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INCLUSÃO
SOCIAL NA USPUniversidade enfrenta desafio de reparar desigualdades históricas no ensino superior
Gustavo Campos entrou no curso de História, na USP, pelo Sisu. O estudante defende a adoção de cotas raciais na Universidade
Carta ao Leitor
Em 2012, após quatro anos de tramitação no Congresso Nacional e muitos debates na sociedade civil, o governo federal aprovou a Lei de Cotas. Ela estabelece a reserva de metade das vagas dos processos seletivos de todas as universidades e institutos federais a alunos que cursaram o ensino médio integralmente em escolas públicas. As cotas determinam ainda a destinação de vagas para alunos pretos, pardos e indígenas.
A política afirmativa foi criada para reduzir uma grande distorção. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), no Brasil, mais de 85% dos matriculados no ensino médio estão na rede pública de ensino. Entretanto, quando se observava o ingresso desses alunos em instituições de ensino superior público, havia uma inversão.
O prazo para o cumprimento integral da lei se encerra em 2016, mesma data em que a primeira política institucional de inclusão social da USP completa dez anos. Reavaliado ao longo dos anos, o Inclusp busca atrair os estudantes de escolas públicas a partir da concessão de bônus na nota do vestibular.
O Conselho Universitário colocou meta e prazo para ampliar a presença desses alunos. Até 2018, a graduação da USP deve ter metade de seus calouros egressos da rede pública de ensino. A média geral da Universidade neste ano foi de 34,6%, mas o quadro dentro de cada uma das 42 unidades de ensino e pesquisa revela resultados desiguais. Enquanto a Faculdade
de Educação já ultrapassou os 50%, a Escola de Engenharia de São Carlos ainda está em 14,1%.
Para acelerar o processo de inclusão dos alunos, a USP adotou, em 2015, uma medida inédita. Pela primeira vez em 40 anos, foi aberta outra porta de ingresso além da Fuvest: o Sisu. Pelo Sistema de Seleção Unificada, informatizado e gerenciado pelo MEC, as instituições públicas de ensino superior oferecem vagas para candidatos participantes do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Com a participação no Sisu, a USP destina uma parcela de suas vagas para estudantes de escolas públicas e pretos, pardos e indígenas, grupos historicamente excluídos da sociedade brasileira e das salas de aula do ensino superior.
Apesar dessas ações, os movimentos organizados dentro e fora da Universidade consideram insuficientes as medidas implantadas até hoje e defendem a adoção de cotas étnico-raciais. A Pró-Reitoria de Graduação da USP não descarta a criação das cotas, desde que a comunidade universitária como um todo esteja afinada com a mudança.
Cumprindo o compromisso de fazer a mediação entre a USP e a sociedade, o Jornal da USP Especial traz sua contribuição ao debate e apresenta, de forma transparente, os problemas e soluções que acredita que devem ser considerados na discussão.
Boa leitura!
Hérika Dias
Editora de Universidade do Jornal da USP
Reportagens
Conheça a seguir as políticas de inclusão social para o ingresso na USP adotadas até hoje e como elas têm refletido no perfil dos alunos que estudam nos cursos de graduação. As reportagens trazem também as reivindicações de grupos sociais que consideram as medidas institucionais da Universidade insuficientes
Modelo de inclusão adotado pela USP foca o aluno de escola pública
Propostas buscam atrair estudantes negros e de baixa renda da rede pública de ensino
Presença de alunos de escola pública nas unidades é desigual
Em três unidades, metade dos ingressantes vem da rede pública de ensino
USP realiza mudança histórica na seleção de alunos
Universidade adere ao Sisu e altera, pela primeira vez em 40 anos, a forma de ingresso
Na primeira experiência com Enem, USP preenche 55% das vagas
Universidade avalia erros operacionais que prejudicaram a convocação de mais alunos
A evolução das políticas de inclusão social na USP
Aumenta adesão ao Sisu no vestibular 2017
Cinco unidades que não participaram no ano passado já confirmaram vagas
Resultados do vestibular ditarão mudanças nos próximos anos
Outras ações serão discutidas se o perfil dos ingressantes se mantiver igual
Por que cotas étnico-raciais?
Um professor da área de Comunicação, um de Direito e um de Ciência Política, um juiz federal, um frei e um estudante universitário. O que eles têm em comum? Todos defendem a igualdade de oportunidades sociais para negros em todos os setores da sociedade, sobretudo, em universidades e, principalmente, na USP. Para eles, a adoção de cota étnico-racial no ensino superior é um direito e oportunidade de o País se redimir pelos anos de escravidão.
Esses seis profissionais de diferentes áreas são parceiros da Educafro e foram convidados pelo Jornal da USP Especial para expor suas ideias em formato de artigo. Conheça um pouco mais os autores.
Ivan Siqueira é professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e foi nomeado membro da Câmara Básica de Educação do Conselho Nacional da Educação até 2018. A indicação foi feita pela Educafro e comemorada pela entidade pela presença de um homem negro no órgão.
Adilson Moreira é professor e pesquisador em Direito. Em 2013, concluiu seu mestrado na Universidade de Harvard sobre a política racial brasileira. Ele abordou as decisões judiciais para explorar as ligações entre estruturas de poder do discurso nos casos de ação afirmativa no Brasil.
Tom Junior é estudante do curso de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP. Ele também dá aulas e coordena o cursinho comunitário mantido pela Educafro.
Wiliam Douglas é juiz titular da 4ª Vara Federal de Niterói, no Rio de Janeiro, além de ser professor e escritor. Antigo apoiador das cotas sociais, hoje defende as cotas étnico-raciais por entender que as primeiras não são suficientes para a inclusão do negro.
João Feres Júnior é professor de Ciência Política da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordena o Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA), no qual são desenvolvidas pesquisas sobre raça e políticas afirmativas no Brasil e no mundo.
David Raimundo Santos, ou só frei David, como é conhecido, começou a atuar em defesa dos direitos dos negros em 1976, um trabalho que resultou na criação da organização não governamental Educafro, da qual é diretor-executivo.
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil