Competição de robôs desperta em crianças o interesse pela ciência

Participar da Olimpíada de Robótica promove descobertas aos pequenos e reacende sonhos em professores, pais e voluntários

 25/06/2019 - Publicado há 5 anos
As participantes mais jovens da Olimpíada de Robótica: Sarah e Valentine participaram no nível zero da competição – Foto: Denise Casatti/ICMC

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Uma tem seis anos e a outra oito. Juntas, correm pelo salão de eventos da USP, em São Carlos, conduzindo nas pequenas mãos um robô. Ao chegarem à arena de competição, a expressão no rosto das duas se transforma conforme o robô faz seu caminho e, quando o percurso termina, Sarah Palmieri e Valentine Flório Ouchi recebem, orgulhosas, os broches marcando a primeira participação na Olimpíada Brasileira de Robótica (OBR).

A trajetória do robô das garotas chega ao fim, mas é muito provável que a jornada delas pela olimpíada esteja apenas começando. Os pais as inscreveram na etapa regional da OBR em São Carlos no nível zero, que é voltado a estudantes do 1º ao 3º ano do ensino fundamental e foi criado no ano passado para favorecer o contato, cada vez mais cedo, com o mundo da robótica. Nesse caso, não há pontuação e concorrência entre equipes, todos são premiados com broches e medalhas, pois a ideia é incentivar a participação no evento nos próximos anos.

A proposta já está gerando bons resultados: a primeira equipe nível zero que participou de uma OBR no ano passado – formada por Caleb e João – voltou à competição este ano, dessa vez para competir no nível 1, que é voltado a alunos do 1º ao 8º ano do ensino fundamental. Tal como no ano passado, o técnico foi o pai deles, o desenvolvedor de software Jefferson Pereira Cezar, que inscreveu o time na categoria equipe de garagem, destinada à participação de grupos independentes, que não estão vinculados a uma escola.

“Diferente de muitos outros times, nós somos uma equipe de garagem, limitada a um espaço com área de pouco mais de 10 metros quadrados que, nos dias de sol, é quente pra chuchu e, nos dias de chuva, temos que desviar das goteiras. Mas nada disso impede que a gente se reúna todos os sábados para desenvolver alguma coisa que seja útil e divertida”, explica o torneiro mecânico Carlos Renato da Silva. Ele criou o clube de ciências O Mundo das Invenções, em Batatais, no interior de São Paulo, e formou uma equipe que participou da OBR este ano pela primeira vez também na categoria equipe de garagem. Fazem parte do time o filho de Carlos – José Renato Pereira da Silva, 11 anos – e mais três amigos: Henrique Ferreira de Carvalho e Heitor Silva Santana, ambos com 11 anos, e Matheus Henrique Ferrão, 12 anos.

Eles explicam entusiasmados todos os componentes que usaram para construir Simprão, nome que deram ao robô porque ele é simples, mas nem tanto: resultado de um ano de muito trabalho e de aprimoramentos em versões desenvolvidas anteriormente.

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Equipe Mundo das Invenções e o robô Simprão – Foto: Denise Casatti / ICMC-USP

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Uma nova cultura desperta

Adam Moreira é voluntário da OBR desde a primeira edição da etapa regional em São Carlos, em 2014. Naquele ano, 99 equipes de escolas públicas e privadas da região se inscreveram na competição e 70 compareceram ao evento. Ele diz que a realização da etapa regional da olimpíada em São Carlos contribuiu muito para o desenvolvimento de uma cultura ligada à robótica na cidade, a qual se espalhou por outros municípios do entorno. A competição se tornou, assim, uma indutora da cultura robótica nas escolas de ensino básico da região.

“Em 2014, quem participava da competição tinha muito pouco conhecimento sobre robótica, não questionava os juízes e não argumentava. Agora, o nível de conhecimento das crianças e jovens é muito maior: eles querem saber tudo, perguntam detalhes técnicos sobre as provas e sabem explicar conceitos muito mais complexos”, conta a professora Roseli Romero, do ICMC, que coordena a etapa regional da OBR em São Carlos desde 2014.
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Participante colocando os marcadores estrategicamente na arena – Foto: Denise Casatti/ICMC-USP

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Aprendendo novas estratégias

Repleto de post-its coloridos e frases destacadas com canetas marca-texto fluorescentes amarelas, verdes, laranjas, rosas e azuis, o manual de regras e instruções que Sara Casatti, de 11 anos, levou à etapa regional da competição em São Carlos é um exemplo do quanto as crianças se esforçam para obter bons resultados. Segundo ela, a conquista do primeiro lugar no nível 1 da competição no domingo, dia 16 de junho, só foi possível por causa da estratégia adotada pela equipe. “Um robô nunca é perfeito. Então, você precisa conhecer no que ele é bom e no que ele é ruim. Assim, você pode pensar nos locais mais estratégicos para colocar os marcadores ao longo da pista”, ensina.

O robô pode tentar superar um desafio três vezes – como passar por um ponto em que a pista desaparece ou em que há um redutor de velocidade. Se ele não conseguir, pode desistir e continuar andando na pista a partir do ponto em que a equipe colocou a marcação. Cada desafio ultrapassado rende pontos e, ao transpor o local onde a marcação foi colocada, o time ganha 60 pontos automaticamente.

Então, a equipe de Sara chegava à arena sorteada para competir alguns minutos antes de entrarem em campo. Discutiam juntos onde deveriam colocar os marcadores a fim de maximizar o ganho de pontos. Como o robô já estava programado para identificar a linha a ser percorrida, bem como ultrapassar falhas e outros desafios, o grupo optava por inserir os marcadores logo depois de obstáculos que o robô não havia sido programado para superar. Assim, se conseguisse ultrapassar esses pontos críticos, o time ganharia automaticamente 60 pontos. Por outro lado, se não fosse capaz de superá-los, após três tentativas, o grupo podia tocar no robô e colocá-lo depois do obstáculo, no local indicado pelo marcador, de onde era possível continuar a trajetória.

Fiquei pensando em quanto a estratégia usada pela equipe de Sara estava relacionada com os mecanismos que usamos para ensinar nossos filhos. Eles também não são perfeitos, têm habilidades e limitações como qualquer outro ser humano. Se a gente os estimula a enfrentar novos desafios, eles podem seguir adiante na vida e ganhar muitos novos conhecimentos. Mas não adianta insistir para que ultrapassem obstáculos maiores do que aqueles que são capazes de superar. Se notarmos um grau elevado de dificuldade, podemos pegá-los nas mãos e levá-los até a próxima fase da jornada. De lá, eles prosseguirão pela estrada da vida e vão enfrentar novos desafios. Conhecendo-os bem, seremos capazes de dar as mãos a eles, caso precisem de um apoio para seguir adiante. Está aqui mais um exemplo do quanto a robótica pode despertar em nós novos conhecimentos: ser uma melhor educadora é só um deles.

Adaptado de Denise Casatti, da Assessoria de Comunicação do ICMC – Leia o texto original


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