Mulheres pagam mais juros do que homens na hora de solicitarem crédito

Segundo Leandro Maciel, sistema automatizado dos bancos carrega marcas do passado para fazer análises no presente, prejudicando as mulheres

 Publicado: 01/10/2024 às 11:02

Texto: Redação

Arte: Beatriz Haddad*

Se as mulheres têm menos histórico, em geral, as instituições acabam não conseguindo inferir qual é o principal risco desses agentes e acabam por conceder menos crédito a elas – Foto:
CoWomen/Unsplash
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Segundo dados do Banco Central, as mulheres pagam mais juros que os homens ao solicitarem crédito para o próprio negócio. A taxa média de juros foi de 36,8% ao ano; já para o público feminino foi de 40,6%. Só no Estado de São Paulo há 2,44 milhões de empreendedoras, conforme o levantamento do Sebrae, as quais acabam sendo prejudicadas por conta de características históricas, mas que não são necessariamente verdadeiras.

Leandro Maciel, da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP, explica que a análise de crédito hoje em dia é automatizada: “Você tem um número muito elevado de solicitações de concessão de crédito. Como você tem que processar muitos pedidos, esse tipo de processamento acaba sendo automatizado no sentido de que a decisão de concessão e o custo do crédito vai ser determinado por modelos que recebem as informações, processam essas informações e a partir disso tomam essa decisão”.

Leandro Maciel - Foto: FEA/USP

Problemas históricos

O problema disso é que o sistema foi alimentado com um histórico enviesado da condição das mulheres. Com elas historicamente ganhando menos do que os homens, isso acaba por entrar no cálculo de risco: “A menor renda afeta a capacidade de pagamento de dívida, fazendo com que as instituições que concedem empréstimos as considerem como agentes de maior risco e, portanto, acabam cobrando juros mais altos e muitas vezes não concedendo crédito”, explica o professor.

Quando as mulheres tinham muito menos acesso ao crédito, e portanto menos confiabilidade de serem boas pagadoras, os juros para elas costumavam ser mais altos. “Viemos de uma condição estrutural dos homens tradicionalmente gerenciarem as finanças familiares. Se as mulheres têm menos histórico, em geral as instituições acabam não conseguindo inferir qual é o principal risco desses agentes e aí acabam por conceder menos crédito às mulheres.”

Marcas do passado

Hoje, no entanto, a situação não se mantém, ou ao menos em uma proporção bem menor. Já o mesmo não vale para o sistema automatizado das instituições financeiras, que ao transpor análises antigas, acaba fazendo avaliações “sem ter a sensibilidade de perceber que o mundo mudou, que as mulheres estão mais ativas, que a renda delas aumentou, que elas estão cada vez mais inseridas no mercado formal de trabalho”, conta Maciel.

Por conta desse problema, pesquisadores já estão começando a pensar um uso mais responsável da máquina. A intenção é se beneficiar da agilidade e capacidade de processamento que ela oferece, mas sem com isso repetir padrões antiquados de análises. “A discussão é de você não só fornecer essa informação histórica para os modelos, mas ao mesmo tempo indicar uma nova estrutura de processamento dessas informações visando a atingir outros tipos de análise e tentar remover esses vieses comportamentais que causam a discriminação do ponto de vista da concessão de crédito, ou seja, incorporar nesses dados históricos a mudança estrutural que não é intuitiva para o modelo perceber.”

Além de ocuparem mais cargos executivos e de poder, algumas pesquisas indicam que as mulheres CEO tendem a tomar riscos mais conscientes, sendo então até mais confiáveis para se emprestar dinheiro. Na prática, no entanto, o que as avaliações de crédito continuam a reproduzir é que esse público teria um risco maior por conta de um reflexo de um passado antiquado.

*Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado


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