O professor Renato Janine Ribeiro dá continuidade à sua coluna anterior sobre a relação entre a política norte-americana e a eleição de Donald Trump para um segundo mandato, ligando algumas questões à filosofia política. Desta vez, faz um paralelo com a ascensão ao trono da Inglaterra, no século 17, do rei Jaime, da dinastia Stuart, filho de Maria Stuart, rainha da Escócia. Ocorre que esse rei, apesar de inteligente e culto, carecia de bom senso, a ponto de considerar que, uma vez instalado no trono, pairava acima das leis. “Porque, na Inglaterra, o rei tinha muito poder e era a principal figura do poder, como na maior parte dos países que eram monarquias, mas havia algo importante, que é o rei no Parlamento. O rei no Parlamento era a fusão do direito do rei de vetar ou assinar as leis e da necessidade que o Parlamento, pelas duas Câmaras, Câmara dos Comuns e Câmara dos Lordes, votasse e aprovasse essas leis. Então as decisões do rei no Parlamento, ou seja, do rei somado ao Parlamento, eram mais importantes, eram superiores, às decisões do rei sozinho […] tudo isso cria toda uma situação que vai acabar na guerra civil uns 30, 40 anos depois, e com a execução do filho dele, Carlos I, que era tão idiota quanto o pai. Desculpem a expressão tão clara, mas a dinastia Stuart era muito carente de bom senso, foi talvez a pior dinastia de toda a história inglesa.”
E aqui então se chega a Donald Trump e à eleição deste para a presidência da maior potência do planeta. “Um pouco antes dele ser eleito de novo, a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que o presidente está imune de processo por várias coisas, inclusive pelos crimes que Trump cometeu quando do seu primeiro mandato, e essa decisão é totalmente absurda, sob qualquer ponto de vista democrático, e não faz sentido. Então ela lembra algo que no direito inglês foi abolido, contestado severamente há mais de 400 anos, é muito espantoso que isso volte à cena, e é muito preocupante, porque isso indica uma disposição a colocar a Constituição, as regras todas de cabeça para baixo, e não por acaso isso foi feito porque Trump conseguiu nomear vários ministros da Corte Suprema; lá eles são vitalícios, como aqui, mas não têm idade de aposentadoria, podem ficar lá até morrer, até 90 anos, 100 anos, se tiverem, e, enfim, com isso nós estamos com risco muito grande de algo que um bom nome para chamar é despotismo, não é mais democracia. Então esse é o caminho que os Estados Unidos estão correndo o risco de trilhar agora, a partir da posse de Trump pelo segundo mandato”, conclui o colunista.
Ética e Política
A coluna Ética e Política, com o professor Renato Janine Ribeiro, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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