Foto: Reprodução/Rugby USP

Da USP para as Olimpíadas: quando o esporte universitário rompe barreiras

Conheça a história de Aline Furtado, jogadora de rúgbi que conheceu o esporte na USP e representou o Brasil nos Jogos de Tóquio 2020

 20/09/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 23/09/2021 as 19:26

Victoria Borges

O esporte na universidade pode estimular vínculos, incluir os alunos no ambiente estudantil e proporcionar momentos de lazer. Para Aline Furtado, ex-aluna da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP, em São Paulo, ele foi além: abriu portas para  competir na Olimpíada de Tóquio 2020.

Aline conheceu o rúgbi em 2013, quando entrou na Universidade. Mas os esportes sempre fizeram parte da vida da atleta, que desde cedo jogava futebol com o pai. “Eu vim de uma família em que o esporte está na veia. Meus pais são muito esportistas, meu irmão mais velho também sempre praticou”, conta.

Ela começou a treinar basquete aos 13 anos. No entanto, sua trajetória no alto rendimento foi no atletismo. Foram cinco anos de dedicação à modalidade , pela qual Aline chegou a competir em alguns torneios nacionais. E aí iniciou o  seu grande desejo de ir para os Jogos Olímpicos.

Entrei na USP, e agora?

Além dos torneios internacionais, Aline também sonhava em entrar na USP. Mas conciliar os treinos com a rotina do pré-vestibular foi um grande desafio, o que fez a atleta questionar seu futuro no esporte. “O ano antes de entrar na faculdade é sempre muito difícil. Eu também estava num momento complicado no atletismo, em que comecei a ter várias lesões”, explica a atleta. 

O Bacharelado em Esporte, curso no qual Aline é formada, não foi sua primeira opção. “Era muito intuitivo eu fazer essa graduação, porque sempre amei esportes. Mas não era uma ideia que os meus pais gostavam. Eu também tinha um pouco de preconceito, porque só conhecia o professor de escola como profissional de educação física”. Durante os treinos, a atleta entendeu que a profissão ia além disso e decidiu seguir por esse caminho.

Quando descobriu que havia sido aprovada no vestibular, Aline estava no ônibus, voltando do treino de atletismo. A euforia de ter ingressado na Universidade logo se misturou com a incerteza sobre as competições esportivas. “Assim que passei na USP, entendi que meu momento de atleta tinha acabado, que, agora, ia estudar para treinar atletas”, conta.

O amor pelo esporte sempre falou mais alto, e Aline entrou na faculdade disposta a conhecer novas modalidades: foi aí que o rúgbi entrou em cena. A atleta participou de alguns treinos do time da Universidade, mas, logo no primeiro jogo, teve uma concussão e resolveu se afastar. “Pensei que o rúgbi não era para mim. Eu tinha gostado do esporte, mas o medo das lesões me fez sair logo de início”, explica.

Arte sofre fotos / Facebook Aline Furtado e Rugby USP

O retorno às quadras

Em 2016, durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, Aline assistiu a um jogo da modalidade e ficou deslumbrada pelo esporte novamente. “O rúgbi é uma coisa muito doida, todo mundo que já teve contato fala a mesma coisa. Parece que a gente é picada por um bichinho e fica fascinada pelo esporte”. Foi aí que resolveu voltar aos treinos.

A partir disso, tudo foi bastante rápido. No ano seguinte, Aline já estava treinando com a Confederação Brasileira de Rugby, as “Yaras”. A atleta destaca que sua trajetória no atletismo foi fundamental para o desenvolvimento no novo esporte, proporcionando  maior resistência e rapidez, características importantes para o rúgbi

Aline Furtado em jogo pelo time brasileiro - Fotos: Reprodução/ Facebook Rugby Brasil

“O que me motivou a começar no rúgbi é o fato dele ser uma modalidade coletiva. Nas modalidades individuais, o rendimento só depende de você. Você não tem relacionamento com outras pessoas. No atletismo, eu fazia 100 metros com barreira. Eu precisava ser rápida e ágil. No rúgbi, são exigidas muitas outras capacidades físicas. Eu preciso ser realmente rápida, realmente forte e realmente resistente. Esse foi um grande desafio que me instigou a ficar no esporte”.

O rúgbi feminino é uma modalidade ainda não muito praticada no Brasil, e a falta de competidoras exige que as atletas do time se esforcem ainda mais durante os torneios. Dois meses após ter entrado na seleção, Aline foi para uma etapa do circuito mundial. “Eu precisava estar pronta, saber as jogadas e praticar o esporte de uma forma que eu não sabia”, conta.

As dificuldades foram um combustível para Aline. “Ao mesmo tempo que pensava em desistir, estar lá e ver todas aquelas pessoas gigantes, que eu só assistia jogar pelo YouTube, me instigou”.

