ESPECIAL | Comissão da Verdade da USP | Parte 4

 

A Faculdade de Medicina não ficou ilesa ao golpe militar de 64. A instituição foi uma das que mais tiveram prisões, expulsões, inquéritos policiais, aposentadorias compulsórias e demissões sumárias. Muitos tiveram que deixar o País de forma inesperada e centros de pesquisas foram fechados, fatos que geraram perdas de valiosos trabalhos na área médica e de saúde pública. Depois de cassado, Isaías Raw, que atuava na Faculdade de Medicina, foi para Israel e depois para os Estados Unidos. Teve reconhecimento científico e trabalhou como pesquisador na Harvard University e Massachussetts Institute of Tecnology.

 

Com apenas 20 anos, FHC já era professor de História Econômica da Europa na USP. Após o golpe de 64, se exilou no Chile, escapando via aeroporto de Viracopos porque seu nome não estava na lista de Campinas. Voltou em 1968, retomou as aulas, mas foi cassado logo em seguida pelo Ato Institucional n. 5, e aposentado compulsoriamente. Considerado perigoso e subversivo, perdeu o direito de dar aulas e não podia nem mesmo fazer pesquisa.

 

A Assessoria Especial de Segurança e Informação (Aesi) era o órgão responsável por fazer a triagem ideológica de alunos, professores e funcionários da USP. O sistema de controle instalado no Gabinete do Reitor decidia quem podia ou não fazer parte dos quadros da Universidade. Maria Hermínia Tavares estava na lista dos candidatos a docente ligados ao comunismo e, por isso, não pôde ser contratada. Trabalhou na Unicamp entre os anos de 1974 e 1987. Depois retornou e assumiu o cargo de professora na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.

 

Muitos foram denunciados por atividades subversivas pela Assessoria Especial de Segurança e Informação (Aesi), instalada na administração central da Universidade. Originário do Departamento de Parasitologia, o “departamento vermelho” que abrigava muitos cientistas de esquerda, Erney Plessmann de Carmago foi vítima de perseguição do regime militar. Pesquisador das doenças negligenciadas, sofreu cassação, foi aposentado, preso e exilado durante o período da ditadura.

 

A ditadura interferiu no dia a dia da Universidade e até mesmo nas atividades acadêmicas. Cremilda Medina, professora de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, foi apontada como subversiva por editar junto com seus alunos os boletins da Agência Universitária de Notícias que publicavam matérias que colocavam “o dedo na ferida” dos governos militares. Isso ocorreu em razão de uma reportagem crítica produzida a partir de uma tese feita na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo sobre o Plano Nacional de Habitação financiado pelo do governo federal.

 

A perseguição militar também veio dissimulada de medidas administrativas da burocracia universitária. Um dos episódios que causaram grande comoção na comunidade acadêmica foi a reprovação de Sinval Medina na banca de qualificação que resultou em sua demissão sumária da Escola de Comunicações e Artes. O motivo apurado pela Comissão da Verdade foi o fato de Sinval ter estado vinculado à época a dois órgãos de produção de informação: a Agência Universitária de Notícias e a editora laboratório da ECA, cujas atividades eram consideradas atentatórias à segurança nacional.

 

Mesmo depois da chamada abertura política, a violência continuou no governo Geisel (1974-1979) com a perseguição de estudantes e militantes que atuavam próximos aos movimentos operários. Aluna de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Márcia Bassetto sofreu todos os tipos de agressões e torturas – choques elétricos em várias partes do corpo – cabeça, seios, língua e vagina, quando esteve presa no Dops.

Texto por Ivanir Ferreira
Desenvolvimento e Layout por Larissa Fernandes
Vídeo por Thales Figueiredo, Letícia Sillman, Graziella Zanfra, Dener Yukio, Marcos Targino

Foto de abertura: Mario Moreira Leite/Agência Estado
Foto das capas: Reginaldo Manente/Agência Estado
Jornais: Acervo Estadão

Publicado em 10 de maio de 2018

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