Alunas e professoras da USP se unem contra a violência de gênero

Coletivos e organizações da Universidade recolhem dados e ampliam o diálogo com instituições de justiça

 17/08/2017 - Publicado há 7 anos
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Mesa do seminário Enfrentamento à violência de gênero: O desafio da USP realizado pelo Escritório USP Mulheres – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Tomar uma xícara de chá ou fazer sexo. Ninguém deveria passar por nenhuma das situações contra a própria vontade. A analogia é apresentada no vídeo que deu abertura ao seminário Enfrentamento à violência de gênero: O desafio da USP”, realizado no dia 10 de agosto pelo Escritório USP Mulheres.

Eva Blay – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

“Consentimento é tudo: ninguém é contra relações sexuais, mas tem que ter consentimento”, resume a professora Eva Alterman Blay, coordenadora do USP Mulheres, logo após a exibição do vídeo.

Parece óbvio, mas não é sempre assim. Por mais que os casos de violência de gênero no ambiente universitário tenham começado a ser debatidos publicamente a partir de abusos praticados em festas e trotes, as mulheres da academia estão deixando cada vez mais claro que as opressões não se limitam a esses ambientes.

No Instituto de Geociências (IGc) da USP, uma pesquisa realizada há três anos, através de caixinhas colocadas no banheiro feminino, revelou que 69% das alunas foram vítimas de assédio por parte de alunos, professores e funcionários do instituto. A iniciativa foi do Coletivo Feminista Geóloga Dinalva, que surgiu em 2014 após um grupo de alunas se reunir para fiscalizar o trote violento do curso de Geologia. 

“O nosso maior desafio é transmitir segurança para fazer com que as mulheres se sintam seguras e acolhidas para formalizar denúncias”, explicou o professor Marcos Egydio da Silva, diretor do IGc.

Ele reconhece que esse é um cenário que pode mudar a partir das atitudes de alunas e da Comissão de Ética que está sendo formada na unidade —  isto é, se contarem com respaldo da Universidade.

Isabela Gualtieri – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Também no campus da capital, 75% das alunas do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP relataram já ter passado por alguma situação machista no curso. O dado é de 2015 e foi gerado por meio de relatos anônimos colhidos pelo Núcleo Feminista de Relações Internacionais.

“Dentro do IRI, essa pesquisa foi um divisor de águas e acabamos por ter respostas do instituto”, lembra a aluna Isabela Gualtieri, representante do núcleo.

Nos últimos anos, não apenas alunas, mas professoras e funcionárias da Universidade têm se organizado para combater as diversas formas de opressão que as mulheres sofrem nos campi.

Uma delas é a professora Sonia Seger Pereira Mercedes, que atua como pesquisadora no Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP:

“É difícil admitir que esses fatos ocorram num ambiente que é de excelência intelectual. Sempre há uma justificativa muito bem construída para disfarçar e esconder os casos de violência”.

A professora está engajada com a Rede Não Cala, que reúne professoras e pesquisadoras pelo fim da violência sexual e de gênero na USP.

Maria Gabriela – Foto: Marcos Santos / USP Imagens

O encontro, que ocorreu no último dia 10, também celebrou o décimo primeiro aniversário da Lei Maria da Penha, que assegura a proteção da mulher e de seus filhos para impedir a continuação de situações de violência doméstica e familiar, mas também se refere a todos os tipos de violência por questões de gênero, como explicou a promotora do Ministério Público de São Paulo, Maria Gabriela Prado Manssur. Isso inclui crimes como estupro, assédio sexual, assédio moral e desqualificação intelectual.

A presença da promotora somou-se à da juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo, Kenarik Boujikian, que trouxe uma coleção de cartazes de festas universitárias em que a plateia pôde identificar aspectos como a objetificação do corpo da mulher. Ambas lembraram da importância de um Estado aberto a acolher e proteger as mulheres vítimas de opressões.

“O patriarcado está presente na universidade, na nossa casa, no nosso trabalho e na justiça”, disse Kenarik.

Canais de denúncia

A USP não é polícia, nem faz parte do sistema judiciário e, dessa maneira, não pode prender nem processar judicialmente uma pessoa. Contudo, nos casos de denúncia, a diretoria de cada unidade de ensino tem autonomia e até mesmo o dever de abrir uma sindicância que, por sua vez, pode se transformar em um processo interno disciplinar ou administrativo.

Kenarik Boujikian – Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Se você foi vítima de violência sexual em algum dos campi da USP, deve fazer uma denúncia formal à Ouvidoria Geral e à direção da unidade na qual estuda ou trabalha. Fora da Universidade, deve-se procurar a polícia. Em caso de estupro, além das providências anteriores, é recomendável passar por um exame clínico em hospital.

Se necessário, a Ouvidoria Geral poderá encontrar quem a acompanhe à delegacia e ao hospital. A Ouvidoria também comunica a Superintendência de Prevenção e Proteção Universitária e encaminha a denúncia à unidade recomendando abertura de sindicância, quando o(a) perpetrador(a) é conhecido(a) e pertence à USP.

Você também pode procurar o Núcleo de Atendimento a Vítimas de Violência Sexual (Navis) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), um serviço organizado por professores da Faculdade que oferece assistência a vítimas de violência sexual.

Além disso, o Escritório USP Mulheres se disponibiliza para receber denúncias e contatar a Comissão de Direitos Humanos da sua unidade (ou a diretoria, caso não haja comissão), além de mediar e acompanhar os desdobramentos necessários. Lembrando que o governo federal disponibiliza o Disque-Denúncia 180 (Central de Atendimento à Mulher).

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