haverá de passar. Por isso a importância do dia 3 de março de 2023, quando ele, cidadão brasileiro, carioca, mineiro e de letras, tomou posse na Academia Brasileira de Letras – a sua aceitação ocorreu no ano anterior.

Sim: Fernanda Montenegro e Gilberto Gil já haviam lavado a alma dos brasileiros ao serem aceitos – ou melhor, permitirem-se serem escolhidos – nos anos anteriores. Eles dois, eterna musa e perpétuo lorde, todos sabem, sempre foram hors concours.

Eduardo Giannetti da Fonseca foi, num primeiro reflexo, uma surpresa. Se precisava ser um economista, por que não Gustavo Franco? O autor de A moeda e a lei também escreveu Shakespeare e a economia, A economia em Machado de Assis, A economia em Pessoa e assim por diante. Ou seja, esse cidadão de raízes manauaras e formação em Harvard é, acima de tudo, um homem de literatura para muito além de historiador de inflações e mentor do Plano Real. Se não ele, por que não Pérsio Arida? Arida também foi pai do Plano Real e, ao lado do, hoje, imortal, Edmar Bacha, ficou os “3.000 dias no bunker” do presidente Itamar Franco com os ministros Fernando Henrique Cardoso ou Rubens Ricupero ou Ciro Gomes. Mas não menos importante, antes disso, salvo melhor juízo, ele foi um dos primeiros economistas do planeta a meditar seriamente sobre a força da retórica – e, portanto, das palavras – na persuasão de agentes econômicos. Ninguém duvida que ele, Pérsio Arida, segue sendo um dos economistas brasileiros mais eruditos e letrados de sua geração. Para, talvez, dar cabo à conversa, se não Franco nem Arida, porque não o próprio André Lara Resende, herdeiro filial e sanguíneo do próprio Otto Lara Resende? Perguntas impertinentes. Todos – Resende, Arida, Franco – já figuram imortais. E, nessa condição, simplesmente apreciaram os contornos do fardão de seu colega de ofício e autor de Trópicos utópicos, Autoengano, O anel de Giges e O valor do amanhã. [Perdão por dizer tanto. Mas esses senhores, quando jovens moços, reconstruíram o Brasil.]

Ailton Krenak e Heloísa Teixeira também viraram imortais recentemente. Foi algo bonito e bom. Mas, não, nada superou, em força e em estilo, a chegada – ou melhor, a presença – de Ruy Castro.

Se o critério para ingressar na Academia for possuir letras, Ruy Castro sempre as teve com sobras. Aliás, seria difícil, hoje, no Brasil, encontrar alguém, de presença pública recorrente, com mais letras.

Silviano Santiago, talvez.

Quem lê Machado não consegue não voltar e reler. Às vezes, novamente reler e reler de novo. É, simplesmente, um primor. Coisa de herdeiro legítimo de Machado. Assim, só, então, por Machado, Silviano Santiago mereceria comungar na Academia pois, em verdade, esse mago mineiro das letras, todos sabem, também já é imortal e não ingressa na Academia por mistério. Ele chegou a se candidatar em 2022. Em seguida, refugou. “Foro íntimo”, alegou. Mas, como diria o alagoano que pintou “Esquinas”, “sabe lá”. Ele poderia voltar a se candidatar agora em lugar de Alberto da Costa e Silva. Seria bom. Bonito. Poético. Machadiano. Mas, novamente, “sabe lá”.

Mas o tema é Ruy Castro. A presença de Ruy Castro. Ruy Castro, imortal e porta-voz de imortais.

Quem lê de hábito a Folha de S. Paulo abre o jornal procurando as suas crônicas. Na verdade, a sua erupção de ideias. Impressionante. Para competir no mesmo jornal talvez somente os textos que o Elio Gaspari, outro imortal, assina. Fora da Folha, procurando bem, talvez, só o Sérgio Augusto, no Estadão. Ignácio Loyola Brandão também. Zuenir Ventura faz tudo bonito, mas o tempo parece que o tragou. Adicione-se a isso a falta que um João Ubaldo Ribeiro, outro imortal, morto tem dez anos, faz.

Fora as crônicas em jornal, sobre Ruy Castro, não é o caso de voltar a Carmen, Garrincha, Nelson Rodrigues, Tom Jobim, tampouco a Sinatra, Hitchcock, Doris Day, Billie Holiday, nem ao próprio rei Pedro do Brasil. Foram todos seus perfis fatto a mano. Tipo pintura. Quem sabe, escultura. “Quase memória”, diria o também imortal Carlos Heitor Cony. Coisa de oleiro. Obras plásticas, fantásticas. Envoltas em precisão alucinante. Se fosse no medievo, dir-se-ia coisa divina. Como foi tornada Divina a Comédia.

Exagero?

Quem entende um pouco de pesquisa em estilo de não ficção e vê aquilo, de um perfil a outro, sabe bem que existem horas infinitas em cada linha. Quem, além disso, também aprecia um pouco do enigma do ofício do texto bom sabe bem que transformar essa montanha de dados em texto inteligente, preciso, bonito e bom não é, definitivamente, para mortais.

Par brasileiro vivo de Ruy Castro nesse aspecto do ofício e em atividade talvez somente Fernando Morais. Mais um imortal, mineiro e cobra criada. Faltam sinônimos para o encanto diante de molduras feito Olga, Chatô, Corações sujos, Os últimos combatentes da guerra fria, Lula. Quanta dedicação.

Mas, con permiso e toda vênia, ao Morais e a todos os outros, quem assinou A noite do meu bem foi Ruy Castro.

Ruy Castro, seguramente, não vai ler estas linhas. Tomara que não mesmo. Pois se ele tomar ciência do que elas dizem, certamente, não vai gostar de saber que – para um singelo e anônimo, mas abnegado leitor e apreciador de praticamente tudo que ele escreveu e escreve, canibalizando livro após livro anotando, pesquisando, rabiscando, memorizando, comparando e voltando a reler – o seu melhor livro não é o último nem o primeiro. Mas, sim, esse que saiu em 2015 com o título A noite do meu bem e de subtítulo A história e das histórias do samba-canção.

O anjo pornográfico é um livro revelador, impactante e necessário. Mais – muito mais – que Chega de saudade. Nelson Rodrigues merecia e os brasileiros precisávamos d’O anjo pornográfico.

Esse pernambucano radicado no Rio de Janeiro foi o mais eloquente empregado de jornais de toda uma geração. E, pasme-se, uma geração com tipos feito Ivan Lessa, Antonio Maria, Sérgio Cabral (o pai), Ibrahim Sued, Paulo Francis e outros. A vida como ela é foi uma obra-monstra-prima. Mas que dizer de Boca de ouro ou Os sete gatinhos?

Nelson Rodrigues valia e vale tantas missas quanto valeu e vale La comédie humaine – e seu criador Balzac. Cada povo, é verdade, possui o Balzac que merece. Os brasileiros tateávamos para encontrar o nosso. Ruy Castro nos convenceu ser Nelson Rodrigues. Muitos não vão gostar nem concordar. Mas foi assim.

Estrela solitária é um livro pesado, mas também necessário. Muito mais complicado que Metrópole à beira-mar, por exemplo. Tem um estilo límpido. Como sempre. Mas árido. Como só ele poderia ser.

Ruy Castro parece ali, propositalmente, conduzir o leitor às amarguras das personagens. Sai-se do livro meio inebriado. Muita vez, até perturbado. Tem gente que relatou chorar com os choros e traumas dos reportados. Mas, depois de certo tempo, percebe-se que seu autor, Ruy Castro, em verdade, parece que sorri. Como diz o adágio, quién rie entende. Ele parece sorrir porque o núcleo da trama, ao fim das contas, jamais foi o drama de Um brasileiro chamado Garrincha, mas a estrela imensa, reluzente, solitária e imortal de nome Elza Soares.

As edições de Carmen – a brasileira mais famosa do século XX saíram com letra miúda demais. O editor e o diagramador poderiam ter preparado o livro para ficar com mil páginas. Não teria problema. O texto seria devorado da mesma maneira. Em 2005, quando saiu em primeira edição, Ruy Castro já era um monumento entre os escritores brasileiros e todos já compravam seus livros às cegas sem pestanejar nem ver. Havia, inclusive, intrigas para se desvendar onde Ruy Castro guardava tantos prêmios. Sobretudo, Jabutis.

Bem, A noite do meu bem.

A noite do meu bem saiu em 2015 e ficou em terceiro lugar na premiação Jabuti de 2016. É até engraçado. Quem tiver a paciência de reler Ruy Castro na sequência, livro a livro, de Chega de saudade a Os perigos do imperador [que levou o Jabuti em 2023], vai notar e anotar que A noite do meu bem é, de longe, o seu mais fidedigno autorretrato. Ele se transmuta feliz para o enredo.

