
A Amazônia, maior floresta tropical e dona da maior biodiversidade do mundo, abrange nove países e abriga a maior bacia hidrográfica do mundo. Por tais motivos, a floresta amazônica é alvo de ameaças e ambições financeiras, sendo centro de um grande mercado de terras, por exemplo. Segundo Francisco de Assis Costa, pesquisador do Centro de Pesquisas em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP e do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA (Universidade Federal do Pará), esse mercado é advindo de um processo de dinâmica fundiária acumulatório e ilegal.

As florestas, que inicialmente eram públicas, são apropriadas privadamente e rapidamente inseridas em um mercado financeiro, transformando-se em mercadoria específica e, de acordo com Costa, esse processo reforça desigualdades e má distribuição. “Ele permite que se aproprie terras em volumes muito grandes, criando um nível de concentração na região, que é maior do que o nível de concentração do País; na verdade, fazendo com que a desigualdade se projete nas diversas formas de apropriação de recursos públicos e recursos de controle privado também”, explica.
E, como um país marcado pela concentração de terras, a situação agroambiental brasileira projeta-se também na desigualdade de renda e condições de vida. Além disso, o pesquisador também ressalta que tal processo de apropriação de terras é, em sua maioria, realizado de maneira ilegal, apropriando-se acima de 2.600 hectares, número permitido pela legislação brasileira. “São os grandes proprietários, ou aqueles agentes com grande poder econômico, que se apropriam de grandes parcelas de terras, e o fazem dominantemente de modo ilegal.”
Privatização de terras
Ainda de acordo com Costa, entre 2006 e 2017, 21 milhões de hectares foram transferidos de florestas públicas para privadas, ou seja, conjuntos acima de 2.500 hectares, logo, provavelmente ilegítimos. E o processo de privatização de terras não inclui a preservação da mata, mas sim seu aproveitamento e mercantilização, o que direciona ao impacto definido pelo professor como uma grande perda. “Desse total de 21 milhões de hectares, em torno de 13 milhões foram desmatados naquele período, ou seja, entre 2006 e 2017, o que daria em torno de um pouco acima de 1 milhão de hectares por ano, 1,1 milhão de hectares por ano”, detalha Costa.
Dessa maneira, para a preservação da biodiversidade, ameaçada por tal processo de concentração ambiental, a regularização justa de distribuição de terras e devida fiscalização governamental são fatores essenciais para o controle. Para o pesquisador, a relutância em resolver tal problema é originária de uma “cegueira institucional”, além de uma profunda falta de infraestrutura.
“Há uma incapacidade, uma espécie de cegueira institucional, em divisar o que é legal do que é ilegal. Ou seja, as agências fundiárias dos Estados, mesmo as agências fundiárias do Incra e o Ibama, as agências fundiárias federais, não têm aparato ou infraestrutura que permitam checar cada movimento do mercado, a cada transação, a cada título que é posto como garantia num empréstimo, a cada compra e venda que ocorra, até estar de modo rápido, imediato, barato, a legitimidade da cadeia dominial, quer dizer, a legitimidade do processo de aquisição das terras. Não se tem a infraestrutura para fazer isso.”
Para Costa a resolução é mais do que urgente, considerando o atual aspecto de desmatamento na floresta amazônica. “O futuro dos processos de desmatamento, dos processos de impacto importantes e fundamentais para os equilíbrios ambientais estão sob controle dessa lógica e dessa estrutura, quase 60% da Amazônia está sob controle da grande propriedade.”
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