Falta profundidade na cobertura jornalística da guerra entre Rússia e Ucrânia

Carlos Eduardo Lins da Silva discorre sobre a unanimidade da mídia ocidental em relação ao conflito e o esquecimento de outras tensões distantes dos holofotes mundiais

 21/03/2022 - Publicado há 2 anos

A cobertura da guerra entre Rússia e Ucrânia possui diversos vieses. Carlos Eduardo Lins da Silva destaca que algumas facetas da cobertura da mídia ocidental chamam atenção: “Uma delas é o espaço e a maneira como se trata o conflito em comparação com outros que também são importantes, como, por exemplo, o do Iêmen, um país que tem sido destroçado por uma guerra civil terrível desde os anos 1990 e um país onde os Estados Unidos fazem um papel que não é nada elogiável. Desde 2015 os Estados Unidos apoiam a coalizão liderada pela Arábia Saudita no combate aos rebeldes houthis lá no Iêmen, com apoio logístico, com o fornecimento de combustíveis para os aviões sauditas, com inteligência e, principalmente, com a venda de muitas armas, que geram negócios bastante grandes para as empresas americanas produtoras de armas”.

Em relação à cobertura dos motivos da guerra, há uma quase unanimidade. “A causa da guerra é um homem louco, que, não se sabe bem porquê, resolveu agredir uma nação indefesa, muito menos armada e que está sendo destruída, isso objetivamente pode parecer verdadeiro e talvez até seja verdadeiro”, comenta o professor, que ainda completa: “Não sei se o Putin é louco ou não é, mas ele é retratado como tal. Mas há muitas pessoas, inclusive pessoas do Ocidente, que acreditam que o que ele tem feito é produto de provocações que podem colocar em risco a segurança do seu país, por exemplo, a edição desta semana da revista The Economist tem um artigo de um professor de ciência política da Universidade de Chicago, chamado John Mearsheimer, segundo o qual a expansão irresponsável da Otan provocou a Rússia e que de fato há motivos para Putin se sentir ameaçado.

Lins da Silva aponta para a necessidade de uma abordagem mais profunda: “Eu não sei até que ponto há razão dessa suspeita que se atribui às intenções da Otan, mas o que me chama atenção é que esses pontos rarissimamente são colocados na cobertura do conflito atual pela maior parte dos jornalistas ou dos jornais e veículos informativos dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e do Brasil. Não acho que devesse haver meio a meio em espaço, mas que deveria haver um pouco mais de reflexão sobre o que pode ter provocado a Rússia ou o Putin a agirem como estão agindo, isso eu acho que seria importante para que a sociedade pudesse compreender melhor a complexidade do assunto na Ucrânia”.


Horizontes do Jornalismo
A coluna Horizontes do Jornalismo, com o professor Carlos Eduardo Lins da Silva, vai ao ar quinzenalmente, segunda-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção  da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.

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