No Acre, USP pesquisa malária e a saúde de mães e seus bebês

Instituto de Ciências Biomédicas e Faculdade de Saúde Pública desenvolvem projetos em Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul

Na face mais a oeste do Brasil, no Acre, estão os dois municípios que, atualmente, ocupam a posição de campeões de ocorrência de malária no Brasil: Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul. Em abril de 2018, pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP estiveram nas cidades para realizar estudos que visam a entender a ocorrência da doença na região e propor soluções que possam ajudar no combate à malária.

A pesquisa é coordenada pelo professor Marcelo Urbano Ferreira, do Departamento de Parasitologia. Pelos próximos cinco anos, a cada seis meses, uma equipe irá até Mâncio Lima entrevistar e coletar sangue de moradores. Outra vertente do estudo é realizada em Cruzeiro do Sul, a partir do uso de biolarvicidas em tanques de criação de peixes para controle das larvas de Anopheles, o mosquito vetor da doença.

Já a Faculdade de Saúde Pública  (FSP) da USP desenvolve, desde 2015,  um acompanhamento de longo prazo (coorte) de mães e seus bebês: é o Estudo MINA-Brasil, coordenado pela professora Marly Augusto Cardoso, do Departamento de Nutrição. O objetivo é avaliar aspectos da saúde e da nutrição, desde a concepção dos bebês até os dois primeiros anos de vida (mil dias). Pesquisas indicam esse período como uma “janela de oportunidades” para uma série de intervenções importantes que podem melhorar o perfil de saúde da criança na adolescência e na vida adulta. Atualmente, o projeto envolve a participaçção de cerca de 900 bebês e suas mães.

Uma equipe do Jornal da USP, formada pela fotógrafa Cecília Bastos e a jornalista Valéria Dias, acompanhou as atividades dos pesquisadores em abril de 2018 nas cidades de Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul. Esta reportagem especial é o resultado deste trabalho.

Boa leitura!

Valéria Dias
Subeditora de Ciências do Jornal da USP
São Paulo, 13 de setembro de 2018

Mâncio Lima, no Acre, tem 17.910 habitantes. É o município campeão de malária no Brasil, em termos proporcionais. Em 2017, mais de metade da população foi diagnosticada com a doença. Entre os casos, há uma proporção de ocorrência relativamente alta na zona urbana, fato não muito comum e que parece ser algo exclusivo da cidade. Leia mais

Numa vila entre Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul (Acre), tanques de peixes são foco de criação de larvas de Anopheles, mosquito que transmite os parasitos causadores da malária: Plasmodium vivax e o Plasmodium falciparum. No próximo mês de setembro, pesquisadores da USP começam os testes de controle da doença com o uso de biolarvicidas, substâncias capazes de matar larvas de mosquitos sem causar danos ao meio ambiente.
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Pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP realizam o Estudo MINA-Brasil Saúde e Nutrição Materno-INfantil no Acre desde 2015, na cidade acriana de Cruzeiro do Sul. Este acompanhamento de longo prazo (coorte) de gestantes e seus filhos tem o objetivo de avaliar aspectos da saúde e da nutrição, desde a concepção dos bebês até os dois primeiros anos de vida (mil dias). Atualmente, conta com a participação de cerca de 900 crianças e suas mães.
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Artigos

As pesquisas da USP em Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul, no Acre, contam com o apoio do Campus Floresta da Universidade Federal do Acre (Ufac). O Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) utiliza as instalações do Laboratório de Doenças Infecciosas da Amazônia Ocidental (LabDINAMO) para preparar as amostras de sangue de pessoas infectadas com malária, além de realizar outras atividades de pesquisa.

O laboratório é coordenado pelo professor da Ufac Rodrigo Medeiros. Vários equipamentos foram adquiridos com recursos do projeto do ICB. A tese de doutorado de Rodrigo analisou alterações histopatológicas da placenta associadas à infecção por Plasmodium vivax (protozoário causador da malária) em gestantes do Vale do Alto Juruá. 

De 10 a 19 de agosto, um grupo de alunos e pesquisadores do ICB foi para Cruzeiro do Sul, no Acre, onde foi realizado, no LabDINAMO, o I Curso Prático de Diagnóstico Molecular para Malária, com a participação dos professores Gerhard Wunderlich, Carsten Wrenger e Cláudio Marinho, que teve apoio do Exército brasileiro. Veja mais neste link.

O MINA-Brasil também conta com a participação de alunos de graduação em Enfermagem e Biologia do Campus Floresta. A professora Ana Alice Damasceno, do curso de Enfermagem da Ufac, obteve o mestrado com uma pesquisa realizada junto ao estudo.

O papel de formadora de recursos humanos da USP também pode ser observado em outro exemplo no Campus Floresta: o professor André Luis da Silva Caldas, formado pela Universidade de Campinas (Unicamp), com mestrado e doutorado pela USP, coordena agora o Laboratório Didático de Anatomia e Fisiologia Comparada. Em seu projeto atual, ele desenvolve um novo recurso didático utilizando peças cadavéricas de animais nas aulas dos cursos de Biologia e Enfermagem.

Já o professor Francisco Ricardo Negri, do Laboratório de Paleontologia do Campus Floresta, não é formado pela USP, mas desenvolve pesquisas em conjunto com o laboratório homônimo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP. Em 2013, com fomento da Fapesp, um grupo da USP foi até o Acre realizar a prospecção em depósitos da Formação Solimões, onde foram coletados fósseis de tartarugas, bivalves, peixes, crocodilos e mamíferos, e contou com a participação do professor Negri.

Quem acompanhou o Oscar 2017 pôde observar nas mãos da consultora de moda americana Stacy London uma clutch (bolsa pequena para carregar objetos como batom, celular, etc.) com um desenho de uma paisagem noturna, com lua e estrelas. O que muitos não sabem é que a bolsa foi confeccionada a partir da técnica da marchetaria, em uma oficina-ateliê existente em Cruzeiro do Sul, no Acre. Durante a cobertura jornalística das pesquisas da Faculdade de Saúde Pública e do Instituto de Ciências Biomédicas no Acre, a equipe do Jornal da USP foi convidada para conhecer o criador deste trabalho: o artista Maqueson Pereira da Silva, da Marchetaria do Acre – Maqueson Marchetaria

A marchetaria consiste na combinação e aplicação de partes recortadas de diversos tipos de madeira em objetos de marcenaria, formando desenhos dos mais variados tipos. As cores são obtidas por meio de diversas madeiras, de diferentes tonalidades, que dão origem a desenhos facilmente confundidos com pinturas, tamanha é a perfeição do trabalho. Maqueson trabalha com 150 tipos distintos de madeira, vindas tanto do Brasil como de outros países.

Uma bolsa semelhante àquela que Stacy exibiu no tapete vermelho chega a ser comercializada por R$ 5 mil. Em sua oficina-ateliê, além de clutchs, Maqueson produz quadros, marcadores de página, caixas para relógio, capas para celular, chaveiros, estojos para canetas, kits de escritório, porta-batom e mais uma infinidade de produtos.

Diante da pergunta E o que move o seu trabalho hoje?, o artista responde: “A minha grande fonte de inspiração é a própria Amazônia. Está muito forte dentro de mim. Eu poderia ter ficado na Europa, na Itália. Mas preferi voltar para as minhas origens justamente porque aqui em Cruzeiro do Sul encontro inspiração e sinto uma motivação maior”.

Reportagens: Valéria Dias | Fotos: Cecília Bastos | Arte: Larissa Fernandes