Carmen o salvou de um câncer. Excelente.

Estrela solitária lhe deu a convicção de que o álcool não era para ele. Ótimo.

O anjo pornográfico foi uma ode ao mestre maior, Nelson Rodrigues. Perfeito.

O conjunto de sua obra lhe deu o prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras. Formidável.

Mas A noite do meu bem é um passeio guiado pelo que houve de mais bonito no Rio de Janeiro – e no Brasil – nos tempos em que o Brasil – e o Rio de Janeiro – prometia, mais uma e talvez pela última vez, ser incrivelmente bonito com ou sem nova bossa. Nele Ruy Castro apanha o leitor pelas mãos, adentra lugares, ruas e vielas, bares, restaurantes, hotéis e boates e sugere o melhor manjar, indica o drink especial daquele dia, chama os principais artistas da noite à mesa e se faz de cicerone. Basta ler o livro com a imaginação, tapando olhos e ouvidos e deixando Ruy Castro promover as apresentações. Simples assim. “Oi, Dolores Duran. Tudo bem? Boa noite. Este é fulano. É o primeiro dia dele aqui”; “Como vai Maísa? Este é sicrano. É um amigo novo”; “Dorival Caymmi, tudo bem? Quanto tempo? Este é nosso novo confrade”; “Presidente João Goulart, boa noite. Como vai o Senhor?”.

Bom, é assim.

Isto é A noite do meu bem e este é Ruy Castro, porta-voz de imortais.

Sai-se do livro quase amigo íntimo das personagens. Quase todas brasileiras. Todas elas de cinema. Sempre fartas em inspiração. Imortalizadas e imortais.

Como não se envolver – e até se comover – com tamanha dedicação?

Como não imortalizar um cidadão – desde muito imortal – que faz gentilezas dessas?

Parece ter sido Richelieu, o fundador da Académie française, no distante ano de 1635, o primeiro a explicitar que “não se fazem estados nem nações sem letras muito menos se constroem destinos sem homens de letras”. Quem assistiu, ouviu e/ou leu o discurso de recepção de Ruy Castro na Academia Brasileira de Letras, proferido pelo imortal Antonio Carlos Secchin, no dia 3 de março de 2023, viu (ouviu e/ou leu) algo que raramente se vê, se ouve ou se lê mesmo nesse santuário das letras inaugurado por Machado de Assis: viu-se, ouviu-se e/ou leu-se um homem integralmente de letras. Quando se lê e relê o discurso do próprio Ruy Castro tudo isso ganha ainda mais evidência. “Tudo é palavra e palavra é tudo”, lembrou ele.

Dúvidas não restam. Por isso, a distinção da sua imortalização se deu ao fato de que ele levou consigo, através de suas letras, para a Academia Brasileira de Letras a maior pluralidade de imortais, imortalizados ou não, brasileiros disponíveis no Brasil de todos os tempos. Gente humilde e gente nobre. Gente importante e anônima. Gente riquíssima, modesta e gente, muitas vezes, também, falida. Gente dos tempos do rei aos tempos dos acordes de João Gilberto. Gente dos versos de Bilac aos reis momos dos últimos carnavais. Uma gente total e integral com a qual o Brasil e os brasileiros jamais precisaram tanto se aconselhar.

Que não haja ilusão: a tragédia brasileira de 2013 a 2022 foi brutal. Viveu-se, nesses anos todos, algo horrível. Nunca o país esteve tão sem bússola, desacreditado de si e sem motivação para renovar-se. O retorno do presidente Lula da Silva ao poder em 2023 não resolveu o problema pois não passou de remendo. Vinho velho em odre velho. A reabilitação do sonho intenso – aquele do hino – precisa de mais, muito mais.

Ninguém tem receitas e o tempo não para. Mas já se sabe que depois desse dilúvio ainda vão demorar os dias bons. Por ser assim, o único atalho – mesmo, também, talvez, inseguro – continua sendo o garimpo das melhores inspirações, boas e ruins, de nossos passados mediante o cotejo permanente de nossas gentes. Especialmente essas gentes que Ruy Castro plasmou em si, para si e para todos.

2023 foi o ano Ruy Castro, assim, não [só] por ele, mas pelas gentes que ele carrega consigo e faz reviver. Gentes brasileiras. Gentes que fizeram (e fazem) do Brasil, Brasil. Gentes com as quais precisamos voltar mais a consultar, conviver, amar, ignorar. Gentes imortais; vivas em mim e vivas em nós.

“Viva Ruy Castro.”


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