O lugar da USP no mundo

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Desempenho nos rankings internacionais mostra protagonismo na América Latina, mas deixa de lado parte importante da missão da Universidade
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Ano a ano, a comunidade acadêmica e a sociedade, em geral, acompanham na mídia os resultados dos principais rankings globais de universidades. Responsável por quase um quarto de toda a produção científica do País, a USP invariavelmente assume a liderança não apenas entre as brasileiras, mas também entre as latino-americanas.

Seu caráter público, somado à sua reputação e, mais recentemente, às notícias sobre seu desequilíbrio financeiro, faz com que muitos vejam com maus olhos a perda de posições nessas classificações ou comemore quando ascendemos no pódio. É compreensível o desejo de nos vermos mais próximos do topo, mas há muito o que se considerar nas entrelinhas.

Saber qual lugar se ocupa entre tantas e tão diversas instituições no mundo é indispensável aos responsáveis por gerir a maior universidade do Brasil. Mas ao olhar para o que a USP tem realizado para a ciência e para a sociedade, é inequívoco o quanto fica de fora da régua dos rankings.

Este Jornal da USP Especial, como na edição passada sobre as políticas de inclusão social adotadas para o ingresso na Universidade, se lança no desafio de investigar e comunicar aspectos da gestão acadêmica que pouco aparecem quando a USP vira notícia.

As reportagens aqui reunidas não têm a pretensão de responder ou justificar os resultados “negativos” da USP nas listas das melhores universidades. São, antes, um esclarecimento à comunidade, que deve, sim, cobrar qualidade e excelência da USP, mas a partir de parâmetros que façam jus às suas potencialidades e limitações.

Aline Naoe
Subeditora de Universidade do Jornal da USP

Rankings oferecem retrato importante, mas incompleto da Universidade

Para além das mudanças de critérios feitas ano a ano, há outros fatores para que o sobe e desce das colocações seja visto com cautela. Um dos desafios dos rankings globais é abarcar em uma só lista uma grande diversidade das instituições, em termos de tamanho, recursos financeiros e contexto sociocultural. Além disso, os rankings deixam de fora aspectos como ensino, formação de recursos humanos e impacto no entorno social. Leia mais
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Integração de dados facilita envio de informações aos rankings

Para criar suas listas, os rankings também precisam olhar para informações que não estão disponíveis nas bases de dados científicas. Quantidade e distribuição de funcionários e alunos, por exemplo, precisam ser buscadas junto às próprias instituições, que são procuradas anualmente pelos organizadores. É o que conta Silvio Fernandes de Paula, assessor da Superintendência de Tecnologia da Informação (STI) da USP.

Ele é uma das pessoas envolvidas na mobilização para fornecer essas informações aos rankings, um processo que é relativamente simples e rápido. Isso porque, hoje, há um banco de dados integrado da USP, de onde a equipe extrai tudo o que é solicitado. O superintendente da STI, João Eduardo Ferreira, lembra que a estruturação desse banco foi um processo iniciado há cerca de quatro anos, a partir de uma demanda da própria Universidade de se conhecer melhor e ter dados confiáveis e únicos sobre cada aspecto: uma melhora significativa que acabou facilitando também o trabalho de enviar informações aos produtores dos rankings.

João Eduardo Ferreira, superintendente da STI - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

João Eduardo Ferreira, superintendente da STI - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Além do STI, estão envolvidos nessa iniciativa as quatro Pró-Reitorias, o Sistema Integrado de Bibliotecas (SIBiUSP) e a Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional (Aucani). “Esse trabalho é um esforço para ter as fontes regularizadas, oficializadas e sendo referências fixas para esses valores”, explica o presidente da Aucani, Raul Machado Neto.
A existência do banco permite à USP, inclusive, se antecipar aos pedidos e já deixar os dados prontos para submissão. “O que acontece às vezes é que de um ano para outro os rankings mudam as perguntas. Por isso, quando o preenchimento dos dados é liberado, sempre há um documento explicando como será a coleta daquele ano e aí nós adequamos o procedimento de coleta e fazemos a extração dos dados”, relata Silvio de Paula.

