Líder deposta de Mianmar está provando do próprio veneno

Marília Fiorillo diz que Aung San Suu Kyi enfrenta um julgamento que pode lhe render mais de cem anos de prisão como consequência de sua aliança com os militares, que agora detêm o poder em Mianmar

 29/10/2021 - Publicado há 2 anos

Aung San Suu Kyi, líder deposta de Mianmar, está pagando um alto preço pelas concessões que fez durante décadas aos militares, justamente ela, que enfrentou anos de prisão domiciliar, já foi prêmio Nobel da Paz e continua muito popular no país, apesar de ter se tornado cúmplice da limpeza étnica da minoria muçulmana dos rohingya em nome da aliança com os militares. Na oportunidade, ela foi muito criticada por fechar os olhos à matança e exílio de milhares de muçulmanos. “Buscar alianças com adversários é louvável”, diz Marília, “aliás, é a essência da política, mas a prudência recomenda observar bem com quem e sob quais condições vale a pena se aliar”.

O fato é que a ex-líder de Mianmar enfrenta nesta semana um julgamento a portas fechadas, inviolável, que pode lhe valer 102 anos de prisão, sob acusação de incitar a revolta que tomou conta do país após o golpe militar que dissolveu o Parlamento eleito, em novembro, e anulou os resultados. Seguiram-se protestos massivos e pacíficos, mas recebidos com uma repressão brutal, cujo saldo foi o de milhares de mortes e prisões aleatórias e arbitrárias. Suu Kyi não estava à frente das manifestações, “mas, por incrível que pareça, está sendo julgada pela própria existência e popularidade”. Aos 76 anos, é provável que seja condenada, já que o Judiciário birmanês mostra-se alinhado com o regime militar.

“A situação é estapafúrdia, mas não tem nada de inédita – desde que os militares chegaram ao poder, há décadas, ilegalidade, arbitrariedade e truculência imperam. Suu Kyi sabe disso melhor do que ninguém. Talvez seja o momento de seu partido e apoiadores repensarem o quanto algumas alianças são suicidas, pois, em vez de gerarem consenso, exigem submissão total”, conclui a colunista.


Conflito e Diálogo
A coluna Conflito e Diálogo, com a professora Marília Fiorillo, vai ao ar quinzenalmente sexta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9 ) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.

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