Eficiência das políticas de diagnóstico é aliada no combate aos casos de sífilis no Brasil

Aline Zorzim explica que, quanto mais diagnósticos são feitos, mais casos da doença são notificados, razão pela qual o aumento das notificações não representa um aumento no número de casos

 19/06/2024 - Publicado há 6 meses     Atualizado: 21/06/2024 às 11:59
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Micrografia eletrônica da bactéria Treponema pallidum, causadora da sífilis – Foto: CDC/Dr. David Cox/Wikimedia Commons/Domínio Público
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Entre 2011 e 2021, a taxa de pessoas com sífilis cresceu quase nove vezes no Brasil. Já a sífilis congênita, que é quando a mãe gestante passa a doença para o filho enquanto ele está na barriga, multiplicou três vezes. Nas Américas como um todo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou que a sífilis cresceu 30% entre 2020 e 2022. Os dados, que são preocupantes e representam uma epidemia, podem ser entendidos de diferentes formas. Aline Zorzim, pesquisadora da Faculdade de Saúde Pública da USP (FSP), diz que “houve um aumento nas notificações, mas não necessariamente podemos dizer que houve um aumento dos casos”.

Aline Zorzim – Foto: Arquivo pessoal

A razão do aumento pode ser explicado pelo crescimento da testagem: quanto mais diagnósticos são feitos, mais casos são notificados. Sendo assim, não se pode afirmar que os números expressivos são necessariamente novos: “Pode ser que já existia uma grande quantidade anteriormente”, diz a pesquisadora. A pandemia, portanto, poderia estar presente há décadas, só não estava em forma de dados. Dessa perspectiva, o aumento da sífilis representa uma notícia positiva: a eficiência das políticas de diagnóstico. Aline detalha: “O Ministério da Saúde preconizou o acesso aos testes rápidos durante todo o pré-natal, então a mulher que inicia o pré-natal precisa ser testada imediatamente na primeira consulta”. O acompanhamento também é feito ao longo da gravidez, buscando garantir as menores chances de contágio uterino.

Um dado que sustenta essa hipótese é o fato de a região Sul do Brasil ser a que possui mais casos absolutos de sífilis, apesar de ser apenas a quarta com maior população. Tendo os Estados do Sul um bom nível de desenvolvimento e infraestrutura em relação ao restante do Brasil, seria contraintuitivo ser a região aquela com mais casos do País. Logo, é plausível a ideia de que o aumento se deve à maior eficiência dos diagnósticos.

Outra hipótese

Mesmo podendo significar boas notícias, o aumento de casos totais não deixa de ser preocupante: preexistente ou não, continua sendo uma epidemia. Aline comenta que, por mais que a situação tenha melhorado, poderia ser muito melhor: “É uma doença que poderia já ter sido erradicada do nosso país. Nós temos países que não apresentam mais notificações de sífilis, como Cuba. É simples o acesso”. Não existe vacina para a sífilis, mas é uma doença curável e de prevenção relativamente simples.

A propósito da prevenção, a melhor forma é usando preservativos. Segundo Mônica Bay, pesquisadora da Organização Sífilis Não, o cenário da aids impactou o da sífilis. Sendo ambas Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST), a melhora no tratamento da aids e a diminuição do temor generalizado tornaram as pessoas mais flexíveis. “As pessoas realmente esquecem como se proteger e perdem o medo quando pensamos em relações sexuais”, diz Aline.

Questão de gênero

A pesquisadora também faz questão de ressaltar que é um tema que não pode ser dissociado dos problemas de gênero. Ela conta que muitas mulheres ainda estão em um lugar de vulnerabilidade nas relações. As implicações disso são, por exemplo, que muitas se sujeitam a sexo sem proteção, ou que os homens diminuem as preocupações sobre isso.

Outro ponto essencial é a recontaminação. Aline afirma que esse é o ‘calcanhar de Aquiles’ da situação. “Os dados apontam que os parceiros não são tratados, não aderem ao tratamento. Então, enquanto não houver essa adesão, o ciclo da doença não se encerra, a mulher sempre estará se recontaminando.” Ela atribui isso ao estigma do homem não poder estar doente, de ser forte e de nunca precisar ser tratado.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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