Revista USP – Número 133 – abril/maio/junho 2022

Editora: SCS/USP
Idioma: Português
Confira abaixo os artigos deste número e dos anteriores.

A Revista USP também oferece acesso livre imediato ao seu conteúdo no Portal de Revistas da USP, seguindo o princípio de proporcionar maior democratização mundial do conhecimento

bicentenário da independência:

cultura e sociedade

Dando continuidade ao Especial Bicentenário da Independência, a Revista USP publica agora “Cultura e Sociedade”. Não seria o caso, aqui, de tentar definir essas duas palavras, que ora se aproximam a ponto de por vezes se confundirem, ora se afastam no sentido, quase sempre, de se complementarem; não seria fácil nem produtivo, ainda mais quando tomadas sob o ponto de vista de uma experiência histórica única e fundamental, como a Independência brasileira, experiência esta que, sob diversos aspectos, interferiu na cultura e na sociedade brasileira.

Esse pensamento nos inspirou quando convidamos a professora Maria Arminda do Nascimento Arruda, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e atual vice-reitora da USP, para organizar o segundo número. Para nossa alegria, ela imediatamente se mostrou bastante receptiva à ideia, e nos enviou o que chamou de um “projeto de edição”. Logo percebemos que o que tínhamos em mãos era bem mais que isso; na verdade, o texto que recebemos e que consta na abertura deste dossiê já é por si só uma bela e lúcida reflexão, uma espécie, por assim dizer, de tiro de largada a toda gama de discussões que os artigos seguintes iriam desenvolver.

Como ela diz na apresentação, “não é tarefa simples construir um projeto de edição que contemple dois séculos de produção cultural, capaz de percorrer o período que medeia desde a Independência política do Brasil, em 1822, aos dias atuais”. De fato, temos de concordar, é uma tarefa das mais espinhosas, sobretudo se levarmos em conta a embolada de efemérides deste ano, para usar a expressão de Sergio Miceli em seu posfácio ao dossiê. Apesar de toda dificuldade, no entanto, como o leitor verá nas páginas seguintes, o resultado é surpreendente.

Jurandir Renovato

Apresentação

Não é tarefa simples construir um projeto de edição que contemple dois séculos de produção cultural, capaz de percorrer o período que medeia desde a Independência política do Brasil, em 1822, aos dias atuais. E isso, por inúmeros motivos, dos mais substantivos, que pressupõem pensar conceitualmente a existência de uma cultura nacional, tomada de maneira integrada, caracterizada em termos identitários, ou de modo relativo, reconhecendo as múltiplas dimensões e os variados contextos sociais a serem contemplados pelo elenco dos temas e setores da produção cultural selecionados.

Leia mais

                                                                         Maria Arminda do Nascimento Arruda

  

base_tarja_home_133

O objetivo deste artigo é rever a “lenda dourada da Independência”, que toma o final pelo começo: a saída conservadora e monárquica como se fosse um dado inevitável. Não era, e vale a pena estruturar as bases dessa interpretação muito calcada na experiência do Sudeste – em especial Rio de Janeiro e São Paulo – e na elaboração da tela de Pedro Américo, chamada Independência ou morte, que foi, na verdade, um presente de filho para pai; uma tentativa de elevar a monarquia num momento de crise e que resultaria no seu final.

Palavras-chave: Independência do Brasil; Pedro Américo; monarquia.

The objective of this article is to review the “golden legend of the independence”, which takes the ending by the beginning: the conservative and monarchical exit as an unavoidable fact. It was not, and it is worth structuring the bases of this interpretation, very much based in the experience of the Southeast – especially Rio de Janeiro and São Paulo – and in the elaboration of Pedro Américo’s painting, called Independência ou morte which was, actually, a gift from son to father; an attempt to elevate the monarchy in a moment of crisis and which would result in its end.

Keywords: Brazil’s independence; Pedro Américo; monarchy.

O ensaio recupera os laços entre arte e contexto econômico e político de São Paulo na Primeira República, mostrando uma sinergia única entre elites sociais e vanguarda artística, em combate ao soft power carioca. Essa sinergia em seguida cresce pelo trabalho crítico consagrador dos valores modernistas pela intelectualidade da USP. Analisa o caráter da vanguarda enquanto tal, sua celebração da ruptura como ideal, e comenta o fato de que a vanguarda modernista paulista alcançou o poder em poucos anos, vindo a impor uma leitura exclusiva das coisas literárias e culturais. Conclui postulando que os muitos modernismos no Brasil só serão visíveis se a lente exclusivista do Modernismo paulista for devidamente posta em questão.

Palavras-chave: Modernismo paulista; Modernismo soft power de São Paulo; o papel da USP; o paradigma da ruptura modernista; os muitos modernismos no país.

