Os 80 anos de Cacá Diegues, também na TV

Em homenagem ao aniversário do cineasta, o Canal Brasil programou a exibição de sete de seus filmes a partir do dia 5 de maio

 04/05/2020 - Publicado há 4 anos
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O cineasta Cacá Diegues – Foto: Walter Craveiro –  flickr

É impossível falar de cinema brasileiro – pelo menos dos últimos 60 anos – sem se falar de Cacá Diegues. Um dos criadores do Cinema Novo, diretor de 18 filmes, entre eles os antológicos Xica da SilvaBye Bye BrasilQuando o Carnaval Chegar e Chuvas de Verão, membro da Academia Brasileira de Letras – na cadeira que foi de Euclides da Cunha –, Cacá faz parte da história sociocultural do Brasil. E está prestes a completar 80 anos, no próximo dia 19 de maio. Justamente para homenageá-lo, o Canal Brasil programou a exibição de sete de seus principais filmes a partir desta terça-feira, dia 5, até o dia 16 de junho, todas as terças-feiras, sempre às 23h45 (veja a programação completa abaixo).

Nascido Carlos José Fontes Diegues em Maceió (AL), Cacá se mudou com os pais para o Rio de Janeiro aos 6 anos de idade – e lá fez sua história. Que começou, de fato, quando foi cursar Direito na PUC em finais dos anos 1950 e, mais interessado em cinema do que em leis, fundou um cineclube e iniciou suas atividades de cineasta amador tendo como companheiros David Neves e Arnaldo Jabor, que estariam por perto durante toda sua longa carreira. Ainda na PUC, ele dirigiu o jornal O Metropolitano, ligado à União Metropolitana dos Estudantes – e o jornal foi seu trampolim para o Centro de Cultura Popular da União Nacional dos Estudantes. E foi a partir da proximidade com o histórico CPC que Cacá e nomes como Leon Hirszman, Gláuber Rocha e Paulo César Saraceni lançaram as bases para aquilo que viria a ser conhecido como Cinema Novo.

Cena do filme Xica da Silva – Foto: Divulgação

A teoria de “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”, no caso de Cacá, começou a se materializar em 1962, quando ele dirige seu primeiro filme profissional em 35 mm, Escola de Samba Alegria de Viver, na verdade um dos episódios do longa Cinco Vezes Favela (os demais episódios são dirigidos por Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman, Marcos Farias e Miguel Borges). Foi apenas o começo de uma carreira que prometia, de fato, ser prolífica. Entre 1964 e 1969, ele dirige seus primeiros longas-metragens – Ganga Zumba (1964), A Grande Cidade (1966) e Os Herdeiros (1969) –, todos com a marca registrada do Cinema Novo: voluntarismo, uma certa utopia e a vontade de mudar, a partir da arte, um país enredado em uma ditadura militar que cada vez mais apertava seus grilhões.

E Cacá não se satisfazia em levar suas ideias apenas com uma câmera na mão: polemista por vocação, ele escrevia críticas, ensaios e manifestos para publicações no Brasil e no exterior. Só que aquilo não poderia dar muito certo diante de um governo que não se animava muito com posturas tão inquietas como a dele. E, depois da promulgação do AI-5, em 13 de dezembro de 1969, Cacá Diegues teve que se exilar na Europa com a cantora Nara Leão, com quem ficou casado até 1977. Viveu na Itália e na França e só voltou ao Brasil em 1972.

Cena do filme Bye Bye Brasil – Foto: Divulgação

“Patrulhas ideológicas”

Foi no seu retorno que Cacá acabou por dirigir as obras que consolidaram seu nome como um dos mais importantes do cinema nacional. Quando o Carnaval Chegar (1972), Joanna Francesa (1973) – ambos com trilha de outro ex-exilado, Chico Buarque – e, principalmente, Xica da Silva (1976), seu maior sucesso popular, pavimentam de vez seu caminho. Mas não arrefecem seu tom polemista e crítico. Em 1978, em uma entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo, Cacá Diegues usa a expressão “patrulhas ideológicas” para caracterizar alas da crítica que não coadunavam  com os produtos culturais não alinhados a certos cânones da esquerda mais radical. Não se sabe exatamente se foi ele quem criou a expressão, mas ela acabou indo para sua conta.

Cena do filme Orfeu – Foto: Divulgação

Um ano depois da famosa frase, ele dirigiu um de seus filmes mais emblemáticos: Bye Bye Brasil, em que mostra – a partir de uma trupe mambembe liderada por “Lorde Cigano” (José Wilker) – um Brasil que a maioria da população não via nas telas edulcoradas da TV. “Para Vigo me voy”, bradava o personagem de Wilker. E se embrenhava cada vez mais em um país pobre, desestruturado e que precisava ser apresentado aos brasileiros.

“O Cinema Novo foi o período mais feliz da minha vida. Sempre tentei fazer os filmes do meu tempo. Tenho orgulho de dizer que sempre fui um cineasta do presente, sem nenhuma nostalgia do passado, nem tentando enviar mensagens para o futuro. Acho que é por isso que eles continuam sendo sempre atuais”, disse Cacá em entrevista recente.

Cena do Filme Deus é Brasileiro – Foto: Divulgação

 

Talvez seja este, no final das contas, o grande condão de Cacá Diegues: mostrar o que precisa ser visto, com delicadeza e poética autorais, mas também com precisão e atualidade. Seja o amor na terceira idade de Chuvas de Verão, seja a picaresca história de Deus é Brasileiro, ou o onírico Grande Circo Místico. Ou, quem sabe, com a mensagem tão necessária para os tempos atuais, emitida pelo título de um filme de 1989: Dias Melhores Virão.

Veja, abaixo, a programação completa de Cacá Diegues – 80 Anos, do Canal Brasil (canal 113 na Sky; canal 150 na NET), sempre às 23h45:

Dia 5/5: Xica da Silva (1976)

Dia 12/5: Bye Bye Brasil (1979)

Dia 19/5: O Grande Circo Místico (2018)

Dia 26/5: Orfeu (1999)

Dia 2/6: Deus é Brasileiro (2001)

Dia 9/6: A Grande Cidade (1966)

Dia 16/6: Chuvas de Verão (1978)

 


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