Nesta edição de sua coluna, o professor Glauco Arbix olha para os lados da Rússia, imersa numa guerra contra a Ucrânia, para focar seu comentário na pesquisa científica produzida por aquele país. O colunista diz que Vladimir Putin reduziu aquilo que foi uma pujante ciência russa a um investimento muito semelhante ao do Brasil, um pouco mais de 1% do PIB, “que mudou muito nos últimos anos, mas em especial mudou após a eclosão da guerra da Ucrânia. Por seu posicionamento contra a guerra, muitos cientistas foram obrigados a deixar a Rússia, projetos de cooperação com dezenas de países foram interrompidos, laboratórios degradados – na parte civil, bem entendido”.
Arbix conta que a revista Science trouxe um mapa dessa degradação e uma sequência de depoimentos de cientistas que, ainda na Rússia, mas protegidos pelo anonimato, relataram a censura e a vigilância sobre as universidades e as pesquisas. São físicos, economistas, sociólogos e engenheiros da Universidade de Moscou e de outros centros de pesquisa e instituições ligadas à ciência que preferiram não se identificar por conta das perseguições. “Muitos cientistas que permanecem na Rússia, que falaram na condição de anonimato, falaram como vivem amordaçados. A revista Science perguntou por que eles decidiram ficar e a resposta apontada foi ‘olha, nós vamos ficar porque nós precisamos educar a jovem geração. Nós não podemos deixar essa geração ao deus-dará, solta pela Rússia, nas mãos do próprio governo’.”
Manifestações contra a guerra, embora pequenas e cerceadas pelo sentimento de medo, ainda se multiplicam nas universidades. “Uma carta aberta com mais de 4 mil cientistas contra a guerra foi duramente reprimida, com milhares de pesquisadores e estudantes presos. Dirigentes da Academia Russa de Ciências condenaram aqueles que assinavam a carta, que afirmavam a forte oposição à guerra e apontavam as responsabilidades do governo russo. Essa resistência é um exemplo para quem acha que a ciência é neutra e nada tem a ver com a política. Os cientistas não vivem em ‘torres de marfim’, eles precisam de liberdade de pensar, precisam da troca de conhecimento que não sobrevive, prisioneira das fronteiras entre países, e para isso evidentemente o primeiro passo é ter respeito pelos outros, pelos países, pela autodeterminação dos povos.” Ele conclui: “Seria oportuno que, no G20, a ciência brasileira se manifestasse contra a guerra da Ucrânia e repetisse a exclamação dos cientistas russos gravada na carta aberta: ‘Vamos fazer ciência e não a guerra!'”.
Observatório da Inovação
A coluna Observatório da Inovação, com o professor Glauco Arbix, vai ao ar quinzenalmente, terça-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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