The essay retrieves the bonds between art and the economic and political context of São Paulo in the First Republic, showing a unique synergy between social elites and the artistic avant-garde, in combat against Rio’s soft power. This synergy then grows through the critical work that consecrates the modernist values by USP’s intellectuals. The work analyzes the character of the avant-garde as such, its celebration of rupture as an ideal, and comments on the fact that the São Paulo modernist avant-garde reached power within a few years, imposing an exclusive reading of literary and cultural things. It concludes by postulating that the many modernisms in Brazil will only be visible if the exclusive lens of São Paulo Modernism is duly called into question.

Keywords: São Paulo Modernism; São Paulo’s soft power Modernism; the role of USP; the paradigm of modernist rupture; the many modernisms in the country.

Tratarei de aspectos de estudos sobre um pensamento social do Brasil angulado, especificamente no século XX, por intelectuais negros e negras. São estudos sobre direitos dos sujeitos e da cidadania negra produzidos por intelectuais negras e negros, em particular no século XX, criadores de um pensamento negro sobre o país, que o interpreta naquilo que possui de iníquo e o fabula a partir da experiência social negra. A abordagem que proponho se baseia na seleção de temas comuns que uma perspectiva intelectual negra tenha enfrentado em diferentes momentos, para dar conta da experiência negra afro-brasileira. Essa experiência tem a ver com a luta por direitos civis, sociais e políticos e compõe a história da cidadania brasileira.

Palavras-chave: intelectuais negros; pensamento social brasileiro; cidadania negra; nação.

I will deal with aspects of studies on a social thought in the angled Brazil, specifically in the 20th century, by black intellectuals, both male and female. These are studies on the rights of subjects and on black citizenship produced by black intellectuals, particularly in the 20th century, creators of a black thought about the country, which interprets it in what is iniquitous and fables it from the black social experience. The approach I propose is based on the selection of common themes which a black intellectual perspective has faced at different times, to account for the black Afro-Brazilian experience. This experience has to do with the struggle for civil, social and political rights and is part of the history of Brazilian citizenship.

Keywords: black intellectuals; Brazilian social thought; black citizenship; nation.

A proposta do artigo é analisar a mobilização da intelectualidade brasileira no intuito de construir um Brasil moderno por ocasião da celebração dos cem anos da Independência (1922). Marcada pela missão de “fecundar ideias singulares”, nem por isso a “geração de 22” se furtou a buscar a modernidade através de uma integração crítica e seletiva das ideias que então circulavam na Europa. Essa integração desemboca em duas correntes de pensamento – a tradição e a vanguarda –, que disputam o papel de porta-vozes exclusivos do que deveria ser o Brasil moderno. Como resultado dessa busca por um “novo” país, examinamos o projeto intelectual que visou à desqualificação do Rio de Janeiro como “cabeça da nação”, e sua substituição por São Paulo, lócus de produção de uma nova identidade nacional.

Palavras-chave: modernidade; geração de 22; questão nacional; memória.

The paper’s purpose is to analyze the mobilization of the Brazilian intellectuals to construct a modern Brazil at the Brazil Independence’s centenary (1922). Marked by the proposal to “fertilize unique ideas” the “generation of 22” did not shy away from seeking modernity from the critical and selective integration of ideas that were circulated in Europe. This integration led to two streams of consciousness – tradition, and vanguard – that dispute the role of exclusive voices of what should be modern Brazil. As a result of this movement to search a new country, we examine the intellectual project that aimed to disqualify Rio de Janeiro as the “head of nation” in favor of São Paulo, the locus of the intellectual production of anew national identity.

Keywords: modernity; generation of 22; national question; memory.

O artigo contextualiza os processos de produção e circulação do livro Dependência e desenvolvimento na América Latina (1969), de Fernando Henrique Cardoso (1931-) e Enzo Faletto (1935-2003). Realizado em parceria pelos dois sociólogos, no interior de um espaço transnacional das ciências sociais da década de 1960, que envolvia instituições como a Cepal, o Ilpes e a Flacso, o livro teve como estribos as experiências mais bem-sucedidas de institucionalização nacional e transnacional das ciências sociais na região, as do Brasil e do Chile, e foi publicado em espanhol pela editora mexicana Siglo XXI, em boa medida responsável por seu sucesso comercial excepcional, de um best seller da sociologia latino-americana.

Palavras-chave: intelectuais; sociologia; espaço transnacional; dependência; América Latina.

The article contextualizes the processes of production and circulation of the book Dependency and Development in Latin America (1969), by Fernando Henrique Cardoso (1931-) and Enzo Faletto (1935- 2003). Produced in partnership by the two sociologists, within a transnational space of the social sciences in the 1960s, which involved institutions such as Cepal, Ilpes and Flacso, the book was based on the most successful experiences of national and transnational institutionalization of social sciences in the region, those of Brazil and Chile; it was published in Spanish by Mexican publisher Siglo XXI, largely responsible for its exceptional commercial success, of a best seller in Latin American sociology.

