Grupo de pesquisa pretende traçar historiografia da população negra no Direito da USP

Projeto propõe reconstrução da memória sobre funcionários, estudantes e professores negros que passaram pelo Largo São Francisco; inscrições estão abertas para estudantes da graduação e da pós-graduação

 20/04/2023 - Publicado há 1 ano
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Fotomontagem: Jornal da USP – Fotos: Cecília Bastos/USP Imagens, Pixabay e Wikimedia Commons

 

A Faculdade de Direito (FD) da USP oferece 20 vagas, entre graduandos e pós-graduandos, para um novo grupo de pesquisa que tem a pretensão de investigar a história da população negra na faculdade. As inscrições devem ser realizadas por um formulário digital e estão abertas até o dia 24 de abril. Os 20 pesquisadores serão selecionados em paridade de gênero e ao menos 60% dos selecionados serão candidatos pretos, pardos ou indígenas. Confira o edital completo

Marina Lima Ferreira – Foto: Arquivo pessoal

Em entrevista ao Jornal da USP, a coordenadora do novo grupo, Marina Lima Ferreira, compartilhou expectativas e propósitos do projeto. “O objetivo é dar cara nova a um bacharelismo que historicamente é excludente, masculino, branco, mas que certamente é marcado, apesar das inúmeras dificuldades, por uma história negra que precisa ser reconstruída na faculdade”, afirma.

Marina é graduada pela Faculdade de Direito da USP, onde também obteve título de mestre e atualmente é doutoranda em Direito Penal e Criminologia. A coordenadora conta que a iniciativa para a formação do grupo partiu de sua orientadora, a professora e vice-diretora da FD, Ana Elisa Liberatore Bechara.

De acordo com Marina, uma das principais motivações para a criação do grupo foi a descoberta de que, ainda no período da escravidão, a FD teve um bibliotecário negro. Ela relembra figuras históricas como Luiz Gama, que em 1850 frequentava a FD como ouvinte e foi reconhecido como advogado somente 165 anos depois, em 2015. Recorda ainda de José Rubino de Oliveira, que em 1879, depois de mais de dez tentativas, venceria o concurso para a cátedra de Direito Administrativo, tornando-se o primeiro professor negro do Largo. “Onde estão as outras histórias que não foram contadas?”, questiona.

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A coordenadora conta que pretende ter um produto de pesquisa materializado para as celebrações do bicentenário da FD, que será celebrado em 2027. “Para esse semestre, a ideia é estimular um debate crítico, informativo, acerca dos primeiros anos da Faculdade de Direito, situar a faculdade no seu próprio tempo e paralelamente construir o projeto de pesquisa. Há muitas mãos lapidando objetivos, metodologias, propósitos, de modo a conseguir nortear os próximos passos desse trabalho de reconstrução”, afirma.

Além do trabalho “arqueológico”, a pesquisadora revela outras pretensões do projeto: “Ainda que indiretamente, a ideia é reafirmar os objetivos de promoção de equidade, desenvolver a pauta étnico-racial, auxiliar na supressão das exclusões que frequentemente decorrem de uma dinâmica de racismo estrutural, sejam essas exclusões relacionadas à cultura, saúde mental, questões socioeconômicas, memória”, descreve Marina. “Construir memória, fazer reparação e justiça por um passado que teve um esquecimento forçado, vai ser muito importante para nós.” 

Ana Elisa Bechara – Foto: Reprodução/FD

O grupo será orientado pela professora Ana Elisa, que também é diretora de Mulheres, Relações Étnico-Raciais e Diversidades da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da USP. “A intenção é dar visibilidade a tantos personagens negros que passaram pela faculdade e que acabaram não sendo reconhecidos. Esse tema tem importância não apenas histórica para a Faculdade de Direito e o Direito no Brasil, mas também como forma de trazer representatividade negra à nossa comunidade, que atualmente conta com alunas e alunos negros que ainda têm muita dificuldade de se reconhecerem como parte da São Francisco e do Direito”, afirma a docente. 


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