A humanidade precisa repensar sua forma de existir no mundo

Extração de recursos, desigualdade e destruição exagerada são caminhos que a humanidade traça para sua própria crise, considera Ricardo Abramovay

 16/08/2024 - Publicado há 4 meses     Atualizado: 19/08/2024 às 11:18
Imagem mostra uma mão segurando uma muda de planta ao lado da qual encontra-se uma lâmpada fincada no solo e em cujo interior podem ser vistas outras mudas de plantas
As previsões científicas mais pessimistas têm se comprovado, com o mundo já batendo a marca de 1,5° e com uma perda de biodiversidade irrecuperável – Fotomontagem Jornal da USP feita com imagens de Freepik e Freepik
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A 3ª edição do USP Pensa Brasil 2024, cuja temática é COP 30: Desafios Para o Brasil, terá seu quinto e último dia de evento nesta sexta-feira (16). O tema de debate que encerra o evento é Existe um Desenvolvimento Verde? e contará com a participação de figuras como Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental, Bia Saiz, presidente da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica, Joênia Wapichana, representante de povos indígenas, Jéssica Maes, repórter de Meio-Ambiente da Folha de S.Paulo, e Ricardo Abramovay, da Cátedra Josué de Castro da Faculdade de Saúde Pública da USP e do Instituto de Energia e Ambiente.

Este também comenta o tema de antemão, aquecendo o debate que será realizado às 19h na Biblioteca Brasiliana da USP. Abramovay diz que vivemos uma “tríplice crise planetária”,  referindo-se a um problema sério e multifacetado que afeta o clima, a biodiversidade e a poluição. Sobre como lidamos com a nossa existência neste mundo, ele diz que “nós vamos ter que repensar tudo”.

Distopia em vista

Ricardo Abramovay – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Em consonância com o que vem sendo debatido nos seminários do USP Pensa Brasil, Abramovay acha que a situação que o mundo se encontra é de calamidade e de consequências potencialmente catastróficas. As previsões científicas mais pessimistas têm se comprovado, com o mundo já batendo a marca de 1,5° e com uma perda de biodiversidade irrecuperável. Para acrescentar à discussão, o professor pretende trazer para a conversa desta sexta-feira um relatório do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas.

O relatório estuda como a humanidade usa os materiais dos quais depende a vida social (a biomassa, os minerais metálicos e não-metálicos, combustíveis fósseis, areia, argila, etc.). Ele aponta que a humanidade extraía da natureza 30 bilhões de toneladas desses materiais ao ano em 1970; hoje, se extrai 106 bilhões. “Isso significa que, em 1970, a humanidade usava, per capita, cerca de oito toneladas. Hoje, isso passou para algo em torno de 13 toneladas.” Ou seja, as pessoas de 2024 retiram da Terra 62% mais materiais do que as de 50 anos atrás.

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Mas seria um engano pensar que responsabilidade é dividida igualmente – afinal, os recursos não o são. Nos países de renda muito baixa, na Índia, na África Sub-Saariana, por exemplo, a média per capita é de quatro toneladas do uso desses materiais. Nos países de renda média, Brasil, China é de 19 toneladas. E nos países mais ricos do mundo é de 25 toneladas per capita. “Então, tem não só um problema ambiental, mas a ele está vinculado o problema básico das desigualdades, que é quanto dos recursos ecossistêmicos está indo para cada categoria social da humanidade”, afirma o professor.

Segundo ele, esses dados apontam para dois vetores alarmantes ao mesmo tempo: o exagero óbvio de extração e exploração terrestre e como os benefícios são injustamente divididos, mas os prejuízos compartilhados. “Nós vemos uma desigualdade gritante, cujo resultado é que as Nações Unidas preconizam não só desacoplar o crescimento econômico do uso de materiais, mas usar cada vez menos materiais.” Atualmente, os países concorrem para o crescimento econômico, o que, no modelo atual, necessariamente implica destruição da natureza. O que o professor sugere é que a humanidade chegou a tal ponto que não basta querer desacelerar a extração, mas parar como um todo.

As Nações Unidas já usam o conceito de “suficiência”, que vem para substituir a “eficiência” (8:34) no uso de materiais. Ou seja, não basta retirar os recursos de uma maneira melhor, mas sim encontrar uma forma de lidar com o que é suficiente. “Para quê esses materiais estão sendo usados? É para satisfazer necessidades básicas das pessoas, para que tenhamos uma vida social melhor em alimentação, em mobilidade, em energia, ou é para satisfazer aquilo que o Mahatma Gandhi chamava quase de luxúria, ou seja, um consumo tão alto de bens e serviços que não aumentam o bem-estar da humanidade, que nos exigem repensar a própria finalidade da oferta de bens e serviços no mundo contemporâneo”, questiona Abramovay.


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