Keywords: intellectuals; sociology; transnational space; dependency; Latin America.

Este artigo discute as origens da chamada “questão nacional” no Brasil em meio ao processo de Independência e de algumas das características históricas mais marcantes de tal processo. A questão nacional é aqui definida e abordada a partir de quatro elementos centrais, a saber: um Estado, uma nação, uma identidade nacional e um tipo de nacionalismo. Finalmente, procura-se indicar a atualidade de tais elementos no cenário brasileiro.

Palavras-chave: Independência do Brasil; Estado nacional; nação; identidade nacional; nacionalismo.

This article discusses the origins of the so-called “national issue” in Brazil amidst the process of Independence and of some of the most striking historical features of such process. The national issue is hereby defined and approached from four central elements, namely: a State, a nation, a national identity and a type of nationalism. Finally, it seeks to indicate the relevance of such elements in the Brazilian scenario.

Keywords: Independence of Brazil; national state; nation; national identity; nationalism.

A geração de republicanos brasileiros foi culturalmente formada pelas filosofias da história dos diversos cientificismos europeus do século XIX. Entendia que a forma de governo republicana correspondia, mais do que a monárquica, aos estágios evolutivos superiores. Julgava que as nações passavam pelas mesmas fases da evolução histórica e que, portanto, a história das nações europeias prefigurava as etapas da evolução brasileira. Conhecer o Brasil pressupunha, pois, compará-lo com a história e com os movimentos sociais realizados por outras nações. Alguns republicanos procuraram guiar-se pelo exemplo da Revolução Francesa e acreditaram no caráter verdadeiramente revolucionário do regime republicano no Brasil. Como a institucionalização do regime negou os seus projetos iniciais, “desiludidos”, formularam numerosas críticas às formas políticas instituídas pela proclamação da República e pela Independência do Brasil.

Palavras-chave: Revolução Francesa; República; desilusões republicanas; críticas das formas políticas; revisão da Independência.

The generation of Brazilian republicans was culturally formed by the philosophies of history of the various European scientificisms in the 19th century. It understood that the republican form of government corresponded, more than the monarchic one, to higher evolutionary stages. He believed that nations went through the same phases of historical evolution and that, therefore, the history of European nations prefigured the stages of Brazilian evolution. Knowing Brazil therefore presupposed comparing it with the history and social movements carried out by other nations. Some republicans sought to be guided by the French Revolution example and believed in the truly revolutionary character of the republican regime in Brazil. As the institutionalization of the regime denied their initial projects, “disillusioned”, they formulated numerous criticisms of the political forms instituted by the proclamation of the Republic and the Independence of Brazil.

Keywords: French Revolution; Republic; republican disillusionments; political forms criticism; Independence review

Para o autor, do ponto de vista sociológico, a história, como disciplina, é muito mais do que descrição e narrativa. É sobretudo uma busca das determinações sociais que explicam também o fazer história. E as efemérides, nessa perspectiva, deveriam ser momentos de construção da consciência crítica dos desencontros entre o que conseguimos ser e o que não conseguimos ser. O Bicentenário da Independência, portanto, pode ser um momento de rever concepções por meio das quais temos pensado e interpretado o Brasil.

Palavras-chave: Independência; revisão histórica; Estado.

For the author, from a sociological point of view, history, as a subject, is much more than description and narrative. It is above all a search for the social determinations that also explain the making of history. And the ephemeris, in this perspective, should be moments of construction of the critical awareness of the mismatches between what we can be and what we can’t be. The Bicentennial of Independence, therefore, can be a moment to review the conceptions through which we have been thinking and interpreting Brazil.

Keywords: Independence; historical review; State

Conteúdos especiais:

Revista USP é uma publicação trimestral da Superintendência de Comunicação Social (SCS) da USP. Criada em 1989, é um veículo cultural de caráter ensaístico, o que confere maior dinamismo aos textos. Além disso, é multidisciplinar, aberta a todas as tendências. Outro fator a torna especial: a qualidade indiscutível dos colaboradores, que lhe possibilita ser um verdadeiro padrão de excelência dentro do universo cultural brasileiro.

Você terá a satisfação de ler a cada volume textos assinados pelos mais renomados autores em seu setor. Multidisciplinar e sem preconceitos, a Revista USP não privilegia esse ou aquele enfoque, esse ou aquele grupo, é aberta a todas as tendências.  

Endereço:

Rua da Praça do Relógio 109
Bloco L – 4o. andar
Cidade Universitária
Butantã – São Paulo/SP
CEP 05508-050
Telefone: (11) 3091-4403
Site: www.usp.br/revistausp
e-mail: revisusp@usp.br