Parecia o fim do sonho

Em 2019, os atletas de todas as modalidades só pensavam nas Olimpíadas, que seriam realizadas no ano seguinte — e com Aline não foi diferente. As inseguranças eram menores e o sonho de se tornar uma atleta olímpica estava cada vez mais próximo. Mas, no final do ano, a jogadora teve uma lesão e precisou se afastar dos campos por nove meses.

“Foi um momento muito difícil para mim, porque eu realmente não teria condições de disputar os jogos. Esse foi o pior momento da minha carreira até agora. Tive que superar muitos obstáculos mentais para aprender a andar, a correr, a fazer muitos movimentos novamente”.

O adiamento da competição por causa da pandemia de covid-19 reacendeu as esperanças em Aline. Assim que pôde, a atleta voltou a treinar sozinha, com auxílio da fisioterapeuta. Em agosto de 2020, o time voltou aos treinos em grupo,  pensando nos Jogos Olímpicos.

Fotos: Reprodução/ Facebook Rugby Brasil

“Esse foi um ano de muito foco e concentração nos mínimos detalhes. Foi uma experiência maravilhosa ter participado dessa preparação. Foi muito desgastante e cansativo, mas teve muito esforço e muita entrega de todo mundo. Isso fez com que a gente se unisse mais. Acho que os momentos em que a gente mais se entrega para o grupo é nas horas de cansaço. Porque você não pensa demais, é você puramente”.

Enfim, Tóquio

Quando recebeu a notícia que iria representar o Brasil em Tóquio, Aline não acreditou. “A ficha demorou uns dois dias para cair. Na verdade, acho que só agora que ela está caindo de verdade”. A atleta destaca o momento em que chegou à Vila Olímpica e esteve ao lado de outros competidores que admirava. “Eles estavam no mesmo lugar que eu. Eram diferentes modalidades, mas a gente estava no mesmo patamar. Eu fiquei impressionada”.

Antes de ir para a Vila Olímpica, o time ficou hospedado em Nagato, uma pequena cidade no sul do Japão. “Assim que saímos do avião, a cidade inteira estava lá com as bandeirinhas do Brasil”, lembra Aline, ressaltando a boa recepção dos japoneses. 

As Yaras foram as únicas representantes sul-americanas no rúgbi feminino. Mesmo que os resultados não tenham saído como o esperado, estar nos jogos já foi uma grande conquista para a equipe. Aline vê potencial no time e diz estar confiante para as próximas competições.

As "Yaras", time do rúgbi feminino em Tóquio - Fotos: Reprodução/ Facebook Rugby Brasil

“Ter chegado às Olimpíadas fez com que eu não sentisse mais toda aquela diferença para as outras jogadoras que senti no meu primeiro jogo. Fisicamente mesmo. Na hora do impacto, eu sentia muito, agora, não mais. A velocidade é parecida, a resistência, a força”, declara a atleta. Ela ressalta que todo o processo, desde os treinos na Universidade até o pós-lesão, foram importantes para que ela se sentisse assim.

Ficha de atleta olímpica e junto de outros atletas (ao centro a ginasta Daiane dos Santos) em homenagem realizada pelo Governo de São Paulo - Fotos: Reprodução/ Facebook Rugby Brasil

O esporte na universidade

“O Cepe [Centro de Práticas Esportivas da USP] foi minha segunda casa. Pratiquei muitas modalidades lá. Fazer esporte dentro da USP faz com que você conheça mais a sua turma e sua faculdade. Você cria um amor pela universidade e aprende a se identificar com ela. Também é um momento de autoconhecimento. Considero que praticar esporte dentro da USP foi super importante para mim. Eu não teria chegado onde cheguei se não tivesse conhecido o rúgbi lá dentro”, afirma Aline.

A atleta ainda joga pelo time de rúgbi da USP, mesmo recebendo propostas de outras equipes. “Quero continuar dentro do Rugby USP e levar esse nome para fora. Fazer com que pessoas do ambiente universitário saibam que o esporte também é uma opção. Eu fui uma atleta universitária e agora me tornei uma atleta olímpica”.

Aline,à esquerda, e atletas do Rugby USP - Foto: Reprodução Facebook Rugby USP

O time feminino de rúgbi da USP começou em 2008 com alunas da Universidade que se reuniam para jogar por lazer. Hoje, a equipe cresceu e não é mais considerada um time universitário, pois as atletas não são apenas alunas da USP. 

O time está aberto para meninas que desejam começar a praticar o esporte. Os treinos, que estão parados por causa da pandemia, devem voltar em 2022. Para fazer parte da equipe, basta entrar em contato pelo Instagram @rugby_usp.


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.