Segundo Ferreira, o grande desafio, hoje, é definir quais os dados ou indicadores que melhor representam as instituições. “Não adianta ter mil indicadores. É preciso ter um conjunto de dados que resultem em uma representação significativa e sintética, pois ninguém consegue enxergar todos os dados”, afirma o superintendente.

Indicadores de pesquisa em rankings podem encobrir distorções

Mesmo utilizando esse critério restrito e, à primeira vista, bastante objetivo, a produção científica das universidades pode ser subestimada nos principais rankings de universidades. Uma variável que indiretamente acaba sendo deixada de fora é a pesquisa em áreas do conhecimento muito fortes da USP, como a agronomia. Leia mais
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A difícil tarefa de avaliar a qualidade do ensino superior

Nos rankings globais, medir a qualidade do ensino é um desafio, já que é preciso criar indicadores válidos - e viáveis - para uma grande diversidade de instituições e países. As avaliações nacionais, nesse sentido, têm vantagem e procuram ampliar a visão sobre a qualidade da formação dos estudantes. Leia mais
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rankings_barra2Atendimento à sociedade não é
contabilizado nos rankings

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O que realmente pesa na hora de definir a posição das universidades nos rankings internacionais mais famosos poderia ser resumido em uma palavra: pesquisa. E não qualquer pesquisa: apenas aquela que se traduz em publicação de artigos e citações em revistas científicas conceituadas. Gradualmente, porém, ganha força a ideia de que nem toda universidade deve ter seu foco tão restrito.

Atendimento em projeto da FOB em Rondônia - Foto: Divulgação

Atendimento em projeto da FOB em Rondônia - Foto: Divulgação

Se por um lado os rankings elegem supermarcas globalizadas, que são as chamadas “universidades de classe mundial”, em geral mostram pouco do impacto local da universidade. Para o reitor Marco Antonio Zago, em palestra sobre o tema, uma das principais falhas nessas avaliações refere-se à ausência de critérios relacionados à terceira missão das Universidades, a extensão, que é a abertura e oferta de serviços à comunidade externa.

“Uma coisa que os rankings não medem, mas é importante: a atenção que a USP dá para a cultura e para o seu patrimônio, os seus museus. A USP investe muito dinheiro para cuidar da sua cultura, dos seus livros, dos seus acervos”, afirma o pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária, Marcelo de Andrade Romero.

Segundo a Constituição Brasileira, as atividades de ensino, pesquisa e extensão nas universidades do País são indissociáveis. No decreto que determinou a criação da USP, em 1934, consta como um de seu fins “realizar a obra social de vulgarização das ciências, das letras e das artes, por meio de cursos sintéticos, conferências palestras, difusão pelo rádio filmes científicos e congêneres (semelhantes)”.

As atividades de extensão visam levar o conhecimento produzido dentro das universidades à população, por meio da divulgação científica e cultural e também da oferta de serviços, como atendimento médico gratuito e cursos diversos. A USP mantém quatro grandes museus, que guardam parte importante do acervo histórico e cultural do País, parques e centros de divulgação científica, e quatro hospitais que oferecem atendimento ao público, além de projetos que promovem interação e assistência junto à comunidade, cursos e aulas para a população externa e iniciativas culturais, como cinema e orquestras.

Marcelo de Andrade Roméro, pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária

A participação do corpo discente é o que move grande parte das iniciativas de extensão. Além de bolsas que a USP disponibiliza para graduandos atuarem nesses projetos, existem iniciativas criadas e geridas pelos estudantes, como escritórios de auxílio jurídico e cursos de comunicação e escrita.

Mensurar a contribuição e o esforço da Universidade para disseminar o conhecimento produzido na sociedade não é tarefa fácil. As iniciativas, que envolvem toda a comunidade acadêmica, de alunos a servidores e pesquisadores, atendem milhões de pessoas anualmente. Boa parte do orçamento previsto em 2016, calculado em mais de R$ 5 bilhões, é investido nesses projetos.

