Em carta aberta enviada a embaixadas brasileiras em diversos países, os gestores de 29 fundos que detêm mais de 3,5 trilhões de dólares investidos em todo o mundo (cerca de três vezes o valor do PIB brasileiro) manifestam profunda preocupação com o rumo da política ambiental brasileira. O documento cita a “desregulamentação ambiental” em curso e vários projetos de lei preocupantes: o de ocupação de terras e florestas públicas, conhecido como “medida provisória da grilagem”, transformada em projeto de lei; o projeto para permitir mineração e garimpo em terras indígenas; e, textualmente, o que visa a “enfraquecer o sistema de licenciamento ambiental”.
Essas iniciativas são consideradas como “apenas algumas das ameaças que temos observado em relação às políticas ambientais e aos direitos humanos no Brasil”.
O enfraquecimento do licenciamento ambiental é matéria de preocupação porque, apesar das regras de licenciamento brasileiras serem complicadas, os projetos que requerem grandes investimentos são avaliados segundo critérios menos exigentes do que os empregados internacionalmente. E qual é essa régua internacional?
Bancos de desenvolvimento, agências de crédito à exportação, bancos comerciais e fundos de investimento avaliam previamente os impactos e riscos ambientais de suas operações de crédito e de seus investimentos. A principal referência técnica para avaliação prévia e acompanhamento de seus investimentos são os padrões de desempenho de sustentabilidade ambiental e social da Corporação Financeira Internacional, o braço do Banco Mundial especializado em financiar o setor privado.
Há efetivamente um emaranhado de normas infralegais que regulam o licenciamento ambiental, e que demandam aperfeiçoamento. A questão é saber se o texto que será submetido à votação – ainda não divulgado publicamente pelo relator – torna mais claras essas regras. Alguns Estados já fizeram reformas, independentemente da lei federal.
Diferentemente da atual regulamentação brasileira e daquilo que se sabe do projeto de lei (por suas versões anteriores), os padrões de desempenho tratam menos de procedimentos a serem observados e mais de requisitos concretos e diretrizes técnicas para avaliação de projetos. A última versão pública do projeto de lei dedica-se essencialmente a estabelecer regras sobre necessidade ou não de licenciamento e sobre procedimentos diversos, deixando em branco o conteúdo dos estudos necessários e sendo totalmente omissa sobre o que deve ocorrer depois da emissão da licença.
Para empresas ou fundos que queiram investir no Brasil, a licença ambiental não é garantia de que seus projetos não causarão danos irreversíveis ao ambiente ou não afetarão os direitos humanos e os povos indígenas. Por isso, os estudos de impacto ambiental e outros estudos ambientais preparados para atender aos requisitos do licenciamento precisam ser suplementados por estudos mais completos que evidenciem os riscos socioambientais e descrevam as medidas necessárias para minimizá-los. Dessa forma, com licenciamento fraco, há duplicação de esforços, maiores custos e incertezas para os investidores.
O projeto também é silente sobre a consulta pública e o envolvimento dos cidadãos nas decisões de licenciamento e no acompanhamento dos empreendimentos licenciados. Há também aqui flagrante descompasso entre o que é exigido no Brasil e a boa prática internacional, que reconhece o papel das organizações da sociedade civil, cada vez mais importante à proporção que a confiança nas instituições de governo encarregadas de proteção ambiental vai sendo erodida.
Cabe aos legisladores ponderarem se o País deveria atrair investimentos que contribuam para a sustentabilidade ambiental, social e econômica, gerando benefícios duradouros, ou se pode continuar queimando seu capital natural e destruindo sua sociobiodiversidade.