Prática do chamado sexo químico acarreta riscos para a saúde e tem potencial para aumentar DSTs

Maurício Yonamine discorre sobre os perigos do “chemsex”, que é o uso de drogas para aumentar a sensação de prazer durante o ato sexual

 Publicado: 01/10/2024 às 10:50
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Imagem de cápsulas e comprimidos de vários tamanhos e cores, numa profusão de drogas
Apesar dos problemas do sexo químico já terem sido divulgados, a prática continua crescendo no Brasil – Foto: topntp26/Freepik
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Chemsex (sexo químico) é um termo utilizado para descrever o uso de substâncias psicoativas durante o ato sexual, com o intuito de desinibir ou aumentar a percepção de prazer. A prática já é antiga, o termo chemsex foi cunhado por David Stuart e alguns amigos, em Londres, em meados dos anos 2000. É mais comumente entendido como o uso de qualquer combinação de drogas que inclua metanfetamina, mefedrona e/ou GHB/GBL, usado antes ou durante o sexo. Essas substâncias proporcionam efeitos singulares de duração, apetite e desinibição sexual, diferentes dos efeitos do álcool, ketamina, cocaína e mesmo do poppers ou sildenafil (Viagra), que são consideradas  “adicionais” no chemsex. Esse tipo de comportamento explodiu na Europa há mais de dez anos e agora especialistas vêm observando um crescimento também no Brasil, especialmente após a pandemia de covid-19.

Apesar de os problemas do sexo químico já terem sido divulgados, a prática continua crescendo no Brasil. Sobre esse assunto, o professor Maurício Yonamine, do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo fala o seguinte: “Embora no Brasil não haja muitos estudos sobre a prática do chemsex, sabe-se que uma das principais drogas utilizadas nesse contexto é a metanfetamina, conhecida popularmente nesse meio como tina. A metanfetamina é um estimulante do sistema nervoso central, aumentando no cérebro os níveis de dopamina, serotonina e noradrenalina, substâncias relacionadas com o aumento do estado de alerta, euforia, sensação de bem-estar e autoconfiança”, afirma Maurício Yonamine.

Ação das substâncias químicas no corpo

As anfetaminas, que são estimulantes do sistema nervoso central, podem ter efeitos complexos sobre a sexualidade. Elas podem aumentar a energia e a euforia, o que pode levar a um aumento na libido para algumas pessoas. Contudo, o uso de anfetaminas também pode causar efeitos colaterais indesejados, como ansiedade, insônia e até disfunção sexual em doses mais altas ou com o uso prolongado. O pesquisador ainda fala mais sobre as diferentes substâncias utilizadas no ato sexual e suas similaridades.

Maurício Yonamine – Foto: Reprodução YouTube

“De acordo com estudos realizados em outros países, além da metanfetamina, outras drogas como a cocaína, o GHB e catinonas sintéticas, principalmente a mefedrona e até a MDMA, metileno de oxi metanfetamina – encontrada em comprimidos de êxtase – têm sido utilizadas nesse contexto do chemsex. São todas drogas que agem no sítio de recompensa do cérebro, ou seja, agem em dopamina, em maior ou menor grau e duração. Acredito que os usuários escolham a droga baseada nas suas próprias experiências, naquela que é mais disponível e que proporciona os efeitos esperados pelo usuário”, discorre o professor.

Ingerir álcool junto com drogas utilizadas no contexto sexual podem agravar ainda mais a situação do sexo químico. Um estudo brasileiro demonstrou uma forte associação entre o uso excessivo do álcool junto a outras substâncias. Como o álcool é uma droga legal, os riscos desse tipo de entorpecente é minimizado pela sociedade, no entanto, o uso de álcool também implica diversos riscos.

Problema de saúde pública?

É fato que o uso de entorpecentes durante o sexo é capaz de expandir o risco de doenças sexualmente transmissíveis se espalharem. O professor do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo comenta: “Ao mesmo tempo que a metanfetamina aumenta a sensação de prazer, ela também causa um sentimento de onipotência, de grandiosidade, de tal forma que o indivíduo se acha invencível e que nada poderá afetá-lo enquanto ele estiver sob efeito dessa droga. Sob esse estado mental alterado, o indivíduo não pondera riscos, assim aumenta muito a probabilidade de praticar sexo sem proteção e, consequentemente, a chance de transmissão de doenças infecciosas, como a sífilis, a gonorreia e a aids”, discorre.

Visto que os produtos ilícitos utilizados para a prática não são regulados na maioria dos países, o impacto na saúde e os riscos associados podem ser extremamente sérios. De maneira farmacológica, os nitratos de alquila podem interagir com outras drogas, como substâncias vasodilatadoras (tadalafila), usualmente utilizadas no sexo químico. A junção dessas drogas pode causar um aumento da pressão sanguínea, o que aumenta as possibilidades de um derrame ou até mesmo de um ataque cardíaco.

“As combinações entre diferentes estimulantes e outras substâncias psicoativas como a metanfetamina e cocaína, cocaína e mefedrona, metanfetamina com GHB, tudo isso muitas vezes regado a doses de bebida alcoólica, aumentam muito o risco de overdoses entre os adeptos do chemsex. Dentre os sintomas dessa intoxicação estão taquicardia, arritmias, aumento da pressão arterial, dor torácica, hipertermia, danos renais e convulsões, podendo ainda progredir para eventos fatais. Portanto, a prática do chemsex, de buscar o máximo prazer a qualquer custo, é um comportamento bastante arriscado, de tal forma que no final o preço disso tudo pode ser a própria vida”, explica Yonamine.

O professor ainda acrescenta: “Estudos têm demonstrado que a prática do chemsex pode induzir a transtornos psiquiátricos e levar a problemas familiares, profissionais e sociais. A probabilidade de dependência química aumenta à medida que alguns usuários só conseguem manter relações sexuais se estiverem sob o efeito de algumas drogas. O uso prolongado dessas drogas pode resultar em psicose, caracterizada por ideias persecutórias e delírios. Além disso, alguns usuários podem experimentar depressão prolongada e ainda ocorrência de ideias suicidas”, conclui.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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