Marco Civil da internet: tendência é estabelecer critérios visando a mais transparência

Juliano Maranhão comenta ações que discutem a responsabilização das plataformas sobre a publicação de conteúdo ilícito e ofensivo nas redes sociais

 04/12/2024 - Publicado há 1 mês
Imagem estilizada de um computador diante de uma espécie de mural em que aparecem centenas de fotos, representando a diversidade de coisas presentes na internet
A discussão sobre a responsabilidade das plataformas não possui apenas caráter nacional, como também internacional – Foto: Gerd Altmann / Pixabay
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Durante as últimas semanas, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem julgado um conjunto de quatro ações que questionam pontos específicos do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), importante legislação de caráter nacional e internacional, que regulamenta a responsabilidade civil das plataformas sobre os conteúdos publicados por terceiros em redes sociais. Para o professor Juliano Maranhão, da Faculdade de Direito (FD) da USP, o artigo 19 representa segurança às plataformas, que se tornam responsabilizadas pela exclusão de conteúdos ilícitos apenas após decisão judicial.

“O apelido do artigo 19 do Marco Civil da internet é o Safe Harbor, um porto seguro para os intermediários na internet, porque eles só são responsabilizados por conteúdo de terceiros em função de descumprimento de ordem judicial para remoção de conteúdo. Então é importante ficar claro também que isso não impede as plataformas de removerem aqueles conteúdos que forem incompatíveis com seus termos de uso”, diz.

Panorama internacional

E a discussão sobre a responsabilidade das plataformas não possui apenas caráter nacional, como também internacional. De acordo com Maranhão, o continente europeu encontra-se um pouco mais avançado no assunto, apresentando mudanças na legislação e consolidando uma vigilância mais rígida. “Na Europa, essa discussão avançou muito. Apareceu primeiro na legislação alemã, em 2016, em que é trazida uma responsabilidade das plataformas, independentemente de ordem judicial, uma responsabilidade pela moderação do conteúdo abusivo, na verdade, pela moderação de conteúdo que possa ser considerado ilícito, que ofenda a legislação alemã.”

Homem branco, jovem, cabelos castanhos, de terno escuro e camisa clara
Juliano Maranhão – Foto: IEA USP

O professor ainda acrescenta que essa legislação alemã originou o Digital Services Act, pacote legislativo da comunidade europeia que regulamenta as regras de transparência e moderação de conteúdo para as plataformas. Entretanto, países como o Brasil, sob grande influência norte-americana, e Estados Unidos permanecem sob a perspectiva de Safe Harbor, na qual as plataformas não possuem responsabilidade sobre o conteúdo ilícito em suas redes. “Nos Estados Unidos continua valendo o Safe Harbor, assim como a regra que persiste no Brasil, onde o Marco Civil foi bastante influenciado pela abordagem norte-americana”, complementa.

O que pode ser decidido?

Segundo o professor, duas grandes questões estão em jogo com a possível decisão do STF: a proteção à liberdade de expressão, quando relacionado aos direitos de expressão do usuário, e proteção da personalidade e valor democrático, pelo dever em seguir a legislação nacional, defendendo valores sociais. “De um lado, está a proteção da liberdade de expressão e, do lado de lá, a proteção da personalidade e outros valores, como o valor democrático, que é, então, contraposto nessa possibilidade de que discursos possam ofender a honra, a personalidade e possam atentar contra a democracia”, explica.

Tendências

Frente à resistência das plataformas sob o argumento de não serem instituições estatais, logo não precisam seguir tal regulamentação, Maranhão acredita que o STF atenuará a decisão, especificando parâmetros para a atuação das plataformas. “De uma certa forma, trarão parâmetros ao artigo 19, ou seja, não um tudo ou nada, se elas são responsáveis ou não são responsáveis, mas tentar modular o artigo 19 no sentido de colocar parâmetros na linha daquela que é a legislação europeia, no sentido de transparência ou no sentido de adoção do chamado Notice and Takedown (Notar e Derrubar), em que elas poderiam ser responsabilizadas caso haja uma notificação de um usuário ofendido.”

A ação, entretanto, exigirá a cooperação de todas as partes envolvidas, tanto dos usuários na ponderação das denúncias quanto das plataformas para se organizarem e definirem estratégias de análise. “Isso vai exigir toda uma estrutura para avaliação e também com o devido processo, para que notificações como essa possam levar, por outro lado, a uma participação daquele que postou o conteúdo, dependendo da sua liberdade de expressão. Seria uma espécie de processo ali no campo digital, conduzido pelas plataformas.”


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