Confira abaixo um resumo de algumas das principais ações de cultura e extensão universitária da USP.

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Impacto social decorre também da inovação e de políticas públicas

Formação de recursos humanos, influência na definição de políticas públicas e estímulo ao empreendedorismo ficam fora da conta dos rankings. Leia mais
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Passaram pela Universidade - ou permanecem nela como pesquisadores - pessoas que se tornaram presidentes da República, governadores, senadores, ministros e prefeitos. Conheça alguns exemplos:

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Fernando Henrique Cardoso

Ex-presidente da República, ex-ministro das Relações Exteriores, ex-ministro da Fazenda, ex-senador do estado de São Paulo. Formou-se em Sociologia pela antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP.

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Fernando Haddad
Cursou a Faculdade de Direito da USP. É mestre e doutor pela Universidade, onde é professor de Ciência Política. Prefeito de São Paulo até o final de 2016, foi ministro da Educação.

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Henrique Meirelles
Atual Ministro da Fazenda do Brasil, formou-se em Engenharia Civil na Escola Politécnica (Poli) da USP em 1972. Também foi presidente do Banco Central e deputado federal.

Os riscos de avaliar uma universidade por classificações

Produzir trabalhos de impacto, estimular a internacionalização e ter uma boa reputação entre acadêmicos são, sem dúvida, objetivos que universidades de todo o mundo podem almejar. Mas o que especialistas alertam é que subir nos rankings, por si só, não deve ser um fim, não só porque essas avaliações são incompletas, mas também por não ser esse um propósito das instituições de ensino superior. Leia mais
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Guilherme Ary Plonski, vice-diretor do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP

Professor Ary Plonski - Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Professor Ary Plonski - Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Os que questionam de boa fé o nosso desempenho não nos perguntam “Por que a USP não é uma universidade ‘flagship’ como a Universidade da Califórnia – Berkeley, ou mesmo ‘new flagship’, como a Universidade Estadual do Arizona – Phoenix?”.  Nem nos perguntam “Por que vocês não são uma Harvard, que é a universidade de maior reputação nos rankings e com o maior número de graduados contemplados com o prêmio Nobel?”. Eles nos dizem, mesmo que silenciosamente: “Há apenas uma coisa que nenhum poder externo pode impedi-los de ser”. E aí nos fazem a pergunta crítica: “Por que vocês não são a USP?”.
Ou seja, a questão que deve nos preocupar e ocupar é menos qual a nossa posição nas estridentes classificações das universidades ou qual o nosso rótulo diferenciador, mas sim “Por que não realizamos todo o imenso potencial que a USP tem, aproveitando ao máximo a elevada credibilidade que nos resta e os expressivos recursos que a sociedade paulista anualmente nos aporta?”.

Pesquisadores apontam alternativas aos rankings

Na comunidade acadêmica, a noção de que os rankings precisam ser encarados de forma crítica já está bem estabelecida. Alguns acreditam que os critérios precisam ser revistos. Outros, que os rankings não são capazes, mesmo com mudanças, de avaliar a qualidade das instituições de ensino. Leia mais
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Manifesto estabelece 10 princípios para as métricas de pesquisa

Em 2015, pesquisadores liderados por Diana Hicks, do Instituto de Tecnologia da Geórgia, e Paul Wouters, da Universidade de Leiden, propuseram 10 princípios para guiar as avaliações de desempenho em pesquisa. Publicado na revista Nature, o manifesto defende as pesquisas de interesse local, a transparência das metodologias utilizadas e a possibilidade de checar as análises. Os pesquisadores chamam a atenção ainda para a importância de atualizar e revisar os indicadores regularmente. Leia o manifesto na íntegra traduzido pelo SIBi.

“Não vamos tomar
nenhuma medida para
melhorar nos rankings”

De acordo com o reitor da USP, ações serão
realizadas para corrigir os rumos da Universidade,
mas sem foco nos rankings
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Leia a entrevista completa.