A mastite subclínica é um processo inflamatório que atinge a glândula mamária das vacas, afetando a saúde do gado e a produção leiteira. Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a doença acomete cerca de 20 a 38% de todo rebanho nacional, refletindo diretamente na produtividade. Para ajudar a identificar esse problema, alunos da empresa júnior do curso de Engenharia de Biossistemas (Biossistec Jr.), da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP em Pirassununga, estão desenvolvendo um aplicativo capaz de detectar e analisar a presença da anomalia responsável pelos maiores prejuízos da bovinocultura nacional.
O Mastitec é um software mobile para celulares e handhelds (computador de bolso). Ele funciona a partir de uma base de dados pré-estabelecida, comparando imagens térmicas e criando padrões para a região das glândulas mamárias (úbere) a fim de concluir se o animal avaliado possui ou não a doença. Para seu funcionamento, é necessário acoplar ao aparelho uma câmera capaz de capturar fotografias termográficas, o equipamento está sendo criado por parceiros do projeto.
Por conta da ausência de sintomas e alterações visíveis no leite ordenhado, a identificação da mastite subclínica é muito complicada, o úbere e as mamas do animal não apresentam anormalidades a olho nu e o problema só é notado com as quedas na produção. A tecnologia poderá facilitar esse diagnóstico.
“A metodologia proposta para o desenvolvimento é relacionada a técnicas de processamento de imagens e reconhecimento de padrões como parte de um sistema de visão computacional para análise de mastite subclínica”, comenta Luciano Lulio, professor do Departamento de Engenharia de Biossistemas da FZEA e coordenador do projeto.
Após o download do aplicativo e sua instalação, o produtor encontra uma tela de instruções na qual deve cadastrar tanto dados pessoais quanto informações sobre seu rebanho, separando-o em lotes. Dando fim aos registros e acoplando a câmera termográfica, um display para a captura das fotografias aparece. São pedidos três tipos de imagem: uma traseira, e duas laterais (esquerda e direita) do úbere do animal a ser analisado. Em poucos segundos, os dados começam a ser comparados com a base já instaurada na aplicação, por meio de algoritmos de processamento de imagens e classificação, como redes neurais artificiais.
Conforme o professor, o usuário não precisa se preocupar com esse processo, as comparações acontecem de forma automática. Em poucos instantes, a conclusão irá aparecer em seu celular, indicando em qual patamar aquela vaca está situada: alta, média, baixa ou sem chances de portar mastite (animal saudável).
Segundo Lulio, o funcionamento do aplicativo deve ser o mais simples e notório possível, assim, o produtor pode manuseá-lo da forma correta. Além disso, é importante ressaltar que a técnica busca complementar e não substituir as outras formas de identificação de mastite, aquelas laboratoriais e preditas usualmente pelos órgãos competentes de controle de qualidade do leite em bovinocultura, como a contagem de células somáticas (CCS) e o California Mastitis Test, popularmente conhecido como CMT.
Os primeiros experimentos com o aplicativo já foram realizados por professores do mesmo departamento, que também orientam o projeto, como Luciane Martello (responsável pela temáticade bovinocultura de leite) e Rafael de Souza (da área de automação em agropecuária), e produtores da própria USP.
Até agora, o Mastitec só existe em protótipo, mas já começou a ser traduzido para outras linguagens de programação como Java e C-Objective, a fim de chegar o mais rápido possível às plataformas Android e iOS.
O desafio e a experiência
Em julho do ano passado, a Embrapa lançou o Ideas for Milk, competição para apresentar soluções inovadoras e aumentar a eficiência da cadeia produtiva de leite no Brasil. O grupo da Biossistec Jr., responsável pelo Mastitec, levou a ideia para este desafio e ficou com o quarto lugar na etapa nacional, vencendo também a fase regional, realizada na cidade de São Carlos, em São Paulo.
“Poder apresentar um projeto com a cara da Engenharia de Biossistema, aplicar um sistema para um modo de produção de animais, mostrar isso para pessoas que conhecem do mercado e ainda ser elogiado, foi uma ótimo experiência”, diz Lucas Herker, aluno da USP Pirassununga e desenvolvedor do projeto, sobre a oportunidade em competir no Ideas for Milk.
“Ganhar a final regional de São Carlos e ainda participar da final nacional foi uma realização. A partir daí, conseguimos observar a grandiosidade que podemos atingir. Os incentivos que recebemos no projeto nos dão muita esperança para desenvolvermos mais coisas nessa área e mostrar para o Brasil o que é a Engenharia de Biossistemas e como ela pode nos ajudar”, conclui.